Busca no site da UFMG

Nº 1597 - Ano 34
18.02.2008

Jacques Schwartzman

O custo-benefício da universidade brasileira

Flávio de Almeida


Foca Lisboa
Jacques Schwartzman
Schwartzman: conferências discutirão questões não resolvidas no Brasil

Reativado no final do ano passado, o Centro de Estudos sobre Educação Superior e Políticas Públicas (Cespe) volta em grande estilo com a realização, entre 5 de março e 11 de junho, de ciclo de conferências sobre financiamento, avaliação, pós-graduação, legislação e inclusão no ensino superior.
Em entrevista ao BOLETIM, o economista Jacques Schwartzman, diretor do Cespe, informa que o ciclo de conferências pretende “trazer para a UFMG o que há de mais atualizado na área”. Ele também explica as principais atribuições do órgão: congregar pesquisadores de diferentes campos para o desenvolvimento de estudos na área e atender necessidades de planejamento da UFMG.

O Cespe foi criado no final de 2003 com a missão de pensar a Universidade a partir de questões emergentes e demandas sociais. Esse objetivo continua de pé com a sua retomada?

Continua basicamente o mesmo, mas com duas diferenças. Primeiro, o Centro está se organizando para atender demandas específicas levantadas pela Administração Central. Segundo, ele não trata só da UFMG, mas do ensino superior de um modo geral – público e privado – no Brasil e em outros países. Ajudamos, por exemplo, na estruturação da proposta do Reuni e atendemos algumas demandas da Administração Central sob a forma de pareceres. Nossa estrutura ainda é pequena, mas estamos nos preparando para crescer à medida que as atividades aumentarem.

O ciclo de conferências poderá catalisar a formação de um corpo de pesquisadores?

Nosso objetivo principal é promover um ciclo de conferências que traga para a UFMG o que há de mais atualizado na área. Reuniremos pessoas que já participaram de grandes decisões relacionadas ao ensino superior no Brasil e que representam diferentes correntes de pensamento. Discutiremos questões ainda não resolvidas no Brasil, como o tamanho do sistema universitário, o financiamento das universidades, o mix de cursos – a proporção entre cursos das áreas tecnológicas e acadêmicas. Tudo isso a partir, inclusive, de referências do exterior.

Um dos objetivos do ciclo de conferências é apresentar as contribuições das ciências sociais para a educação. De que áreas chegam essas contribuições?

A economia é uma das poucas áreas que possuem um corpo de trabalhos e resultados relevantes para a área de educação. Existe um campo chamado economia da educação e até um subcampo intitulado economia do ensino superior, já com alguma tradição, nos Estados Unidos. Com o ciclo, queremos mostrar como a teoria econômica e a sociologia podem ajudar a entender várias questões educacionais.

Como o senhor vê o atual cenário do financiamento do ensino superior?

O Brasil tem um número relativamente pequeno de alunos no ensino superior. A demanda é muito grande e os recursos do governo são escassos, assim como a capacidade de a população pagar pelo ensino. No governo passado (do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso), optou-se por deixar a iniciativa privada aumentar a oferta. E ela o fez muito bem, embora com alguns problemas de qualidade. Tanto que absorve hoje 78% dos alunos de graduação no Brasil. No governo Lula, esse quadro sofreu uma inflexão. Recursos públicos voltaram a ser injetados nas universidades por meio do Reuni, programa de expansão das federais, e do Prouni, que financia a população universitária carente.

Esse modelo é sustentável?

Não se sabe ainda. Mas, de qualquer forma, alguma mudança está ocorrendo. O Brasil tem uma freqüência muito baixa às universidades. Apenas 12% dos jovens da faixa de 19 a 24 anos estão no ensino superior. Para aumentar esse índice, é preciso incluir mais alunos pobres, o que tem sido, em parte, resolvido pelo Prouni. Só que o Prouni vai chegar, no máximo, a 400 mil alunos – hoje são 300 mil. Considerando que o ensino superior privado absorve quatro milhões de alunos, o índice daqueles que estudam com bolsas do programa tende a chegar a 10%. O crescimento das federais poderia ser menos oneroso se o Brasil recorresse mais a alternativas como centros universitários, programas de educação a distância e cursos de formação de tecnólogos.

Quanto custa manter o ensino superior no Brasil?

Só as universidades federais têm orçamento de R$ 10 bilhões, sem incluir a folha de aposentados. Elas formam um sistema com 600 mil alunos, o que gera um custo anual per capita superior a R$ 16 mil. No sistema privado, esse valor fica na faixa de R$ 7 mil a R$ 8 mil/ano. Comparando com o sistema latino-americano, o custo de nossas universidades é alto, próximo ao das universidades de países desenvolvidos. É um gasto elevado por vários motivos. A começar pela aposentadoria do servidor público, que é integral. Outra diferença está no regime de trabalho. A universidade federal tem 85% de seus professores em dedicação exclusiva, em sua maioria doutores, o que eleva os salários. Mas esse custo traz um grande benefício: a universidade brasileira, em matéria de pesquisa e pós-graduação, é muito superior à de outros países da América Latina.

A UFMG anunciou que pretende instituir uma bonificação para alunos de escolas públicas no Vestibular 2009. O que o senhor acha dessa idéia?

É uma proposta interessante. Primeiro, porque estabelece uma espécie de cota para alunos carentes, descartando o uso da variável raça, tão difícil de ser definida. A outra vantagem é que a instituição acaba fazendo uma seleção dos melhores alunos da escola pública que hoje não passam no vestibular das federais, mas ficam muito próximos da aprovação. É um empurrãozinho que se proporciona a esses jovens, uma forma de compensar fatores socioeconômicos, como a impossibilidade de freqüentar um curso extra de inglês ou cursinhos. Esta bonificação enfraquece a idéia de mérito no vestibular, mas é um ônus necessário, que precisa ser assumido para aumentar os níveis de inclusão de populações mais pobres ao ensino de qualidade.