Busca no site da UFMG

Nº 1601 - Ano 34
17.03.2008

Dois pra lá, dois pra cá

Dança de salão e cineclube transformam moradias universitárias em centros de convivência

Paulo Cerqueira
danca
Casal de estudantes ensaia os primeiros passos na aula inaugural do projeto Dança na Moradia

Nos anos 80 e 90, o sonho da moradia universitária foi embalado pelo mote "Eu quero uma casa no campus". Hoje, com dois edifícios construídos no bairro Ouro Preto e um terceiro em Montes Claros, o sonho da casa no campus assume novo significado. A idéia agora é que as moradias funcionem efetivamente como espaços de convivência, perfil delineado pela programação cultural que começa a ganhar corpo na Moradia Ouro Preto I. Desde agosto de 2007, o Projeto Cineclube Moradia exibe filmes para os moradores aos domingos, sempre às 17h30. No último dia 8 de março, um novo projeto foi iniciado: Dança na Moradia, que promove aulas de dança de salão nos fins de semana.

Segundo Vera Maria Pereira Coelho, diretora da Moradia Universitária, ao assumir o cargo, em maio do ano passado, ela percebeu certa tristeza entre os estudantes. “Eles estavam meio fechados e isolados. O pessoal ficava mais nos quartos, mal se cumprimentava. Vimos que era preciso mudar isso”, explica. Para entender as necessidades dos estudantes, ela criou um sistema de enquetes, no qual os moradores respondem quais atividades desejam ver realizadas. A idéia das aulas de dança cresceu rapidamente, devido ao interesse dos moradores. “Quando enviei a enquete sobre o projeto, fiquei assustada com a rapidez da resposta”, lembra Vera. Aprovada pelo Conselho Diretor da Moradia Universitária em novembro, a iniciativa recebe também apoio da Fump, que arca com as bolsas para os instrutores, estudantes da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional.

Divididas em quatro turmas, duas aos sábados e outras duas aos domingos, os cerca de 160 alunos têm aulas no salão de convivência da Moradia I. São quatro modalidades: samba, bolero, forró e soltinho. Para Murilo de Assis Borges Júnior, estudante do 8º período de Educação Física, dançarino profissional e professor do projeto, a oportunidade de trabalhar com os estudantes é gratificante. “Adoro o contato com esse público, com pessoas dessa idade. Acho muito interessante participar de um projeto com um objetivo tão importante”, afirma. No sábado, as aulas acontecem às 18h e às 19h; no domingo, às 15h e 16h.

O professor explica que a dança de salão será uma ótima oportunidade para ampliar os níveis de socialização na Moradia. De acordo com o dançarino, a atividade aumenta a auto-estima dos praticantes, que passam a conhecer melhor os limites do próprio corpo e do seu parceiro.”Tem também a questão cultural. Eles aprendem que o ritmo, originário de outra cultura, foi incorporado pela nossa ao longo do tempo. Tudo isso traz benefícios fantásticos”, garante Murilo de Assis.

Filmes de arte

Em sua tentativa de ampliar o diálogo com os moradores da residência universitária, Vera Coelho conheceu o estudante Valdenir Taveira, graduado em Letras e que faz continuação de estudos em Literatura e Cinema. Cinéfilo, ele sugeriu a utilização do salão para exibir os filmes. “Começou devagar, com uma mostra de filmes do Charles Chaplin. Só que o equipamento era muito ruim na época”, lembra Taveira. Como passou a ficar mais tempo na moradia para escrever a monografia de conclusão de curso, o estudante acabou tomando a frente nas exibições. “O cineclube aconteceu bem informalmente, e a colaboração dos moradores foi fundamentel para a constituição do acervo, sem o qual o projeto não existiria”, conta.

A maior parte dos filmes exibidos integra o acervo montado pelos estudantes. De acordo com Taveira, a proposta do Cineclube Moradia representa um contraponto às locadoras, que trabalham com produções mais comerciais. “Queremos consolidar aqui um espaço para exibir filmes de arte, recuperar cineastas que a gente não vê com tanta facilidade”, argumenta ele, citando desde diretores cujos trabalhos estão na gênese da linguagem cinematográfica, como os irmãos Lumière, George Méliès e Sergei Eisenstein, até escolas importantes como a Nouvelle Vague e o Cinema Novo. Para Taveira, o projeto é um passo importante para potencializar o convívio nas moradias. “Isso aqui é uma extensão da Universidade”, sentencia.

Outros projetos estão sendo estudados. De acordo com Vera Coelho, existe a possibilidade de realização de um concerto ao ar livre, em parceria com a Escola de Música, e de palestras para refletir sobre temas contemporâneos.

Espaço de formação

A vice-reitora Heloisa Starling, presidente do Conselho Diretor da Moradia Universitária, afirma ser uma prioridade oferecer aos estudantes que residem na moradia boas condições de convivência. Ela diz que, a partir de seu contato com os representantes discentes do Conselho, percebeu que os estudantes vivem uma situação ambígua de liberdade e dor. “Os alunos em início de curso chegam com aquela expectativa de viver uma experiência nova, mas longe de casa também se sentem sozinhos”, diz. E acrescenta: “Ao mesmo tempo em que estão eufóricos por cumprir mais uma etapa, a exemplo daqueles que concluíram sua graduação, sentem medo de ingressar em um novo caminho”, completa.

Ela defende a integração da Moradia Universitária ao cotidiano da UFMG. “A Universidade é um espaço de formação cultural e política. A moradia acabava ficando um pouco à margem disso. Por isso, estamos desenvolvendo ações que a integrem à UFMG”, informa. Para ela, a atitude dos próprios estudantes que organizaram o Cineclube Moradia é um indício do interesse em melhorar o convívio.

A venezuelana Cláudia Cordina Carranza Mago, designer gráfica e webdesigner do Instituto Internacional para a Educação na América Latina e no Caribe (Iesalc), com sede em Caracas, trabalhou durante um mês no setor de planejamento e criação gráfica do Centro de Comunicação (Cedecom), como parte de convênio entre a Universidade e o órgão, vinculado à Unesco. Durante sua estada em Belo Horizonte, Cláudia ficou na Moradia Ouro Preto I. Segundo ela, a acolhida não poderia ter sido melhor, já que pôde conhecer outra cultura, outros intercambistas e desfrutar de ótimas instalações. “Uma das minha preocupações era com o lugar onde iria me hospedar. Pela internet, tomei conhecimento da Moradia Universitária e, quando cheguei, vi que era melhor do que eu imaginava. O clima é muito bom, muito limpo e o prédio está perto da Universidade”, elogia.

Para Thalita Rodrigues, estudante do 3º período de Psicologia, a oportunidade de ficar na Moradia foi fator decisivo para a realização do sonho de fazer um curso superior. “Eu não conhecia ninguém em Belo Horizonte. Como sabia da existência da Moradia, prestei vestibular já pensando em tentar uma vaga”, diz ela, natural de Patrocínio, município do Alto Paranaíba que fica 400 quilômetros distante de Belo Horizonte.
O Programa Permanente de Moradia Universitária, instituído em 6 de novembro de 1997 pelo Conselho Universitário da UFMG, é gerido pela Coordenadoria de Moradia Universitária e administrado pelo Conselho Diretor da Moradia Universitária.

Os usuários pagam mensalmente uma taxa de utilização, chamada Taxa Condominial. Propostas pelo Conselho Diretor e subsidiadas pela UFMG, por meio da Fump, as taxas variam de acordo com a classificação de carência dada pela Fundação aos estudantes. As três unidades – duas no bairro Ouro Preto, em Belo Horizonte, e a do Núcleo de Ciências Agrárias (NCA), em Montes Claros – oferecem 644 vagas.

Paulo Cerqueira
predio
Fachada do prédio da Moradia I, no bairro Ouro Preto