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Nº 1683 - Ano 36
22.2.2010

Tecnologia no assentamento

Atividades de extensão do ICA em áreas cultivadas pelo MST
são financiadas pelo CNPq

Juliana Paiva

As atividades de extensão agrícola desenvolvidas por professores e alunos do Instituto de Ciências Agrárias (ICA) de Montes Claros em assentamentos do Movimento Sem-Terra no Norte de Minas ganharam fôlego. Algumas delas, reunidas no projeto Desenvolvimento da Transição Agroecológica nas Áreas de Reforma Agrária da Região Norte de Minas, agora são financiadas pelo CNPq. O objetivo é aumentar a produção agropecuária e agroindustrial e organizar a cooperação e comercialização agrícola, gerando trabalho, renda e melhoria das condições de vida de 87 famílias dos assentamentos do MST Estrela do Norte (Montes Claros), Darcy Ribeiro (Capitão Enéas) e Irmã Dorothy (Coração de Jesus).

Trata-se de um dos três projetos do ICA com a temática Tecnologias sociais voltadas à agroecologia, aprovado em dezembro passado no âmbito do Edital 29/2009 do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico/Ação Transversal (Lei 11.540, de 2007) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

O aporte de recursos do CNPq é visto como uma “luz no fim do túnel” para dar continuidade a atividades já desenvolvidas em caráter multidisciplinar por vários professores e alunos do ICA, especificamente no assentamento Estrela do Norte. “Até então, elas não recebiam apoio de instituições públicas ou privadas”, comenta o professor Hélder Augusto dos Anjos, coordenador do projeto. O professor explica que a equipe da UFMG vem trabalhando em conjunto com os assentados para promover capacitação técnica, realizar diagnósticos e ajudar na proposição de políticas públicas que atendam a diversas demandas da comunidade, como fornecimento de água e energia elétrica, saneamento e preservação ambiental.

Um dos objetivos do projeto aprovado pelo CNPq é fortalecer, agora com mais recursos (R$ 83 mil), esse processo de capacitação e de identificação das potencialidades de subsistência e geração de renda. A base é a matriz tecnológica da Agroecologia, o que implica produzir em sintonia com o meio ambiente e com foco na diversificação. Segundo Hélder Augusto, as principais opções apresentadas aos produtores são avicultura, apicultura, ovinocaprinocultura, fruticultura, produção de hortaliças em geral e resgate de hortaliças não convencionais.

Irradiação

No assentamento Estrela do Norte, um dos três alvos das atividades de extensão do ICA, funciona uma unidade do Centro de Formação Regional do MST. Por isso, prevê Filipe Russo, estudante do curso de Agronomia, o trabalho desenvolvido pela equipe da UFMG alcançará bem mais do que as 87 famílias que moram nos assentamentos. “Indiretamente, outras 436 famílias dos demais assentamentos e acampamentos do MST na região serão beneficiadas”, estima Russo.

O Estrela do Norte nasceu em 2003 como resultado da ocupação de uma fazenda improdutiva. São 784 hectares de terras, divididas em lotes particulares e coletivos. As 31 famílias assentadas cultivam milho, amendoim, mandioca, frutas e hortaliças e criam pequenos animais. Mas, de acordo com Sebastião Ribeiro da Silva, um dos coordenadores do assentamento, há pouca área disponível para produzir. Somente em agosto, os assentados conseguiram, do Instituto Estadual de Florestas (IEF), autorização para desmatar áreas e destiná-las ao cultivo. Agora, essa área ainda precisa ser preparada para o plantio. “Muitas famílias ainda não têm nenhuma área para trabalhar”, conta Tião, como o produtor é conhecido.

Mas os problemas ligados à produção estão longe de ser os únicos enfrentados pela comunidade local. De acordo com Filipe Russo, a qualidade da água é preocupante. Análises feitas por professores do ICA comprovaram que as fontes que abastecem o assentamento – um poço, duas lagoas e uma cisterna – estão contaminadas com coliformes fecais.

A questão hídrica

Comunidades Rurais, Água e Agroecologia, Semiárido Mineiro é o título de outro projeto do Instituto de Ciências Agrárias aprovado pelo Edital 29/2009 do CNPq, que liberou R$ 24 mil. Coordenado pela professora Flávia Maria Galizoni, dá continuidade a uma parceria de três anos entre o Núcleo de Pesquisa e Apoio à Agricultura Familiar Justino Obers, com sede na UFMG, a Associação dos Usuários da Sub-Bacia do Rio dos Cochos (Assusbac) e a Cáritas Diocesana de Januária, em benefício de comunidades dos municípios de Januária, Cônego Marinho e Bonito de Minas.

O objetivo da Universidade é potencializar ações da comunidade em prol da qualidade de vida e das melhores condições de produção, tendo como eixo a questão da água. Pesquisa de disponibilidade realizada nessas comunidades durante a seca de 2007 mostrou que cada pessoa dispunha de média diária de 30 litros para consumo doméstico. “A média brasileira é de 136 litros”, compara. Apesar de não ter sido feito novo levantamento, Flávia acredita que as comunidades evoluíram muito em direção à conservação do recurso, com foco na preservação de nascentes e matas domiciliares e reaproveitamento de água. Segundo ela, a questão hídrica não pode ser vista apenas pelo viés imediatista da disponibilidade. “A comunidade precisa reestruturar toda a sua potencialidade tanto para consumo quanto para produção. Se um rio morre, não é em dois anos que ele vai voltar”, analisa Flávia Galizoni.