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Nº 1692 - Ano 36
26.4.2010

Fecundidade e fé

Estudo que será apresentado no Seminário de Diamantina aponta influência das religiões sobre gravidez em adolescentes

Luiza Andrade

Adeptos de diferentes religiões têm comportamentos diversos quando se trata de gravidez e casamento na adolescência, segundo números extraídos do Censo 2000. A comparação de percentuais de adolescentes que tiveram filhos entre batistas, protestantes, pentecostais e católicas, de acordo com estudo que será apresentado durante o Seminário sobre Economia Mineira (Seminário de Diamantina), em maio, constata que jovens da religião batista e afiliadas a outras igrejas protestantes tradicionais apresentam os menores índices.

Sob o título Deus dá, Deus tira, o estudo, que começou a ser desenvolvido durante o doutorado da pesquisadora Luciene Longo, no Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG (Cedeplar), e o pós-doutorado de Paula Miranda Ribeiro, professora do Departamento de Demografia e pesquisadora do Cedeplar, analisou amostra de 119.978 mulheres de 15 a 19 anos, no estado de Minas Gerais. Destas, 14.175 tinham filhos e, deste grupo, 7.181 deram à luz nos 12 meses anteriores ao Censo.

Segundo os dados obtidos, 80,7% das adolescentes do estado se declaram católicas. E 11,7% delas têm filhos. Já entre as jovens que se declararam sem religião, uma em cada cinco haviam tido filhos. As batistas e vinculadas a outras igrejas protestantes – cerca de 4% da população – têm dois terços da chance das católicas de ter filhos durante a adolescência. Mas as jovens filiadas à Igreja Universal do Reino de Deus seguem caminho inverso, apresentando chance 30% maior que a das católicas de gerar filhos ainda bem jovens.

Os dados são claros, mas as causas ainda não. Para Luciene Longo, que é analista socioeconômica do IBGE, diversos fatores podem influenciar as taxas de fecundidade. “É preciso cuidado ao analisar os dados, pois os filiados a igrejas protestantes e pentecostais, por exemplo, podem vir a se casar mais cedo e constituir famílias ainda muito jovens. Os filhos nascidos de pais entre 15 e 19 anos não são, portanto, necessariamente resultado de descuidos. Podem ter sido planejados”, afirma a pesquisadora.

A análise dos estados conjugais das jovens revela que a proporção de mulheres de 15 a 19 anos com filhos é maior entre aquelas que vivem em união consensual, regida por acordo entre o casal – cerca de 70% – do que entre as casadas oficialmente – 56,8%. Já dentre as jovens que não são casadas e nem coabitam, apenas 5% têm filhos.

Outros fatores como a escolaridade e a idade podem, ainda segundo Luciene, exercer influências nos resultados. “A proporção de adolescentes com filhos é consideravelmente maior nos grupos de menor escolaridade”, relata. A incidência de gravidez é de uma em cada quatro mulheres para quem tem quatro anos de estudo ou menos, cerca de 25%. Em contraste, entre as mulheres com oito anos de estudo, uma em cada doze tem filhos, ou cerca de 8%. No caso da idade, a relação de crescimento é direta. A porcentagem sobe de 2% aos 15 anos para 25% aos 19.

Por regiões

A pesquisa tem um aspecto inovador: a divisão dos dados em mesorregiões. Até então, segundo Luciene, nenhum estudo brasileiro havia focado sua análise na fecundidade adolescente e religião em divisões regionais. “Esse critério facilita o direcionamento de políticas de aproximação social e de campanhas de saúde”, explica a pesquisadora. Das adolescentes entre 15 e 19 anos que residiam em Minas Gerais durante o Censo 2000, 11,8% tinham filhos. A campeã de mães adolescentes é a mesorregião Noroeste, com 16%. Em segundo lugar aparece a do Triângulo Mineiro/Vale do Paranaíba, com 14,7%. O Campo das Vertentes (região que inclui, por exemplo, Barbacena, Lavras e São João del-Rei) apresenta o menor índice de adolescentes com filhos – 10,5%. A Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) aparece logo em seguida, com 10,6%. O Vale do Jequitinhonha não ocupa posições extremas. Lá, 11,7% das jovens tiveram filhos.

A pesquisadora explica que o estudo desenvolvido é, por enquanto, quantitativo. Ele lida apenas com fatos que podem ser obtidos a partir da análise do censo. Porém, mais do que uma medida de proporções, o trabalho é base potencial para diversas novas pesquisas na área, inclusive qualitativas.

“É difícil determinar, com base apenas nos dados analisados, quais mecanismos ligados às tradições de cada religião influenciam ou justificam esses resultados”, alerta Luciene. “Mas a pesquisa poderá subsidiar políticas sociais e projetos em áreas como a de saúde reprodutiva na adolescência.”