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Nº 1719 - Ano 37
15.11.2010

Entrevista / Roberto Luís Monte-Mór

Uma estrutura em REDE para fortalecer a PERIFERIA

Fernanda Cristo

Foto: Foca Lisboa
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Roberto Monte-Mór: integração tributária de cunho redistributivo

Professor do Departamento de Ciências Econômicas da UFMG, Roberto Luís Monte-Mór coordena uma equipe de 180 pessoas que vai apresentar, no próximo dia 2, propostas e orientações para o desenvolvimento da RMBH nos próximos anos. Em entrevista ao BOLETIM, ele explica como essas diretrizes, que formam o Plano Metropolitano, vêm sendo estruturadas desde o final de 2009. Monte-Mór falou sobre a necessidade de reestruturar o sistema de transporte da Região Metropolitana, a importância do desenvolvimento de centros microrregionais e contou como as prefeituras vêm se empenhando para participar das discussões.

Desde o final de 2009, foram realizadas várias oficinas e discussões sobre o Plano Metropolitano. O que vai ser apresentado no próximo dia 2?

Trata-se do produto final do nosso trabalho, a proposta de estrutura metropolitana e territorial, as propostas de organização institucional, de uso do solo e regulação urbana, além de 26 políticas organizadas em quatro grandes eixos temáticos integradores.

A partir disso, o governo vai estruturar suas ações para a Região Metropolitana nos próximos anos?

O governo estadual e os municípios. O governo do Estado deve definir o que poderá ser incluído nas propostas do Plano Plurianual de Investimentos – e isso vai ser discutido no início de 2011. A partir das propostas do Plano Metropolitano, os municípios deverão fazer uma revisão de seus planos diretores. Alguns até já começaram.

O plano apresenta propostas para várias áreas. O que foi pensando para a questão do transporte?

O que se propõe de fundamental é tentar sair de uma estrutura centro-periferia, radioconcêntrica, para uma proposta de estruturação em rede. O objetivo é fortalecer a ligação dos municípios entre si, evitar essa convergência excessiva para o centro de Belo Horizonte e fortalecer a periferia, que hoje é muito frágil.

Em que sentido?

Frágil do ponto de vista de renda e de serviços, concentrados em Belo Horizonte. Propomos uma reestruturação no sistema de transportes que visa resgatar e ampliar a questão ferroviária. Um estudo já está sendo contratado pelo governo do Estado para analisar a viabilidade de utilizar o sistema ferroviário existente e ampliá-lo para trens de passageiros. Há uma grande quantidade de trilhos disponíveis. Ou estão abandonados ou vêm sendo usados basicamente para transporte de carga. Estamos tentando recuperar essa malha para uso metropolitano. As rodovias principais são importantes, mas insuficientes, porque formam um sistema radial. Propomos uma trama de estradas complementares articulando os municípios.

O que causa essa concentração de serviços em Belo Horizonte e como sair desse modelo?

A concentração acontece pela própria natureza das outras economias em volta. Algumas, apesar de muito fortes, como Betim e Contagem, são baseadas em indústrias grandes, muito autocontidas e que demandam pouco da base local. As outras são economias frágeis, em geral. O que se tem, na verdade, é um perfil econômico desatualizado, uma articulação fraca entre os municípios, grandes desigualdades, muitos impactos sobre o patrimônio e identidades frágeis.

O plano propõe novos níveis de centralidade. Mas, na prática, o que é preciso fazer para fortalecer, por exemplo, um município como Ribeirão das Neves, que é estigmatizado por seus presídios?

O processo principal que cabe a um plano desse tipo é orientar os investimentos públicos, para que eles interfiram na localização dos investimentos privados. Instituir uma centralidade em Ribeirão das Neves, por exemplo, só é possível se o Rodoanel for construído. Hoje o que se tem ali é uma ocupação frágil, de baixa renda. Por outro lado, a demanda por espaço vem aumentando muito. Segundo a Secretaria de Planejamento do município, há muita demanda de implantação de novas empresas em Neves. Outra coisa que estamos discutindo é uma espécie de integração tributária metropolitana, de cunho redistributivo e que permita a municípios como Neves, que paga o ônus de abrigar presídios, receber uma compensação por isso. Da mesma maneira, essa compensação deve premiar municípios que investem na preservação do meio ambiente. Temos que buscar um relativo equilíbrio fiscal, utilizando a base tributária para criar incentivos urbanísticos e ambientais para fortalecer uma estrutura metropolitana mais equânime.

Quando um plano do gênero foi elaborado pela última vez?

Em 1974 foi implantando o Plano Metropolitano de Belo Horizonte, o Plambel, em pleno regime militar, ou seja, muito de cima para baixo, mas que teve um papel importante, pois propôs uma estrutura metropolitana fundamentada em estudos e diretrizes para os municípios. No início dos anos 80 ele já começou a decair e foi encerrado em 1986. Até 1988, a instância metropolitana era definida pelo governo federal. A nova Constituição passou essa atribuição para os estados. Em 2003, o governo de Minas retomou essa discussão e, em 2007, aprovou uma lei complementar definindo o arranjo atual, que inclui o Conselho de Desenvolvimento, a Assembleia e o Fundo metropolitanos, sendo que este recebe dinheiro dos municípios e do estado e foi responsável pela contratação do Plano Metropolitano. Nossa proposta é de que esse fundo seja usado prioritariamente para contratar estudos e projetos destinados à implantação das propostas do Plano.

O senhor diria que faltava planejamento?

Sem dúvida. Era uma preocupação muito séria. Por isso, municípios estão tão disponíveis, inclusive os maiores, que são os que, teoricamente, menos precisam, como Belo Horizonte, Contagem e Betim. O que temos visto é uma disponibilidade muito grande dos municípios mais ricos, porque eles compreenderam que não conseguem resolver seus problemas sozinhos, que seus problemas não são mais apenas seus. Por isso, o plano parece ter chegado em um momento político bom. Nossas oficinas tinham, em geral, 200 pessoas, os seminários, 400. Ao todo algumas milhares de pessoas participaram do processo.