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Nº 1725 - Ano 37
07.02.2011

SEDENTARISMO no campo

Pesquisa de professora da UFMG no Vale do Jequitinhonha mostra que apenas 10% de moradores de áreas rurais fazem exercícios físicos

Clarice Cerqueira

Foto: arquivo pessoal
Paula Bicalho: atividade física ligada ao lazer evita doenças

O sedentarismo não é um mal exclusivo das grandes cidades. Em áreas rurais do Vale do Jequitinhonha, a falta de atividade física e as doenças a ela associadas, como diabetes, hipertensão, obesidade e dislipidemia, alcançam níveis muito próximos aos das áreas urbanas. É o que se pode concluir dos estudos desenvolvidos pela professora Paula Gonçalves Bicalho, da Escola de Enfermagem e integrante do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas em Epidemiologia (Niepe).

Paula Bicalho recorreu a dados de um inquérito feito pelo Niepe na região do Vale do Jequitinhonha, em 2004, e de resultados do estudo Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), do Ministério da Saúde. Partindo desses levantamentos, a pesquisadora foi a campo e observou a relação dos moradores de áreas pertencentes aos municípios de Jequitinhonha e Ponto dos Volantes, no Vale do Rio Jequitinhonha, com a atividade física.

Apenas 10% dos 567 adultos que entrevistou reservam 30 minutos por dia, durante cinco dias da semana, para realizar alguma atividade física ligada ao lazer. “É a forma que efetivamente ajuda a prevenir doenças”, explica Paula Bicalho. As demais maneiras de exercitar o corpo – trabalho, deslocamento e atividade doméstica – não produzem o mesmo efeito. “O deslocamento pode, sim, ajudar, mas somente se feito por 10 minutos seguidos de forma moderada a intensa, por exemplo, a pé ou de bicicleta”, ressalva.

Os resultados da pesquisa, materializados em sua tese de doutorado, foram estratificados por sexo, raça e nível de escolaridade. Eles apontam que os homens são mais ativos que as mulheres – seja no trabalho e no lazer. O mesmo ocorre com negros e pardos, na comparação com brancos, e com pessoas com mais de cinco anos de estudo.

Na avaliação da autora, tal quadro é muito preocupante, já que essas regiões, diferentemente das áreas urbanas, não possuem muitas opções de espaços físicos para a prática do lazer, como academias, parques ou pistas de caminhada. “Ao lado da alimentação, a atividade física de lazer é uma das variáveis do estilo de vida que mais interferem na saúde”, explica Paula Bicalho.

Nas áreas analisadas, o lazer fica muito restrito aos jovens, que geralmente andam de bicicleta, correm ou utilizam a quadra da cidade para jogar futebol. “Alguns dos entrevistados possuíam o hábito de fazer muita atividade física na infância, mas na idade adulta passaram a se divertir batendo papo na porta de casa ou assistindo televisão”, comenta a autora.

A prática de atividade física também é inibida pelo fato de que, nas vilas, moradias e comércio são sempre muito próximos. “A maioria das pessoas só faz uma caminhada longa para visitar um parente esporadicamente”, relata a professora.

Adaptação

A pesquisa de campo foi realizada durante os anos de 2008 e 2009. Na avaliação, ela recorreu ao Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ), reconhecido internacionalmente como modelo de investigação desse tipo de atividade. Paula Bicalho, porém, modificou algumas questões introduzindo exemplos mais afeitos à realidade do campo. “Acrescentei atividades como lavar roupa no rio e trabalhar na roça com enxada ou com foice”, ilustra.

Um dos objetivos do estudo foi testar a validade do IPAQ e sua replicabilidade na zona rural. Para isso, a professora utilizou um segundo método para confrontar resultados, o pedômetro, aparelho que monitora regularmente distâncias e passos dados pelo usuário. Foram feitas avaliações com ambos os métodos em um subgrupo de 82 adultos.

A intenção era verificar, por meio do pedômetro, em que medida o IPAQ, muito utilizado por profissionais, descreve com fidelidade a atividade que o entrevistado realmente realiza em sua vida cotidiana. “As avaliações feitas pelo pedômetro e as registradas no questionário apresentaram correlações de baixa a moderada, coincidindo com resultados de estudos em áreas urbanas da Bélgica e Austrália. O questionário apresentou reprodutibilidade de moderada a alta”, conclui Paula Bicalho.

Tese: Atividade física e fatores associados em populações de área rural de Minas Gerais – uma experiência com o Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ)
Autora: Paula Gonçalves Bicalho
Defesa: 8 de julho de 2010, junto ao doutorado da Escola de Enfermagem, área de concentração em Saúde e Enfermagem
Orientador: Jorge Gustavo Velasquez Meléndez