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Nº 1375 - Ano 29 - 21.11.2002

 

 

Jurassic campus

Geraldo Motta* e Eduardo Fajardo Soares**

oi com surpresa e estupefação que nos deparamos, numa manhã de outubro, com uma enorme "árvore" que agredia acintosamente a paisagem no nosso campus. Foi difícil entender que "objeto" era aquele, surgido da noite para o dia, totalmente desproporcional e agressivo à nossa vegetação nativa, em que predominam espécies da subdivisão angiospermae. O que estaria fazendo ali aquela espécime da subdivisão gymnospermae?

Diante daquela cena, sentimo-nos em pleno período paleozóico, quando as gymnospermae dominavam nossas paisagens. Num primeiro momento, chegamos a imaginar que estaríamos sendo severos demais em nosso juízo, mas, ao confrontarmos nossa opinião com a de muitos colegas e freqüentadores desta Universidade, descobrimos que a percepção não era descabida. Muitos vieram nos indagar sobre aquele "monstro" que havia "brotado" em nossa mata. De repente, era como se todos tivessem sido transportados para o filme Jurassic Park ou para o seriado Flinstones, em que a qualquer momento pudessem encontrar com a Pedrita e o Bam Bam (não o do Big Brother). Outros, mais jocosos, supunham que aquela anomalia seria resultado dos "Adubos Tabajara", distribuídos pela surreal Organização do Casseta & Planeta. Cabe ainda ressaltar que tal "objeto", nos moldes em que se apresenta, induz o observador a pensar em um processo de poda inadequada ou incompleta.

Refeitos do susto inicial, tomamos conhecimento de que se tratava de uma antena da Telemig Celular travestida em pinheiro importado da Argentina. Aí lembramos que, há algum tempo, juntamente com os colegas arquitetos da área de planejamento físico da UFMG, fomos solicitados a dar um parecer sobre a instalação de tal antena. Rechaçamos a idéia e defendemos outra opção, a antena "normal", convencional. O motivo era óbvio demais: tratava-se de um objeto de duvidoso gosto estético em que a forma nada tem a ver com a função. Ele segue um modelo muito em voga na segunda metade do século 19, nos primórdios do art-nouveau, em que estruturas, pontilhões e bancos dos parques eram imitações de troncos de árvores (alguns exemplares desse modelo ainda são encontrados no Parque Municipal de Belo Horizonte). É, portanto, um conceito bastante extemporâneo.

Reiteramos nossa posição junto às autoridades universitárias, até que, para nossa grande surpresa, a imprensa noticiou, com grande estardalhaço, a instalação dessa "torre camuflada" no campus Pampulha, com aprovação do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Comam), em audiência pública, após debate com equipes da UFMG (grifo nosso).

É triste verificar que, em plena era da globalização e das facilidades eletrônicas de comunicação, tal audiência pública tenha sido realizada quase que sob sigilo, uma vez que nós, técnicos da área, não fomos convidados a manifestar nossa opinião. Neste fórum de debate, perde mos a oportunidade de ouvir outras argumentações que, porventura, poderiam até mudar nossa posição sobre o tema. Lamentamos que estudiosos das áreas de estética, botânica e ecologia desta Universidade não tenham sido convidados para o debate.

Todo esse processo deixou no ar pelo menos duas dúvidas: que "equipes da UFMG" são essas que debateram a questão? Será que o nosso parecer foi, pelo menos, lembrado nessa discussão?

Por fim, cabe-nos manifestar nossa indignação e protesto pela condução das discussões sobre a instalação dessa antena. Ao disfarçar um objeto tecnológico num objeto natural, a Universidade legitimou uma "falsidade ideológica", uma propaganda enganosa.

*Engenheiro agrônomo
**Arquiteto
(Funcionários do Departamento de Planejamento Físico, Obras e Manutenção - DPFO/DM)