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Nº 1608 - Ano 34
06.05.2008

Reuni: responsabilidades para todos

Gustavo Balduíno*

Em agosto de 2003, a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) formalizou, junto ao presidente Lula, uma proposta para dobrar o número de alunos nas universidades federais, sem comprometer a qualidade e priorizando cursos noturnos, formação de professores para a educação básica, inovação tecnológica e a superação das desigualdades regionais. Na oportunidade, o presidente determinou ao então ministro da Educação, Cristovam Buarque, que a proposta fosse incluída no Plano Plurianual (PPA). Em março de 2008, 53 universidades federais, presentes em todos os estados da federação, firmaram com o presidente um termo de compromisso com este objetivo.

Até 2012, serão R$ 2,4 bilhões em investimentos, 93.319 novas vagas e 1.285 novos cursos de graduação. Destes, 696 serão noturnos e 331 licenciaturas. Também serão criados 640 mestrados e 428 doutorados. O total de matrículas alcançará 1,1 milhão de alunos. Serão criados 25 mil cargos e funções para ocupação escalonada nos próximos quatro anos, de acordo com o Projeto de Lei 3.128/08, assinado recentemente pelo presidente.

Com essas metas, o programa ataca diretamente um problema estrutural reconhecido por todos que é o pequeno percentual de brasileiros no ensino superior, especialmente no público. Neste nível de ensino, nossos indicadores são menores do que os da Argentina, Chile, Europa, EUA e Coréia. Esta realidade inibe o esforço para a superação do atraso relativo e para o desenvolvimento. Por outro lado, todos os indicadores também mostram que as universidades federais têm um padrão acadêmico superior. Portanto, seu papel de referência para regulação e fixação de metas qualitativas para o conjunto das IES será reforçado.

Os números são eloqüentes, e os efeitos diretos, incontestáveis. Porém, há outros aspectos igualmente importantes, como o modelo que viabilizou o programa. A definição de diretrizes acompanhada dos meios para executá-las induziu o planejamento estratégico nas universidades e no governo. Todos os projetos têm duração superior a quatro anos, o que significa que somente após o término dos atuais mandatos presidenciais, de reitores e de parlamentares teremos resultados plenos. Logo, esse modelo confere características de política de Estado ao Programa, beneficiando a sociedade de forma permanente.

O respeito à autonomia da instituição e a aceitação dos projetos condicionada à aprovação dos conselhos superiores permitiram que cada uma das Ifes trilhasse o seu próprio caminho, segundo sua vocação. Esse processo resultou em um termo de compromisso com metas, insumos e cronogramas. Assim, todos os atores envolvidos – MEC, Ministério do Planejamento, reitores, professores, Congresso Nacional, enfim, os agentes públicos do Estado – assumiram responsabilidades política e administrativa.

A novidade é que esses compromissos, derivados de uma proposta surgida da Andifes e assumida pelo governo, poderão ter suas execuções fiscalizadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pela Controladoria-Geral da União (CGU), pelo Ministério Público, além dos próprios signatários, do parlamento e de toda a sociedade.
O descumprimento injustificável de obrigação por qualquer das partes redundará em desgaste político e, talvez, em sanção administrativa.Tal sistemática, fruto de intenso debate entre as Ifes e o MEC, eleva as políticas públicas de educação a um novo patamar.

Um ganho involuntário e parcial, ainda não percebido, é a contribuição do Reuni para solucionar o iminente apagão de mão-de-obra qualificada. Bastou o PIB crescer 5,4% para que este gargalo ao desenvolvimento se apresentasse. Para uns, é fácil ver o buraco na estrada, a escassez de energia, a criança sem aula. Para outros, é motivo de orgulho a expansão industrial, o aumento do IDH e das exportações. Difícil para muitos é perceber que a solução desses problemas ou a perenidade desses êxitos exige mais profissionais bem preparados.

Qualifico esse ganho de involuntário e parcial porque faltou gestão de governo para coordenar esta política pública de educação com outras, potencializando e otimizando esse avanço. O Reuni e as expansões anteriores não foram cotejadas com as necessidades de profissionais para uma política industrial ou de inovação tecnológica, por exemplo, ou com demandas geradas por programas de governo. Assim foi com o PAC, mesmo com o PDE, e mais recentemente com os Territórios da Cidadania. O futuro demandará correções.

Como política de Estado e por ter referência na qualidade, visão de longo prazo e bases gerenciais claras, o Programa representará, quando concluído, uma revolução na educação superior, com repercussão direta nos demais níveis de ensino e conseqüências espraiadas por todas as atividades econômicas. Certamente dará sustentação ao ciclo de desenvolvimento no qual o país aparentemente ingressou. Basta cada um cumprir a sua parte.

É neste contexto que a sociedade brasileira, especialmente os formadores de opinião e as agremiações partidárias, deve compreender que, em um país continental, políticas e serviços públicos de qualidade a que todo cidadão tem direito e a que o Estado se obriga implicam recursos financeiros e humanos bem geridos, mas também substanciais e contínuos.
No Brasil, os investimentos em educação em relação ao PIB ainda são baixos. A Desvinculação de Recursos da União (DRU) retira da área, anualmente, valores superiores ao total previsto para essa expansão em quatro anos. Esta realidade precisa mudar.

* Secretário-executivo da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes)

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