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Nº 1774 - Ano 38
7.5.2012

Para vencer a barreira do som

Dissertações do DCC propõem estratégias para viabilizar acesso de surdos a jogos digitais e às redes sociais

Ana Rita Araújo

A substituição de sons por efeitos visuais em jogos digitais é uma das inovações propostas em dissertação que ­pesquisou a acessibilidade para jogadores surdos ou com deficiência auditiva. A ideia surgiu a partir de estudo feito com mais de 100 pessoas com perda auditiva que detectou menor preferência por jogos nos quais o som exerce papel fundamental para a percepção e a ambientação do jogador, como os de tiro em primeira pessoa (First Person Shooter – FPS).

Defendido recentemente no Programa de Pós-graduação em Ciência da Computação e desenvolvido sob orientação dos professores Raquel Oliveira Prates e Luiz Chaimowicz, o trabalho do aluno Flávio Roberto dos Santos Coutinho utilizou método da engenharia semiótica e propôs abordagem baseada em sinestesia, que substitui um sentido por outro – no caso, a troca de efeitos sonoros por visuais.

O pesquisador adotou a abordagem da sinestesia através de modificação do jogo Half-Life 2, que foi testado tanto por pessoas surdas quanto por ouvintes. Raquel Prates comenta que esse tipo de jogo exige a tomada de decisões com base em sinais audíveis – como passos de alguém que caminha no andar de baixo ou em ambientes próximos sem que possa ser visto pelo personagem principal. “Sem o som ou uma representação visual dele não seria possível ao jogador tomar algumas decisões”, explica a professora.

“A principal conclusão desse trabalho é a necessidade de se pensar em tecnologias assistivas ao desenvolver jogos”, afirma Chaimowicz, ao ressaltar que a dissertação foi escrita em inglês justamente com o propósito de tornar o estudo mais acessível aos desenvolvedores. “Também temos submetido artigos para conferências relacionadas ao assunto, e o autor vem fazendo contato com desenvolvedores”, conta. Chaimowicz afirma que são, ainda, poucos os trabalhos que tratam da acessibilidade em jogos, principalmente voltados para surdos, “embora o tema tenha grande aplicação social e várias questões abertas”.

Redes inclusivas

Outro trabalho recente orientado por Raquel Prates investigou as possibilidades e os limites de uso de redes sociais – em especial o Orkut – pelo público surdo. Ao constatar que as redes sociais online têm se tornado espaço potencial para inclusão social de usuários surdos do Brasil, Glívia Angélica Rodrigues Barbosa analisou como este público as utiliza para interagir com outros usuários.

Segundo a autora, os estudos revelaram que, embora o Orkut possa favorecer a expansão da rede de amizades dos surdos entre si e possivelmente entre ouvintes, algumas decisões do projeto de interface do sistema não estão totalmente adequadas às necessidades e preferências desses usuários. “Há um problema que sequer é percebido pelos programadores: eles não se dão conta de que os surdos adotam o português como segunda língua, e que por isso podem ter dificuldades de uso”, comenta a orientadora.

Glívia Barbosa observou que recursos como fóruns, enquetes e espaço para divulgação de eventos, que só comportam texto, são pouco usados pelos surdos. Já a página de recados (scraps), que abriga também imagens e vídeos, é significativamente mais acessada por esse público. “Fizemos um estudo da cultura surda e identificamos que, para eles, a questão da interação é muito importante. As redes sociais, se projetadas de forma adequada, poderiam viabilizar esse tipo de comunicação, mediada pelas tecnologias”, afirma a autora, ao destacar que a ideia não é propor uma rede social para surdos, mas incluí-los nas atuais redes.

Em questionário elaborado com apoio da professora Elidéa Lúcia Almeida Bernardino, do Núcleo de Língua Brasileira de Sinais (Libras) da Faculdade de Letras, e divulgado em redes específicas para surdos e entre pessoas conhecidas da autora, foi possível avaliar se as interfaces das redes oferecem recursos adequados às necessidades desse público.

Pelas respostas dos questionários, a pesquisadora percebeu que apesar das comunidades declarativas – que reúnem pessoas em torno de um interesse específico – serem aparentemente mais adequadas para tratar de temas comuns ao grupo, o público surdo opta pela página de recados. “Eles confirmaram que têm interesse de encontrar ali outras pessoas surdas, mas preferem conversar pela página de recados, que oferece mais recursos que as comunidades”, relata Glívia Barbosa, ao contar que nas mensagens da página pessoal há muito conteúdo de interesse do grupo, como calendário de eventos, quase sempre com uso de Libras em vídeos legendados. “Existe uma intenção de uso e isso para eles pode ser um fator inclusivo, mas a forma como a interface está projetada não é compatível com as necessidades dos surdos”, reforça a autora.

Dissertação: Revisitando a acessibilidade de jogos para jogadores surdos ou com deficiência auditiva
Autor: Flávio Roberto dos Santos Coutinho
Defesa: 12 de abril de 2012
Dissertação: Caracterização da interação social de usuários surdos em redes sociais online: Um estudo de caso no Orkut
Autora: Glívia Angélica Rodrigues Barbosa
Defesa: 16 de março de 2012