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Nº 1802 - Ano 38
3.12.2012
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Ana Rita Araújo
Os pendões coloridos e esvoaçantes da gramínea Melinis minutiflora chegam a enfeitar a paisagem, mas apesar da aparência inofensiva a planta é descrita por especialistas como uma das grandes invasoras que ameaçam espécies nativas e comprometem a biodiversidade em extensas áreas de preservação. Conhecida popularmente como capim gordura ou capim meloso, seu efeito mais devastador é o de alimentar incêndios, como os que anualmente irrompem e se alastram no Parque Estadual do Rola-Moça.
“No inverno ela seca e vira palha com alto teor de gordura, que se torna poderoso combustível para o fogo. Por isso, o crescimento das áreas ocupadas por essa gramínea é proporcional ao aumento de incêndios”, informa a professora Maria Rita Scotti Muzzi, do Departamento de Botânica do Instituto de Ciências Biológicas, que pesquisa formas de conter o alastramento da espécie e de restaurar as áreas já comprometidas na unidade de conservação. Conselheira do parque, Muzzi destaca que o trabalho é desafiador, já que o Melinis possui alto índice de germinação de sementes e de propagação, é hábil na captação de nutrientes e cria espaços de sombreamento que prejudicam o crescimento de outras espécies.
Estudos da pesquisadora também demonstram que o capim meloso apresenta efeito alelopático, ou seja, inibe a germinação das sementes de espécies nativas. Com equipe de estudantes de graduação e de pós-graduação de cursos como biologia, ciências socioambientais, engenharia florestal e engenharia ambiental, a professora vem realizando testes para descobrir plantas nativas que possam competir com o Melinis e inibir ou coibir sua ação agressiva. “Temos feito análises competitivas de crescimento, para selecionar espécies nativas que suportem o efeito inibitório da invasora”, comenta Muzzi, informando que a intenção é subsidiar o manejo para restauração das áreas do parque comprometidas pela invasão do capim meloso. “Já temos plantas com potencial para competir com o Melinis”, anuncia ela, citando as famílias fabaceae (leguminosas) e asteraceae (plantas compostas).
O gerente do parque, Marcus Vinícius Freitas, comenta que os incêndios alimentados pelo capim também têm efeito benéfico para a espécie invasora, que extrai das cinzas elementos como fósforo e nitrogênio, favorecendo sua germinação e desenvolvimento. Paralelamente às pesquisas, a professora defende a adoção de ação para alertar a comunidade e especialmente as mineradoras do entorno do Parque do Rola-Moça, para que deixem de semear o capim gordura, usado para encobrir áreas degradadas. “Há espécies nativas na própria flora da Área de Preservação Ambiental (Apa) Sul da Região Metropolitana de Belo Horizonte – formada pelos biomas mata atlântica, cerrado e campo rupestre – que podem ser utilizadas com essa finalidade”, assegura a professora. Aos moradores dos condomínios da região, Maria Rita Scotti Muzzi sugere que façam aceiros e retirem o meloso na bordadura do terreno, para evitar que a planta se alastre.
Contudo, se tais medidas impedem que o problema assuma maiores proporções no entorno do parque, ainda resta o grande desafio de extinguir a espécie invasora e recompor a paisagem na área de quatro mil hectares do Rola-Moça. “Se fosse usado maquinário para eliminar o capim meloso, as plantas nativas seriam arrancadas junto. Também não é possível fazer manualmente esse processo, devido às dimensões da área”, expõe a professora, ao dizer que o ideal seria mudar geneticamente o meloso, para que ele tivesse menor capacidade competitiva, mas experiências com esse fim, desenvolvidas fora do país, ainda não têm resultados promissores. Daí a aposta na própria capacidade reativa de espécies nativas.
Além do manejo para recompor o parque – que deve durar pelo menos uma década –, a professora defende a adoção de políticas públicas que evitem situações semelhantes no futuro. “É inadmissível que se permita o cultivo do meloso perto de áreas preservadas, que já são pouquíssimas”, opina. Originário da África, o Melinis minutiflora é usado como pastagem de gado leiteiro, por seu elevado teor lipídico.
O Parque Estadual do Rola-Moça é o terceiro maior em área urbana do país e abriga alguns dos mananciais que abastecem a capital. Criada em 1994, a unidade de conservação está localizada nos municípios de Belo Horizonte, Nova Lima, Ibirité e Brumadinho.
Situado em zona de transição de cerrado para mata atlântica, é rico em campos ferruginosos e de altitude, onde se encontram espécies como orquídeas, bromélias, candeias, jacarandá, cedro, jequitibá, arnica e a canela-de-ema, que se tornou o símbolo do parque. É hábitat natural de espécies da fauna ameaçadas de extinção como a onça parda, a jaguatirica, o lobo-guará, o gato-do-mato, o macuco e o veado campeiro.
Segundo o Instituto Estadual de Florestas (IEF), o nome do parque foi contado em “causo” e imortalizado por Mário de Andrade em poema que relata a história de um casal que, logo após a cerimônia de casamento, cruzou a Serra de volta para casa. No caminho, o cavalo da moça escorregou no cascalho e caiu no fundo do grotão. O marido, desesperado, esporou seu cavalo ribanceira abaixo e “a Serra do Rola-Moça, Rola-Moça se chamou”.