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Nº 1863 - Ano 40
12.05.2014

opiniao

Os técnicos e administrativos em educação e a Universidade

Luciano Mendes de Faria Filho*

Os técnicos e administrativos em educação (TAEs) estão, mais uma vez, em greve na UFMG. Não pretendo aqui entrar no mérito do movimento, mas chamar atenção para a importância de se discutir a situação estrutural dessa categoria de servidores na Universidade. A questão que proponho é: o que podemos fazer para possibilitar que os TAEs deem suporte às atividades-fim, ou seja, ao ensino, à pesquisa e à extensão?

Todos sabemos que, de um modo geral, os TAEs dão suporte, fundamentalmente, às atividades-meio da UFMG, sobretudo à administração. Sabemos também que, ao longo das últimas décadas, com a transformação das principais universidades brasileiras em grandes centros de ensino, pesquisa e extensão, muito pouco foi feito para dotá-las de um corpo de funcionários – de uma burocracia especializada, no melhor sentido weberiano – capaz de administrá-las em suas especificidades. O que ocorreu, salvo raras exceções, foi a contratação de serviços de terceiros e de bolsistas para dar suporte às atividades-fim e um deslocamento cada vez maior dos TAEs para as atividades-meio. Contra isso pouco se fez; contra isso, de fato, foi pequena a mobilização dos professores; contra isso pouco se ouve falar nos momentos de greve ou não dos TAEs; medidas contra esse estado de coisas pouco aparecem entre as reivindicações dos movimentos dos professores e TAEs.

O grande problema, penso eu, é que o modo corporativo como nossas reivindicações são produzidas e conduzidas, somado à pouca clareza da Andifes sobre o tema, nos faz acreditar que há saída fora da ação coordenada dos dois segmentos – professores e técnicos. Penso que não há. Não é possível avançar com a universidade sem uma burocracia especializada e sem suporte de servidores técnicos especializados atuando diretamente nas atividades-fim. A ausência disso, como já estamos sentindo, são a falta de profissionalismo e a descontinuidade das ações; são os professores deslocando seu tempo e sua energia para tarefas que competem diretamente com o tempo e a energia dedicados ao ensino, à pesquisa e a extensão; são TAEs especializados e frustrados em suas perspectivas profissionais.

A única saída é a construção de uma nova carreira para os TAEs, a mobilização de todos os segmentos e suas instâncias organizacionais pela contratação de um número bem maior de técnicos e administrativos e sua formação/especialização para oferecer suporte às atividades-fim. Não faz sentido o investimento da sociedade brasileira no doutoramento de um TAE se este vai continuar executando atividades para as quais foi contratado com a exigência apenas de nível médio ou superior. Assim como não dá para exigir que os TAEs realizem atividades de suporte ao ensino, à pesquisa e à extensão para as quais ele não foi contratado. Um novo plano de cargos e salários é imperativo para sair da crise em que atualmente nos encontramos.

Uma discussão nessa direção não resolve em nada a atual situação de greve. Mas a não discussão significa, apenas, que vamos acabar essa greve preparando a próxima. As universidades se transformaram em complexas instituições que mobilizam e administram milhares de pessoas e bilhões de recursos anualmente. Não são ambientes para “amadores”. E, ao que parece, nossas reflexões e reivindicações, tanto de professores quanto de TAEs, pouco têm avançado para produzir saídas efetivas para os desafios que enfrentamos. Ou reconstruímos o pacto sobre a atuação dos TAEs no suporte às atividades-fim da Universidade, inclusive para liberar os professores de trabalhos técnicos que lhes sugam energia e significam desperdício de recursos públicos, ou não há saída possível. Pior: a saída será o aprofundamento da precarização do suporte às atividades-fim, o pequeno envolvimento dos professores com a “sorte” dos TAEs e o aumento da importância de dimensões periféricas e corporativas em detrimento às centrais.

O presente e o futuro da Universidade dependem da capacidade de, ultrapassando nossas legítimas posições corporativas, produzir novas configurações institucionais e, consequentemente, de profissionais que estejam em sintonia com os desafios postos pelas atividades de ensino, pesquisa, extensão e administração universitária e, ao mesmo tempo, fazer jus ao respeito aos direitos e às expectativas da população que nos mantém por meio do pagamento de impostos. Fugir disso pode ser ótimo para nossas corporações profissionais, mas será péssimo para a Universidade e um desrespeito aos cidadãos que nos sustentam.

Afinal, é possível fazer isso sem uma efetiva autonomia universitária? Talvez seja por isso mesmo que a questão – englobando, inclusive e fundamentalmente, a autonomia das universidades para gerir seus recursos financeiros e humanos – esteja tão fora de moda nos debates propostos em todas as instâncias ligadas às universidades públicas, inclusive a Andifes e o Andes. Quase todos os desenhos produzidos nos últimos anos retratam uma autonomia relativa, o que, ao fim e ao cabo, não proporciona autonomia às universidades.

*Professor titular da Faculdade de Educação