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Nº 1867 - Ano 40
09.06.2014

Quem não tem colírio...

Faculdade de Farmácia e Funed desenvolvem sistema de liberação controlada para tratar doenças da córnea

Luana Macieira

Embora o uso de colírios seja a forma mais simples para tratamento de doenças oculares, a sua aplicação várias vezes ao dia provoca baixa adesão dos pacientes a tratamentos longos. Para melhorar a eficácia das terapias de doenças que afetam a córnea, pesquisadora da UFMG e da Fundação Ezequiel Dias (Funed) desenvolveu um sistema que permite a liberação controlada de medicamento no olho do paciente.

O método está descrito na tese de doutorado Desenvolvimento de sistema biodegradável contendo bevacizumabe para inibição da neovascularização da córnea, defendida por Ana Elisa Reis Ferreira em abril na Faculdade de Farmácia da UFMG. Em seu trabalho, ela propõe um dispositivo flexível, em forma de bastão, com cerca de cinco milímetros e constituído de poliuretano. O bevacizumabe, medicamento indicado para a redução da formação de vasos sanguíneos, é incorporado ao poliuretano e introduzido no saco conjuntival inferior pelo próprio paciente. Depositado neste local, o dispositivo libera a dose do medicamento de forma prolongada e contínua, dispensando o paciente de aplicar o colírio várias vezes ao dia.

“Quando o colírio é aplicado, apenas 5% do medicamento é, de fato, absorvido. Além disso, são poucos os que conseguem aplicá-lo colírio cinco vezes ao dia por muito tempo, o que dificulta a adesão a tratamentos longos”, explica a pesquisadora, para quem o fato de o paciente não precisar administrar o medicamento várias vezes ao dia é fator decisivo para o sucesso do tratamento. “Ao colocar o dispositivo no saco conjuntival, ele esquece que o remédio está ali, só precisando retirar o dispositivo ao final do dia”, diz.

Além da maior adesão, o dispositivo garante a liberação de uma pequena quantidade do medicamento, mas que é suficiente para o tratamento. Como parte do colírio aplicado no olho não chega a ser absorvido, aplicações repetidas diariamente são necessárias, o que pode causar efeitos adversos, levando a uma redução da adesão dos pacientes ao tratamento.

Os testes realizados em coelhos mostram que o dispositivo é seguro e não causa incômodo, apesar de o olho ser um órgão delicado. A princípio, o tratamento prevê a troca diária do sistema, mas as próximas etapas do estudo, realizado em parceria com a Fundação Ezequiel Dias (Funed), estão focadas no desenvolvimento de dispositivo que libere medicamento por mais tempo e que não precise ser retirado pelo paciente, sendo absorvido pelo organismo sem efeitos adversos.

‘Extrabula’

Medicamento empregado pela pesquisadora Ana Elisa em seu estudo, o bevacizumabe é uma substância largamente usada no tratamento de vários tipos de câncer devido à capacidade de impedir a formação de novos vasos sanguíneos em tumores. No mundo inteiro, porém, médicos fazem uso off-label [não previsto na bula do medicamento] do bevacizumabe em tratamentos para a neovascularização ocular. “Na maioria das doenças oculares, o medicamento é aplicado no olho por injeção. No caso das doenças de córnea, existe a possibilidade de usá-lo como colírio, aplicando o medicamento, que é líquido, diretamente no olho”, explica a pesquisadora.

Atualmente, o uso do bevacizumabe no sistema ocular é mais comum no tratamento da retinopatia diabética e da degeneração macular relacionada à idade. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, as doenças da córnea são a terceira causa de cegueira do mundo.

“As doenças neovasculares na córnea podem ser causadas por inúmeros fatores, como inflamação, infecção viral ou bacteriana, uso de lentes de contato e até mesmo cirurgias. Há uma gama de situações que podem provocar a formação desses vasos sanguíneos que levam à cegueira. Daí a importância de criarmos métodos de tratamento mais práticos e eficazes”, conclui Ana Elisa Reis Ferreira.

Tese: Desenvolvimento de sistema biodegradável contendo bevacizumabe para inibição da neovascularização da córnea
Autora: Ana Elisa Reis Ferreira
Orientador: Armando da Silva Cunha Junior
Defendida em 30 de abril, na Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas da Faculdade de Farmácia