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Nº 1891 - Ano 41
09.02.2015

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Câncer no alto da floresta

Estudo da UFMG revela que plantas que habitam áreas mais elevadas da Amazônia, com características de savana, estão mais propensas a tumores

Luana Macieira

Há 25 anos, um grupo de pesquisadores da UFMG investiga os fatores que geram predisposição para ocorrência de tumores em plantas. No artigo Unexpected high diversity of galling insects in the Amazonian Upper Canopy: the savana out there, publicado na revista PLOS One, a equipe descreveu sua última descoberta: as plantas que vivem na parte mais alta da floresta amazônica têm a mesma predisposição a tumores que as que compõem formações vegetais de savana, bioma muito mais seco que o amazônico. “Apesar de a Amazônia possuir uma formação vegetal muito úmida, percebemos que, na parte mais alta da floresta, também chamada dossel, existe uma formação de savana. É uma camada da floresta extremamente seca, com altas temperaturas e que submete a vegetação a elevadas condições de estresse”, explica o professor Geraldo Wilson Fernandes, do Departamento de Biologia Geral do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG.

Em pesquisas anteriores, o professor já havia observado que espécies que vivem sob condições severas de ­estresse ambiental, como escassez de água ou nutrientes, estão mais sujeitas a tumores. Assim como nos animais, o câncer age de forma parasitária sobre o organismo da planta, podendo provocar sua morte. “Uma planta estressada é aquela que sofre com falta de água, nutrientes e sais minerais e com o excesso de sol. Suas células passam a não ‘conversar’ mais e, por isso, não conseguem ativar o sistema imunológico de forma eficiente para destruir o tumor”, detalha Fernandes.

A equipe do professor Geraldo Fernandes já havia realizado testes em diversas outras formações vegetais, como o cerrado e a mata atlântica brasileira e as savanas norte-americanas. Segundo ele, a grande descoberta da última etapa da pesquisa está associada ao fato de que a floresta amazônica possui trechos que se comportam como savana, onde a vegetação é submetida à falta de água e ao excesso de radiação solar. “No cerrado, isso já era evidente. Sabíamos que aquele ambiente era estressante e que, por isso, a incidência de câncer em espécies de cerrado era alta. A Amazônia foi o último bioma onde analisamos a relação entre estresse e tumores. O mais interessante foi constatar que o ambiente favorável ao câncer das plantas só ocorre em uma parte muito específica da floresta, no seu topo”, afirma.

Segundo Fernandes, a explicação para a existência dos tumores em vegetações do topo da floresta é simples: “Trata-se da parte mais estressada da floresta. Apesar da grande quantidade de chuvas, a umidade desaparece rapidamente, devido à forte incidência solar. As folhas do dossel da floresta amazônica também são muito duras, o que dificulta a vida de inimigos naturais que poderiam eliminar os tumores, que, nesse ambiente hostil, têm mais chances de parasitar as plantas.”

Relevância econômica

Para as análises, foram coletadas mais de duas mil espécies do dossel da floresta amazônica. O trabalho, realizado em parceria com a UFMG pela pesquisadora Genimar Julião, do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa), durou quatro anos, dando origem à sua tese de doutorado.

Segundo o professor Geraldo Fernandes, o estudo é muito importante porque o planeta está passando por mudanças climáticas e aumento da temperatura global. “No futuro, as plantas vão sofrer mais porque estarão sujeitas a mais estresse. Pesquisas como esta ajudam a buscar métodos para proteger as plantas de importância econômica (milho, sorgo, trigo e soja) dos tumores que podem destruir plantações inteiras”, argumenta o pesquisador.

Os pesquisadores pretendem, ainda, investigar as respostas imunológicas das plantas com o objetivo de desenvolver métodos que as deixem menos vulneráveis ao câncer. “Os tumores indicam que o clima está mudando e para pior. Investigar as mudanças da biota da Terra é essencial para que as próximas gerações assegurem suas produções agrícolas e qualidade de vida”, conclui o professor Geraldo Wilson Fernandes.


Artigo: Unexpected high diversity of galling insects in the Amazonian Upper Canopy: the savana out there
Autores: Genimar Julião, Eduardo Venticinque, Geraldo Wilson Fernandes e Peter Price.
Publicado na revista PLOS One, em dezembro de 2114 e disponível em http://www.plosone.org/article/info%3Adoi%2F10.1371%2Fjournal.pone.0114986