Museus, saúde mental e bem-estar – Espaço do Conhecimento UFMG
 
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Museus, saúde mental e bem-estar

27 de fevereiro de 2023

 

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Museu e saúde

 

Os centros culturais sempre apresentaram uma função muito importante na sociedade. As diferentes exposições apresentadas em museus contribuem na construção e ampliação de nossa identidade, auxiliam na elaboração do nosso conhecimento sobre o passado e dão perspectivas sobre nosso futuro. Seja através dos materiais expostos, das pesquisas realizadas por essas instituições ou até pelas respostas coletivas encontradas junto à comunidade, os museus funcionam como um mediador de relações, que permite às pessoas se conectarem consigo mesmas e com as comunidades. Nesse sentido, por meio da criação de laços de pertencimentos é que os museus contribuem para a saúde e o bem-estar, pois estudos já comprovam, especialmente para grupos minoritários, que um senso alto de pertencimento e de comunidade reduzem problemas como ansiedade, estresse e depressão.

 

A saúde mental nos últimos anos ganhou destaque nas redes sociais, nos veículos de comunicação, em palestras e fóruns acadêmicos, dentre outros, em função da pandemia de COVID-19. O isolamento social para o controle das infecções e consequentemente o fechamento de museus, espaços culturais, cinemas, escolas e outros espaços de sociabilidade, evidenciaram a importância que esses espaços possuem para a saúde mental da população.  

 

Nesse contexto de pandemia e, por consequência, um estado alarmante do quadro clínico geral da população mundial, a produção cultural mostrou ser um agente essencial na manutenção da saúde mental. Assim, museus e galerias de arte, que não são organizações primordialmente pensadas como mecanismos de saúde pública, por meio da realização de atividades virtuais para manter contato com o seus públicos e promover a interação, contribuíram para amenizar o impacto do isolamento social na saúde mental das pessoas.

 

Vitamina de cultura

 

(Imagem Museu Real de Belas-Artes da Bélgica em Bruxelas – imagem do banco da dados gratuito pixabay)

 

A relação entre museu e saúde acabou chamando atenção de pesquisadores e museus por todo o mundo.  A Dinamarca, por exemplo, em setembro de 2022, incluiu os museus em suas rotinas de saúde. Nesse país há o termo Kulturvitaminer, que em português significa vitamina de cultura. A proposta é que pessoas diagnosticadas com depressão, desempregadas ou com licença médica por razões diversas, formem grupos para vivenciar atividades culturais. Atualmente, o programa conta com centenas de participantes, sendo realizadas em média três atividades culturais semanalmente, que incluem visitas a museus, galerias e jardins botânicos. Os médicos dinamarqueses vislumbram resultados positivos e os próprios pacientes confirmam que as idas aos museus junto a outras pessoas os fazem “esquecer” de suas ansiedades e se reconhecerem novamente. Diversos outros países também investem na cultura como auxiliar em tratamentos de saúde mental:

 

  • A Austrália reúne informações e promove o uso de arte na saúde pública desde 2013 junto ao Departamento de Comunicações e Artes;

 

  • Em Bruxelas, capital belga, em 2022, médicos ganharam a permissão de prescrever visitas a centros culturais como parte do tratamento para ansiedade, estresse e depressão. A prescrição possibilita entrada gratuita em museus que concordaram participar da iniciativa que defende que a cultura é essencial para a saúde mental;

 

  • No Canadá, a província de Quebec atua desde 2018 em pesquisas que mostram como o contato com a arte e os estímulos à criatividade beneficiam os pacientes que sofrem com adoecimentos mentais, dores crônicas e auxilia nos cuidados paliativos.

 

Além destes, Suécia, Noruega e Reino Unido também apresentam iniciativas no campo e são considerados países avançados nesse quesito. A relação cultura-saúde ainda é um campo que tem muito a desenvolver, mas suas potências já se mostram bastante efetivas e nítidas.

 

Onde entra o Brasil nisso?

(Reprodução Nise da Silveira, em julho de 1970. Acervo Arquivo Nacional.)

 

Em terras brasileiras, Nise da Silveira, médica psiquiatra, deu o pontapé inicial nessa relação aqui no Brasil. Contrária a tratamentos agressivos, tornou-se a primeira a introduzir ateliês de pintura e modelagem na área da terapia ocupacional no Centro Psiquiátrico do Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro, na década de 1940, possibilitando aos pacientes desenvolver trabalhos que hoje estão reunidos no Museu de Imagens do Inconsciente, centro de estudo e pesquisa fundado por Nise em 1952. Atualmente, existem diversas iniciativas por todo o Brasil que associam cultura a políticas de saúde pública. Essas ações  se apoiam na ideia de promover a inclusão de grupos minoritários nos espaços museológicos e culturais com o intuito  de ampliar os acessos a esses locais, fortalecendo a rede de saúde mental dessas pessoas.

 

Por fim, o Espaço do Conhecimento UFMG!

 

Reconhecendo museus como espaços de integração – com papel fundamental na percepção de pertencimento à comunidade, na construção da própria individualidade e nas influências que isso tem sobre saúde mental – novas perspectivas de atualização como um lugar mais vivo para encontros e transformação surgem. 

 

Por isso, o Espaço do Conhecimento realiza hoje diversas oficinas que promovem interação e conhecimento, que não só despertam aspectos novos dentro da experiência museológica, mas também propiciam inclusão e acessibilidade através de exposições. Nesse sentido, isso acontece com a exposição  Mundos Indígenas, que apresenta os modos de viver, de saber e de cuidar dos povos Maxakali, Pataxoop, Xakriabá, Yanomami e Ye’kwana; ou oficinas do Sábado com Libras ou como na atividade  TaTEAndo o museu, que propõe apresentar a crianças no espectro autista alguns dos conteúdos do museu através de histórias e materiais táteis. 

 

O museu tem potencial que tradicionalmente não está associado à saúde, mas ao estar à serviço das pessoas, da comunidade, com o compromisso social de promover bem-estar, torna-se componente único para saúde mental pública. Não é sobre fazer terapia clínica, mas sobre reconhecer que a experiência museológica carrega um caráter terapêutico único. E que uma visita ao museu, no final, traz mais benefícios do que imaginamos.

 

(Oficina  Libras para Crianças – Créditos: Acervo do Espaço do Conhecimento UFMG)

 

[Texto de autoria de Christopher E. Mourão, aluno do curso de graduação em Psicologia e estagiário do Núcleo de Ações Educativas]

 

Referências:

Souza, V. L. T, Dugnani, L. A. C., & Reis, E. C. G. Psicologia da Arte: fundamentos e práticas para uma ação transformadora. Estudos de Psicologia (Campinas), 35(4), 2018, 375-388. Disponível em <https://www.scielo.br/j/estpsi/a/55QML8QcV9DwJF8JfgJJpfh>

GALVANESE, Ana Tereza Costa et al. Arte, saúde mental e atenção pública: traços de uma cultura de cuidado na história da cidade de São Paulo. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, v.23, n.2, abr.-jun. 2016, p.431-452. Disponível em <https://www.scielo.br/j/hcsm/a/FBgWRdBb85bywqLbLYh3HnF>

COSTA, H. H. F. G. Museus fazem bem à saúde? : uma tese sobre museu e saúde na sociedade do século XXI. Museologia & Interdisciplinaridade, 9(17), 2020, 147–157. Disponível em <https://periodicos.unb.br/index.php/museologia/article/view/29475>

Museus e Bem-estar | Museums and Wellbeing. Youtube. 26 de Novembro de 2021. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=ifpBFondWpk>. Acesso em 01 de Fevereiro de 2023.

Pedro. A reinvenção dos museus no pós-pandemia. Revista Museu. Disponível em <https://www.revistamuseu.com.br/site/br/artigos/18-de-maio/18-maio-2021/11361-a-reinvencao-dos-museus-no-pos-pandemia.html>