Conheça a história do gato mais famoso da física quântica, desde suas origens como um experimento mental, até sua explosão como ícone da cultura pop
13 de junho de 2023
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Aqui no Blog do Espaço, já falamos brevemente sobre o nascimento da física quântica, onde mencionamos figuras como Max Planck, Albert Einstein e Niels Bohr, reconhecidos como alguns dos fundadores deste campo tão importante para o funcionamento do mundo moderno. Entretanto, um dos exemplos mais famosos desta área não partiu da mente de nenhum desses cientistas, mas sim de um pesquisador austríaco do mesmo período, Erwin Schrödinger.
Interpretação de uma artista do “Gato de Schrödinger” em diferentes tamanhos, 2023. (Créditos: ETH Zurich)
Durante o começo do século XX, a física quântica ainda estava em sua infância, e não era tão plenamente entendida e aceita como na contemporaneidade, por isso, diferentes universidades possuíam diferentes visões sobre esta ciência, e com considerável frequência, estas perspectivas divergentes vinham de encontro umas às outras, resultando em calorosos debates entre seus apoiadores. Neste contexto, surge nas escolas de Copenhague, capital da Dinamarca, a ideia de superposição de estados, a premissa de que os menores corpos do universo, como elétrons e fótons, poderiam estar em dois estados ao mesmo tempo.
Tomemos um elétron como exemplo. De acordo com esse conceito, antes de tentarmos fazer qualquer medição que seja, o elétron se encontraria tanto em um estado de partícula como de onda, ou seja, em uma superposição de estados. Assim que tentássemos observar (medir) o que está acontecendo com ele, o elétron seria forçado a se mostrar ou só como partícula ou só como onda, realizando o que chamamos de colapso da superposição. Ou seja, não é possível observar essa superposição, pois a mera interação do observador já contaria como uma interação, e resultaria no colapso.
Schrödinger achava essa ideia tão ridícula que se propôs a imaginar um cenário completamente absurdo para provar seu ponto. Imagine um gato dentro de uma caixa, junto a um objeto que pode ou não matá-lo em mais ou menos uma hora, como uma fonte de radiação, por exemplo. A caixa é selada com o animal e o composto químico dentro dela e deixada isolada. Após aproximadamente uma hora, de acordo com Schrödinger, o gato se encontraria em um estado de superposição, estando ao mesmo tempo vivo e morto, pois para todos observando o experimento, não seria possível ter certeza do estado do gato até que alguém abrisse a caixa, ou seja, interagisse com ela, forçando o colapso da superposição para um gato vivo ou morto!
É importante falar que este experimento nunca foi realizado na prática, ou seja, nenhum felino foi ferido na realidade. E se esse experimento não faz sentido algum para você, caro leitor, não se preocupe, pois era exatamente essa a intenção de Schrödinger, provar que a escola de Copenhague estava completamente enganada. O problema, entretanto, é que o experimento mental que Schrödinger imaginou, serve perfeitamente como um exemplo de como a física quântica realmente funciona. Hoje, após mais de um século de pesquisas, sabemos que corpos de tamanhos menores que um átomo possuem esta característica, ou seja, matematicamente falando, o gato do experimento realmente estaria vivo e morto ao mesmo tempo.
Schrödinger nunca aceitou as ideias da escola de Copenhague, sua decepção era tanta que mais tarde na vida decidiu por abandonar a física quântica e se dedicar a outras áreas. Mas, mesmo que seu dono tenha abandonado este campo da ciência, o gato continuou atuando como um ótimo exemplo, não pela sua precisão descritiva, mas sim pelo absurdo que este exemplo nos faz contemplar, sendo então um convite para que possamos começar a compreender uma ciência tão complexa como essa.
(Créditos: Michael S. Helfenbein/Universidade Yale)
E com o passar das décadas, o gato de Schrödinger se tornou mais famoso que seu criador, rompendo as barreiras de um mero experimento mental, para se tornar um ícone da cultura popular.
As primeiras produções a conterem referências ao experimento do gato foram feitas na literatura da ficção científica, onde ele aparece como um personagem que não sabe se está vivo ou morto. Mais tarde, o animal até mesmo faz aparições na série do mochileiro das galáxias de Douglas Adams, e em Deuses Americanos de Neil Gaiman. No cinema e na televisão, o felino aparece desde Doctor Who e Monty Python, até Futurama e The Big Bang Theory, além de aparecer em vídeo games como um gato claustrofóbico traumatizado pelo tempo que passou na caixa, e como título de uma música de rock dos anos 80.
Não precisamos ir longe para encontrar referências ao mascote favorito da física quântica, uma vez que ele estampa camisas e moletons, além de constantemente atuar como um meme da internet. Da próxima vez que você vir uma referência a esse felino, saberá a história por trás dele.
Lembre-se de tratar bem todos os gatos que aparecerem na sua frente, afinal, nunca saberemos quando um físico maluco vai querer trancá-los dentro de uma caixa!
[Texto de autoria de Thiago Araújo, estagiário no Núcleo de Astronomia do Espaço do Conhecimento UFMG]
Referências
MLODINOW, Leonard. The Upright Thinkers: The Human Journey From Living in Trees to Understanding the Cosmos. New York: Pantheon Books, 2015. Acesso em: 07 de Mar. 2023.
ROONEY, Anne. A História da Física. Trad. M.L. Rosa. São Paulo: Mbooks. 2013. Caps. 5 e 7
STYER, Daniel F. The Strange World of Quantum Mechanics. Cambridge University Press, Cambridge, U.K., 2000