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Nº 1331 - Ano 28 - 13.12.2001

 

 

A controvérsia sobre as fundações

Jacques Schwartzman*

ecentemente temos acompanha do uma intensa e polêmica discussão sobre o papel das fundações de apoio no âmbito das universidades estatais. As duas principais críticas a estas organizações são as seguintes:

1."Sem os controles devidos, as fundações podem interferir seriamente no funcionamento dos departamentos, das faculdades e da própria Universidade, cujas políticas devem ser fixadas pelos colegiados próprios " (José Goldenberg, ex-reitor da USP, 1989).

Devido ao volume de recursos que administram, as fundações podem cair na tentação de conduzir programas acadêmicos próprios, tais como idealizar cursos ou, por sua iniciativa, oferecer serviços utilizando ou não recursos humanos e materiais da Universidade. Podem ainda interferir na política de alocação interna de recursos da Universidade ao favorecer financeiramente determinados departamentos ou unidades com empréstimos subsidiados, doações e patrocínios.

Há pelo menos três maneiras de se evitar estas situações. A primeira prevê que o Diretor da Fundação ocupe um cargo de confiança (em vez de um mandato) e possa ser exonerado a critério do Reitor. A segunda determina que o Conselho Curador tenha a sua composição menos dependente das indicações do Reitor, com maior participação do Conselho Universitário, que teria a atribuição de supervisionar as atividades da Fundação. Outra providência é garantir que a maior parte do resultado operacional da fundação seja transferido à Universidade para ser utilizado de acordo com as políticas desta última.

2. As fundações são o instrumento utilizado pelo governo federal para a privatização das universidades públicas. Ao não prover adequadamente os orçamentos das Universidades, o governo as obriga a procurar no mercado recursos para complementar sua receita, desobrigando-se de suas responsabilidades. A busca adicional de recursos distorce os objetivos da universidade e prejudica a pesquisa e a graduação.

Este argumento enseja duas considerações ambíguas. Por um lado, não se pode dizer que todas as fundações foram criadas em épocas de escassez de recursos. A Fundep, por exemplo, foi criada em 1974, como um mecanismo para dar flexibilidade e agilidade às atividades de pesquisa da UFMG. Com o passar dos anos, foi assumindo funções que a estrutura burocrática e dependente do governo federal não conseguia realizar, tais como efetuar importações, contratar mão-de-obra temporária, prestar contas junto a órgãos públicos, gerenciar cursos e prestação de serviços de departamentos e unidades, etc. Pode-se dizer que a maioria das fundações foi inicialmente criada em resposta à falta de autonomia administrativa e financeira das universidades públicas.

Mais recentemente, as fundações tornaram-se elementos muito importantes no financiamento das universidades, já que passaram ao primeiro plano a necessidade de complementação salarial de professores e funcionários e a suplementação de recursos financeiros, originados da prestação de serviços, para departamentos e unidades. Pôde-se assim manter e até mesmo atrair quadros competentes para a Universidade e prover manutenção razoável a muitos setores.

Quanto à questão da distorção das finalidades das universidades, através da prestação de serviços e cursos de extensão realizados pelas fundações, é preciso enfatizar que este é um problema a ser resolvido pela própria universidade. Na UFMG, a Resolução 10/95 disciplina a participação de servidores em atividades de extensão, e sabemos que as fundações desta Universidade só gerenciam atividades que forem expressamente autorizadas pela Câmara Departamental e pela direção da Unidade. Cabe a elas alocar o tempo dos seus professores e verificar quais são as atividades de seu interesse acadêmico. As fundações não têm legitimidade para realizar esta tarefa e não podem ser responsabilizadas por suas conseqüências.

Existem ainda outras propostas para as fundações, como não cobrar por cursos de extensão e distribuir para todos as complementações de servidores. Aqui novamente, não é uma política que deva ser decidida pelas fundações e sim pelas unidades que geram os cursos e a prestação de serviços. Em algumas, existe um Fundo originado de um percentual das atividades das fundações, que beneficiam a todos os servidores. Em outras, pode haver o desejo de oferecer cursos gratuitos de extensão a estudantes carentes. Nos dois casos, a decisão não poderá ser tomada pelas fundações.

Na atual conjuntura de escassez de recursos e de falta de autonomia, as fundações são necessárias ao funcionamento das universidades públicas. Mas suas relações com as entidades que apóiam precisam ser aperfeiçoadas, delimitando-se precisamente o papel de cada uma. Neste processo é preciso assegurar que, sem perder o controle, a Universidade não lhes coloque uma camisa de força que as prive de sua capacidade gerencial, esta sim, necessária nos moldes das mais eficientes empresas privadas. Finalmente, é importante enfatizar que as fundações de apoio levam este nome exatamente por terem como missão servir à universidade (que as criou), cabendo a esta coibir a busca de objetivos estranhos às suas finalidades e garantir maior eficiência na prestação de seus serviços à comunidade universitária.

* Diretor-executivo da Fundep