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Nº 1482 - Ano 31 - 5.5.2005

ICB estuda vacina e diagnóstico da xistosa a partir de genoma do Schisto

Pesquisadora descobriu proteína com capacidade para ativar sistema imunológico

Ana Paula Ferreira

seqüenciamento do código genético do Schistosoma mansoni, agente causador da esquistossomose, pode resultar em novo método de diagnóstico e numa vacina inédita contra a doença. Os estudos estão sendo desenvolvidos no Laboratório de Imunologia de Doenças Infecciosas da UFMG (Lidi), coordenado pelo professor Sérgio Costa Oliveira, do ICB.

A pesquisa tem como base o trabalho da Rede Genoma de Minas Gerais, da qual participam sete instituições de pesquisa do Estado envolvidas no seqüenciamento do genoma de todas as fases de desenvolvimento do Schistosoma mansoni. O Núcleo de Bioinformática da UFMG é responsável pelo processamento das informações.

A partir de dados fornecidos pela Rede, a pesquisadora Fernanda Cardoso, do Lidi, começou a decifrar os genes do Schistosoma mansoni, selecionando proteínas que poderiam viabilizar nova forma de diagnóstico e produção de vacina contra a enfermidade. Diante da gama de possibilidades, ela estabeleceu um foco: as glicoproteínas ou proteínas de membrana. "Teoricamente, o sistema imune reconhece primeiro tais proteínas, localizadas na superfície do parasita, expostas. Conseqüentemente, motivam a produção de anticorpos contra o helminto causador da doença", explica.

Entre as proteínas selecionadas, uma se destacou: a Sm-29 ( Schistosoma mansoni -29 kDa). Segundo Fernanda Cardoso, ela está presente em algumas fases do parasita e foi sintetizada em grande escala no laboratório. "Essa é uma característica essencial, pois muitas proteínas não têm produção viável, o que impede a fabricação de novas vacinas", diz.

Anticorpos

A prova de que a Sm-29 reage com componentes do sistema imune foi alcançada na fase seguinte da pesquisa, quando realizada a sorologia de pacientes. Através da técnica de Elisa*, foram detectados anticorpos que combatem essa proteína em pacientes naturalmente resistentes _ moradores de áreas endêmicas e que não contraíram esquistossomose _ e em indíviduos já curados, imunes a nova manifestação da doença. "Esse é outro dado importante, pois existem anticorpos que, apesar de reconhecerem antígenos ( agentes estranhos ) no organismo, não ativam satisfatoriamente o sistema imune", argumenta a pesquisadora.

A descoberta de anticorpos capazes de neutralizar a proteína Sm-29 pode significar a superação de um grande obstáculo ao tratamento da doença. "O atual método baseia-se na descoberta de ovos do parasita nas fezes dos doentes, o que é possível apenas quando a enfermidade encontra-se na fase crônica, atrasando e dificultando o tratamento", argumenta Fernanda.

O passo seguinte foi a imunização de camundongos. Eles foram divididos em grupos, vacinados com a proteína Sm-29 e expostos ao parasita. "Posteriormente, eles serão sacrificados para checarmos, comparando com um grupo de controle, se houve redução do número de vermes adultos", diz a pesquisadora. Caso isso ocorra, acrescenta Fernanda Cardoso, ficará comprovado que a vacina confere alguma proteção aos animais. A previsão é de que os primeiros resultados sejam obtidos no fim de maio.

Coquetel

Apesar de promissora, a pesquisa com a Sm-29, sozinha, não resultará em substâncias capazes de imunizar o ser humano, alerta Fernanda Cardoso: "Ela tem grande potencial para fazer parte de um coquetel. Será preciso unir diversos estudos para chegar a um resultado satisfatório".

Os estudos de diagnóstico e vacina contra a esquistossomose fazem parte das pesquisas de doutorado de Fernanda Cardoso. Seu trabalho foi premiado pelo Laboratório Novartis, no XLI Congresso da Sociedade de Medicina Tropical, que ocorreu em março, em Florianópolis. O evento reuniu cerca de 1,2 mil trabalhos científicos e 2,3 mil profissionais de países do Cone Sul que trabalham com pesquisas, diagnóstico, tratamento, epidemiologia, prevenção e controle das doenças mais comuns nos trópicos.

* Teste quantitativo que permite, entre outras aplicações, detectar a presença de anticorpos em soluções devidamente preparadas com o antígeno em questão. Seu custo é bem inferior ao de outras técnicas.

Doença é endêmica em Minas

Popularmente conhecida por xistosa, xistosomose, doença do caramujo ou barriga d'água, a esquistossomose é uma infecção que pode ser causada por cinco espécies diferentes de protozoários. No Brasil, o agente etiológico da doença é o Schistosoma mansoni, daí o nome esquistossomose mansônica . São cerca de sete milhões de pessoas infectadas no país, dos quais 1 milhão em Minas, onde é considerada endêmica.

Os primeiros sintomas da doença são febre, calafrios, dores de cabeça e abdominais, náuseas, vômitos e tosse seca. Posteriormente podem ocorrer inchaço do fígado e baço e vômitos com sangue, provocados por varizes que se formam no esôfago. O tratamento existente é prescrito à base de substâncias tóxicas ao Schistosoma mansoni. O medicamento mais utilizado é o Praziquantel, ingerido na forma de comprimidos. Ele elimina o parasita do organismo, mas nem sempre impede que a pessoa contraia a doença novamente.

Legenda foto: Caramujo é o hospedeiro intermediário do Schistosoma
Foto: Eber Faioli