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Nº 1819 - Ano 39
6.5.2013

Gestão da escassez

Coletânea de artigos analisa como lavradores do Alto Jequitinhonha administram limitações de recursos hídricos

Itamar Rigueira Jr.

Afetadas de formas diferentes pela escassez cíclica de água, comunidades rurais no Alto do Jequitinhonha, no Nordeste de Minas, criaram estratégias – produtivas e políticas – para lidar com a situação. Lógicas de consumo, critérios de prioridade e técnicas de administração comunitária de abastecimento e acesso às fontes compõem o repertório de gestão da escassez.

Estudos que exploram a relação desses agricultores com a água estão reunidos no livro Lavradores, águas e lavouras: estudos sobre gestão camponesa de recursos hídricos no Alto Jequitinhonha, recém-lançado pela Editora UFMG. A coletânea de artigos analisa, sob diferentes ângulos, os dilemas originados da tensão entre consumo, conservação e regulação da água em comunidades camponesas.

“Esses estudos mostram que existem singularidades locais, regionais e nacionais. E que é preciso transformar cada particularidade de uso, gestão e conhecimento na base da norma geral de regulação das águas”, explica a professora do Instituto de Ciências Agrárias (ICA) da UFMG Flávia Maria Galizoni, organizadora da obra.

De acordo com a pesquisadora, as populações rurais e seus sistemas locais de acesso à água inspiram reflexões fundamentais: “Devemos discutir sobre a quem pertence a água, quais as prioridades de uso e como ela deve ser distribuída e partilhada”.

Enfrentamento

A coletânea resulta de trabalho que uniu o Núcleo de Pesquisa e Apoio à Agricultura Familiar (Núcleo PPJ), da UFMG, o Centro de Agricultura Alternativa Vicente Nica (CAV) e o Centro de Voluntariado Internacional (Cevi). Essas organizações se viram frente a frente com o tema da água por iniciativa de comunidades que, desde o final dos anos 1990, tiveram que lidar com a escassez mais crítica. “As nascentes secavam, as águas minguavam e o abastecimento já era feito, em parte, por carros-pipa. As famílias, então, se organizaram e articularam apoio externo para compreender a situação”, conta Flávia Galizoni.

A obra começa apresentando a realidade no Alto Jequitinhonha e a rede que envolve comunidades rurais, organizações sociais e universidade. “Esta primeira parte mostra como as comunidades desenvolveram tecnologias para lidar com a água, e os ensinamentos desse esforço, além de abordar inovações metodológicas na relação entre academia e organizações civis”, salienta Flávia Galizoni, que é doutora em Ciências Sociais pela Unicamp.

Capítulos seguintes contêm etnografias e estudos técnicos que sintetizam aprendizados de quase 14 anos sobre aspectos como alterações na dinâmica da água e organização do trabalho familiar a partir da disponibilidade hídrica.

A obra trata também de experiências que uniram comunidades, ONGs e pesquisadores – como as de conservação comunitária de nascentes – e de conhecimentos acumulados por universidades e projetos de cooperação internacional. Além de pesquisadores da UFMG e de outras universidades, os artigos são assinados por agricultores e profissionais ligados a organizações civis.

Em texto de introdução ao livro, Flávia Galizoni lembra que, para boa parte da população rural brasileira, “a partilha da água é mais que um aspecto de regulação: é parte fundamental de sua cultura”. Por isso, é crucial, segundo ela, compreender as formas pelas quais as famílias e comunidades aliam costumes e necessidades para usar, regular, distribuir e conservar a água.

Livro: Lavradores, águas e lavouras: estudos sobre gestão camponesa de recursos hídricos no Alto Jequitinhonha
Organizado por Flávia Maria Galizoni
Editora UFMG
254 páginas / R$ 42 (preço sugerido)