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Nº 1852 - Ano 40
17.02.2014


Encarte
17.02.2014

opiniao

Desenvolvimento rural na perspectiva do turismo

Ludimila de Miranda Rodrigues*

Vagner Luciano de Andrade**

A contemporaneidade com suas benesses e mazelas provocou uma reconfiguração social, ambiental, cultural e econômica do espaço rural. Nesse contexto, evidenciam-se aspectos da mercantilização do espaço agrário, como a exploração dos recursos naturais e valores culturais com fins econômicos. Nas últimas décadas ocorreram grandes transformações institucionais e técnicas na América Latina e Caribe, porém sem mudanças sociais significativas. Com o advento da agroindústria, a atividade agrícola se modernizou crescendo para fins de exportação, porém a produção de alimentos para o abastecimento interno continuou dependente dos pequenos e médios agricultores, pressionando-os a inserirem-se nesse sistema mercantilista.

No Brasil e no mundo são inúmeros agricultores que operam em estabelecimentos com área limitada e problemas financeiros devido às dificuldades de inserção econômica da agricultura familiar no competitivo modelo agropecuário capitalista. A pequena propriedade, principalmente do tipo familiar, está em vias de extinção, em decorrência do êxodo de milhões de trabalhadores rurais.  Os municípios são diretamente afetados por esse processo, e muitos acabam entrando em crise socioeconômica mediante a diminuição da população rural local, queda na produção agrícola e consequente diminuição na arrecadação de impostos.

Por outro lado, os municípios que recebem esses trabalhadores acabam apresentando diversos problemas sociais, relacionados à grande quantidade de migrantes. Pelo menos quatro problemas se sobressaem: degradação socioambiental; exclusão social; decepção e alienação; e submissão do campo à cidade.

Além do desemprego, o êxodo rural descontrolado causa outros problemas nas metrópoles ao aumentar em grandes proporções a população “amontoada” na periferia urbana. O patrimônio ambiental (solos, água, biota) passa a ser constantemente utilizado de forma predatória, resultando em inúmeros problemas ambientais e sociais. Os bairros carentes da periferia são os mais prejudicados pelas consequências desse fenômeno, com hospitais superlotados e escolas sobrecarregadas. Os empregos não são suficientes e muitos migrantes partem para o trabalho informal, passando a residir em habitações irregulares, como favelas e cortiços. Visando as “grandes oportunidades” oferecidas pelas cidades, como empregos, faculdades e diversão, a população jovem é a mais afetada. Os jovens camponeses vislumbram os atrativos dos grandes centros urbanos, criando fantasias que serão posteriormente convertidas em frustração e exclusão.

Há ainda comunidades rurais que, visualizando nas atividades urbano-industriais uma oportunidade de melhoria das condições de vida, se inserem como mão de obra barata em tais processos. Famílias inteiras passam a dedicar-se apenas a essas atividades, muitas vezes realizadas no ambiente do lar, deixando de exercer o seu patrimônio cultural rural, para sustentar a manutenção do crescente consumo da sociedade urbano-industrial.

Na contramão do processo, um novo elemento socioeconômico, o turismo, se insere no panorama rural como atividade relevante na melhoria das condições de vida dos agricultores familiares, pois amplia seus níveis de emprego e renda. Como qualquer outra atividade estimuladora do espaço rural, o turismo apresenta potencial para fixar o homem no campo, ressignificando sua gama de serviços e produtos e favorecendo suas condições de subsistência, de geração de renda, de preservação do patrimônio cultural e de desenvolvimento local. Assim, o turismo vinculado à agricultura familiar permite que as pessoas se fixem na unidade de produção agropecuária, reforçando as convicções dos agricultores de viverem no meio rural. Além disso, rompe com perspectivas de isolamento das populações tradicionais do campo, viabilizando intercâmbios e trocas significativas dos pontos de vista cultural, social, político e econômico.

Com essa perspectiva, o produtor rural recebe experiências e compartilha “saberes e fazeres” que reforçam e valorizam as diversidades culturais de cada região. A atividade turística estimula e amplia produtos, serviços e experiências, potencializando a agricultura familiar, mas apresenta limitações de tempo e espaço. O turismo é uma atividade essencialmente humana, e como tal tem seus aspectos positivos e negativos. Hoje, o capitalismo exige que a população tenha consciência da sustentabilidade como elemento inerente à preservação e valorização de seu meio ambiente. Assim é indispensável que o turismo seja pensado numa perspectiva de planejamento estratégico sustentável acompanhado de instrumentos de monitoramento e avaliação, tendo em vista a preservação da paisagem, da identidade e da cultura do espaço rural.

Quando as atividades turísticas e empreendimentos como restaurantes, pousadas e pesque-pague estão localizados em regiões com número regular de visitantes, boa infraestrutura básica instalada e sistema de transporte adequado, eles têm mais chances de se tornarem autossustentáveis e prosperarem com as comunidades adjacentes. O turismo baseado no respeito ao ambiente e à cultura do lugar atenua as desigualdades sociais, estimulando as comunidades locais a se conscientizarem de seus valores e reforçando seu interesse na construção de um futuro melhor.

* Geógrafa e mestranda em Geografia pelo Programa de Pós-graduação em Geografia do IGC.

** Bacharel/licenciado em Geografia e Análise Ambiental, graduando em licenciatura em Educação do Campo/habilitação em Ciências Sociais e Humanidades pela FaE/UFMG