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Nº 1883 - Ano 41
03.11.2014

Sem fôlego

Pesquisa da Faculdade de Medicina mostra relação entre anemia falciforme e falta de oxigênio no sangue

Luana Macieira

Indivíduos com anemia falciforme podem apresentar hipoxemia, quadro caracterizado pela baixa taxa de concentração de oxigênio na corrente sanguínea. Para observar como esse fenômeno se manifestava e sua prevalência, estudo de mestrado acompanhou 99 crianças e adolescentes entre oito e 15 anos em tratamento no Serviço de Hematologia Pediátrica do Hospital das Clínicas da UFMG.

“A necessidade de monitorar a hipoxemia se deve ao fato de que ela parece estar relacionada com a hipertensão pulmonar, alteração muito temida para quem tem anemia falciforme, e com o acidente vascular cerebral (AVC)”, explica a pesquisadora Ana Karine Vieira, autora de dissertação defendida em julho passado no Programa de Pós-graduação de Saúde da Criança e do Adolescente da Faculdade de Medicina da UFMG.

A coleta de dados feita pela pesquisadora mostrou que 52,9% dos pacientes apresentam hipoxemia. Além disso, a taxa de redução dos níveis de oxigênio no sangue desses pacientes foi de 42,95% durante o exercício físico. “Já sabíamos que ocorreria hipoxemia nos pacientes em tratamento com anemia falciforme, mas esperávamos uma taxa de redução na oximetria menor durante a caminhada. Isso nos preocupa porque a queda na saturação de oxigênio durante o teste de caminhada está associada à hipertensão pulmonar nas crianças com anemia falciforme”, explica.

Os pacientes analisados passaram por testes antes da coleta de dados. Noventa e nove crianças e adolescentes fizeram a oximetria de pulso, que mede a porcentagem de hemoglobina saturada pelo oxigênio, e 70 se submeteram à prova de função respiratória. Essa função foi medida por meio da espirometria e de um teste de caminhada, que durou seis minutos. Seu objetivo era observar o funcionamento dos aparelhos respiratório e cardíaco durante uma atividade corriqueira.

Dois em um

Para Ana Karine Vieira, descobrir a hipoxemia nos pacientes é importante para que eles sejam abordados de maneira especial. Comumente usado para melhorar o nível da hemoglobina na anemia falciforme, o medicamento hidroxiureia também se revelou eficiente contra a falta de oxigênio nos vasos, o que indica que pode ser usado para atacar os dois problemas. “Constatamos que os usuários da hidroxiureia tinham cinco vezes mais chances de apresentar níveis normais de oxigenação”, afirma Ana Karine.

A pesquisadora acrescenta que é importante reconhecer distúrbios respiratórios nos pacientes de anemia falciforme, uma vez que eles agravam o estado de saúde dos doentes, afetando sua qualidade de vida. “A asma e outros problemas respiratórios são grandes inimigos do paciente que convive com a doença, e eles podem aumentar as taxas de mortalidade. Identificar a hipoxemia e outros problemas de trato respiratório precocemente pode nos ajudar a prevenir uma doença pulmonar crônica, que é uma das complicações mais temidas na anemia falciforme”, explica.

A doença

Doença hereditária, a anemia falciforme é uma ­alteração nos glóbulos vermelhos do sangue, que não possuem a clássica forma elástica e arredondada. Em formato de foice, essas células têm dificuldade de transportar o oxigênio na corrente sanguínea, o que acarreta falta de oxigenação dos tecidos, dores nas articulações, fadiga intensa e problemas neurológicos, cardiovasculares ou renais.

Diagnosticada pelo teste do pezinho, a doença é progressiva, o que leva à necessidade de acompanhamento médico constante. Segundo Ana Karine, muitas pesquisas estão surgindo para elucidar de forma mais objetiva os problemas respiratórios que afetam as pessoas com anemia falciforme. “Além disso, há estudos em andamento que pretendem conhecer a realidade brasileira da doença. Isso é muito importante para a elaboração de novos tratamentos”, conclui.

Dissertação: Avaliação da função pulmonar, da saturação basal de oxigênio e pico de fluxo inspiratório em crianças e adolescentes com doença falciforme em Belo Horizonte
Autora: Ana Karine Vieira
Orientador: Cássio da Cunha Ibiapina
Defendida em 25 de julho de 2014 no Programa de Pós-graduação em Saúde da Criança e do Adolescente