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Nº 1883 - Ano 41
03.11.2014

Acesso, lazer, vizinhança

Revista que reúne acadêmicos, artistas e ‘agentes da cidade’ para debater o espaço público busca financiamento coletivo para as próximas edições

Itamar Rigueira Jr.

“Não pise a grama”, diz a placa fincada no gramado. “Cuidem melhor das nossas praças”, poderia reivindicar um cidadão por meio de uma plaquinha ao lado. Contradições como a que envolve proibição e abandono das cidades inspiraram a criação (e o batismo) da revista Piseagrama, “espaço público periódico” editado desde 2011 por professores da Escola de Arquitetura da UFMG. Depois de seis edições viabilizadas por edital do Ministério da Cultura, a publicação lança campanha online por financiamento coletivo que assegure a manutenção de sua circulação.

“Procuramos fazer uma provocação criativa que estimule a retomada e o uso adequado do espaço público”, afirma o professor Roberto Andrés, responsável pela revista juntamente com os colegas Renata Marquez e Wellington Cançado e a cientista política Fernanda Regaldo. A iniciativa é uma forma de protesto contra o fato de que a reflexão sobre a vida compartilhada na cidade está restrita aos cientistas sociais, aos urbanistas e aos leitores que escrevem para os jornais locais. “Isso talvez diga algo sobre a falta de imaginação com que são produzidas e geridas as cidades no Brasil”, continua Andrés.

Os seis primeiros números, que circularam em versões impressas e online, foram organizados em torno dos temas acesso, progresso, recreio, vizinhança, descarte e cultivo. Ensaios de pesquisadores, arquitetos, jornalistas aparecem com o mesmo peso de trabalhos artísticos e relatos de pessoas que atuam nas cidades. A Piseagrama (www.piseagrama.org) coleciona assinaturas de nomes como o do cofundador da revista Wired, Kevin Kelly, do antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, do arquiteto Santiago Cirugeda, do ex-prefeito de Bogotá Enrique Peñalosa, da artista espanhola Maider López e autores que os editores chamam de “agentes da cidade”, profissionais dos bastidores da gestão urbana. Um dos relatos mais curiosos foi o do mergulhador Julio Cou Cámara, que, devidamente protegido, enfrenta problemas causados pelo excesso de lixo no sistema de esgoto da Cidade do México. Mais leitores

Além de arrecadar R$ 70 mil para bancar as duas próximas edições, a campanha na plataforma Catarse (catarse.me/piseagrama), que segue até 21 de novembro, tem o objetivo de tornar a Piseagrama ainda mais conhecida. “Já temos uma rede de leitores, são oito mil seguidores no Facebook, mas estamos prontos para dar um salto e continuar a revista, estabelecendo contato mais estreito com maior número de leitores”, projeta Roberto Andrés, ele mesmo autor de ensaios sobre o uso de bicicletas para deslocamentos na cidade e poluição dos gases automotivos. Textos, fotografias e desenhos têm reprodução liberada sob o regime do Creative Commons.

A revista interfere e se comunica também por meio de debates, oficinas e experimentos urbanísticos. A campanha de interesse público, realizada durante as eleições municipais de 2012, em Belo Horizonte, foi a ação que mais repercutiu. Cartazes coloridos foram colados sobre os de candidatos com frases como “Uma praça por bairro” e “Carros fora do Centro”. A ideia estampou camisetas e bolsas e chegou a ser exportada para Recife e São Paulo. Nadar e pescar no Arrudas foi adaptada para pedir a despoluição dos rios Capibaribe e Tietê. A equipe da Piseagrama já organizou quatro livros e produziu o catálogo da exposição Escavar o futuro, no Palácio das Artes, no ano passado. A publicação foi reconhecida pela rede internacional de publicações Archizines – que a convidou para mostra de revistas na Bienal de Arquitetura de Veneza – e pela revista holandesa Volume, que incluiu a Piseagrama em uma seleção internacional de publicações independentes de arquitetura e urbanismo. Ainda neste mês de novembro, a revista participa da exposição Cidade Gráfica, no Itaú Cultural, em São Paulo.