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Nº 1885 - Ano 41
17.11.2014

O eucalipto avança

Trabalho do IGC, em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, analisa a expansão das áreas de reflorestamento em regiões de Minas Gerais até 2035

Hugo Rafael

A paisagem que se vislumbra no trajeto entre ­Minas Gerais e o litoral do Espírito Santo é caracterizada por extensas áreas de cultivo de eucalipto. Essa presença chamou a atenção do geógrafo e mestre em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais Carlos Pires, que, em estudo nos municípios da Bacia Hidrográfica do Rio Piracicaba e da Região Metropolitana do Vale do Aço, constatou que o plantio do eucalipto tem impactado a flora e a fauna. Esse avanço do reflorestamento com eucalipto – entre 1985 e 2010 – foi observado principalmente sobre mata nativa e áreas de pastagem.

Dados da dissertação de mestrado defendida em maio deste ano, no Programa de Pós-graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais, do Instituto de Geociências, revelam que, no período, houve aumento de 12% das áreas de eucalipto e diminuição de 9% da mata nativa nos municípios analisados. A pesquisa indica que, até 2035, a presença do eucalipto pode aumentar em até quatro vezes.

“Em 1985, 80% das manchas de mata nativa estavam separadas por distância de até 50 metros. Em 2010, esse índice caiu para pouco mais de 50%. Nossa previsão é de que, nos próximos 25 anos, as manchas de mata nativa separadas por, no máximo, 50 metros representem apenas 45% das manchas verdes”, afirma o pesquisador, que contou com apoio do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Por outro lado, Carlos Pires destaca o avanço do eucalipto: de 20%, em 1985, para 65%, em 2010. “Em 2035, a presença desses pontos em distâncias de até 50 metros deverá chegar a 80%. Para isso, partimos do pressuposto de que, quanto mais próxima ao cultivo de eucalipto uma área está, maior a tendência de ser ocupada por essa cultura. Isso mostra que as áreas de floresta estão ficando isoladas”, explica.

De acordo com o pesquisador, há uma relação muito próxima entre a substituição da mata nativa e as indústrias siderúrgicas, de celulose e de mineração. Além de ser matéria-prima na produção do carvão vegetal que abastece os fornos das siderúrgicas, o eucalipto também é fonte de celulose para a produção de papel. “São muitos segmentos de negócio que demandam o insumo na região. Em um primeiro momento, derrubaram a mata para usar a madeira nos fornos de carvão. Com o passar do tempo, a legislação ficou mais rigorosa, e esse uso, mais difícil. Com isso, o eucalipto avançou também sobre áreas de pastagem”, explica Pires.

Modelagem ambiental

Carlos Pires valeu-se da modelagem ambiental que, por meio da construção de modelos computacionais, busca explicar, de forma idealizada, os fenômenos da natureza. No caso específico de seu levantamento, o pesquisador explica que o desafio é “entender suas mudanças por meio do estudo de dados multitemporais e de sua interação com uma série de variáveis explicativas, de forma a simular o que pode ocorrer na cobertura da terra e na alteração da estrutura da paisagem”.

Inicialmente, foi feito um estudo evolutivo da ocupação do solo entre 1985 e 2010, com foco na expansão das áreas de eucalipto e na consequente diminuição das áreas de mata nativa e de pastagem. Com base nesses dados, foi construído e validado modelo para simular a evolução da ocupação do solo até 2035.

“A modelagem ambiental não é uma profecia”, destaca Carlos Pires. “Na construção do modelo, consideramos que a demanda por eucalipto continuará a mesma nos próximos anos, mas pode surgir nova fonte de energia que estimule as empresas a migrarem, alterando, assim, essa demanda”, pontua.

Perdas

Outra conclusão da pesquisa mostra que, em 2035, a presença das áreas de mata nativa ocorrerá principalmente em unidades de conservação de proteção integral, como o Parque Estadual do Rio Doce, o que demonstra a força do impacto do reflorestamento com eucalipto na região. Das áreas que mudaram para eucalipto, entre 1985 e 2010, a maior parte era formada por floresta nativa (49%) e de pastagem (47%). Essa presença do eucalipto, segundo Carlos Pires, gera fortes impactos sobre fauna e flora.

“Percebemos um fenômeno de isolamento das áreas de mata nativa e de campos naturais e um aumento da conectividade das áreas de reflorestamento com eucalipto. Notamos também que a mata não sofreu com a pressão do eucalipto apenas no interior das unidades de conservação de proteção integral. Esses fatores influenciam as relações ecológicas, especialmente para a fauna, pois uma área ocupada por eucaliptos tende a oferecer menos condições ambientais e nutritivas para a sobrevivência de animais do que uma área de mata nativa”, explica.

Dissertação: Modelagem da cobertura da terra e análise da influência do reflorestamento na transformação da paisagem: Bacia do Rio Piracicaba e Região Metropolitana do Vale do Aço
Autor: Carlos Henrique Pires Luiz
Orientador: Sergio Donizete Faria (IGC)
Coorientadora: Maria Isabel Sobral Escada (Divisão de Processamento de Imagens do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais-Inpe)
Defesa: 27 de maio de 2014, no Programa de Pós-Graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais do IGC