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Nº 1803 - Ano 39
10.12.2012

História da residência e da Inconfidência

Após restauração arquitetônica e artística, UFMG inaugura museu na Casa de Padre Toledo, no Campus Cultural de Tiradentes

Itamar Rigueira Jr.

Studio Pixel

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A UFMG inaugura nesta quarta-feira, dia 12, uma das unidades de seu Campus Cultural de Tiradentes. O Museu Casa do Inconfidente Padre Toledo, que tem sede em imóvel do século 18 – considerado um dos mais valiosos prédios residenciais urbanos do país, dos pontos de vista histórico e arquitetônico – será dedicado à história do modo de morar na época colonial e aos protagonistas da Inconfidência Mineira, especialmente o Padre Toledo. O evento de inauguração terá início às 17h.

Local onde os inconfidentes tiveram seu primeiro encontro, em 1788, a Casa de Padre Toledo é um dos quatro imóveis na cidade pertencentes à Fundação Rodrigo Mello Franco de Andrade, vinculada desde 2008 à UFMG. Os outros são os da Câmara Municipal, da Cadeia Pública e do Centro de Estudos, Galeria e Biblioteca Miguel Lins.

Minucioso trabalho de restauração arquitetônica e artística e projeto museográfico foram realizados para a abertura do Museu, sob coordenação da UFMG e ao custo de cerca de R$ 4 milhões, com recursos próprios e do BNDES. O trabalho de restauração foi supervisionado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

A alta complexidade do empreendimento se deve, sobretudo, ao fato de o imóvel ser tombado em função de seu valor arquitetônico e riqueza artística. Foi preciso realizar concomitantemente obras civis e serviços de restauro na área de belas-artes. “O planejamento para compatibilizar essas duas frentes é trabalhoso. Mantivemos conversa franca entre nossas equipes e com os técnicos do Iphan, que fiscalizaram os serviços”, explica o arquiteto e professor André Dangelo, que coordenou a restauração da casa.

O torreão anexo de dois pavimentos acrescido ao projeto original ainda no século 18 apresentava grande instabilidade, uma vez que mudanças no terreno e na drenagem ao longo do tempo canalizaram excesso de umidade para a fundação desse anexo. Além disso, essa parte abrigava pinturas artísticas feitas diretamente sobre o reboco de forros e paredes. “Além do reforço de estrutura, dificultado porque não se podia retirar o reboco, e da implantação de novo sistema de drenagem, era preciso consolidar as pinturas”, conta Dangelo, que é superintendente executivo da Fundação.

No prédio principal, foram trocados o barroteamento (sustentação do piso), forros sem pintura artística e a parte elétrica. Elementos originais como peças de madeira foram repostos com outros de mesmos padrões e medidas. O edifício está localizado em terreno de cerca de 2 mil metros quadrados e tem 800 metros quadrados de área construída.

Esforço para restaurar

O patrimônio artístico da Casa de Padre Toledo estava em estado avançado de deterioração, em grande parte devido ao ataque de insetos e à ação das águas pluviais nos forros. Coordenada pela professora Betânia Veloso, do Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis (Cecor) da Escola de Belas-Artes da UFMG, o esforço de recuperação contou com auxiliares contratados na própria comunidade.

A equipe encontrou 11 forros pintados, com motivos diversos – frutas, símbolos episcopais etc. – que ajudaram a identificar as funções dos cômodos, já que grande parte dos bens foi expropriada na ocasião da prisão do proprietário, junto com os outros inconfidentes. “As pinturas de excelência dão bem a ideia da grandiosidade da casa, que refletia o poder da Igreja na época e abrigava festas, reuniões, batizados e eventos musicais”, ressalta Betânia Veloso.

Projeto expográfico

“É excepcional que uma moradia civil do final do século 18 possa ser recuperada para o conhecimento da população”, destaca o professor Rodrigo Minelli, responsável pelo projeto museográfico. Ele enfatiza, por sinal, que neste primeiro momento é mais adequado falar-se em projeto expográfico, uma vez que a museografia será definida com a produção de conhecimento gerada pelo próprio funcionamento do Museu.

Foram selecionadas do acervo as peças mais relevantes que remetessem ao período inicial da residência, que serão expostas junto com o próprio prédio e suas pinturas. O projeto aproveitou o patrimônio construído pelo principal ocupante da residência, o padre Carlos Correia de Toledo e Melo, que vinha de rica família de São Paulo.

Material para atualização do acervo não vai faltar: o quintal do imóvel vai abrigar projeto de pesquisa sobre a arqueologia da Inconfidência Mineira, sob coordenação do professor Carlos Magno Guimarães, da Fafich.

Campus da experimentação

Pesquisadores e estudantes de áreas diversas como museologia, arquivologia, história e conservação e restauração de bens móveis terão à sua disposição um novo e importante laboratório com o início das atividades do Campus Cultural da UFMG, em Tiradentes.

Nos quatro imóveis que compõem o campus, a UFMG está implantando biblioteca sobre o século 18 mineiro, museu de arte sacra, com acervo de Santanas da empresária Ângela Gutierrez, centro de estudos, centro de experimentação em sistemas multimodais e o museu de Padre Toledo.

A implantação de um campus em Tiradentes tem também alto valor simbólico, na avaliação do professor João Antonio de Paula, pró-reitor de Planejamento. “A presença da Universidade em Tiradentes materializa vínculos que remetem ao sonho dos inconfidentes com uma universidade em Minas Gerais”, comenta João Antonio.

A primeira unidade do campus cultural a entrar em funcionamento foi o Centro de Estudos, Galeria e Biblioteca Miguel Lins, que abriga acervo do jurista e ex-ministro do Supremo Tribunal Federal. O local abriga seminários, cursos e treinamentos para pequenos grupos.

O prédio da Cadeia Pública será cedido em comodato por 30 anos ao Instituto Cultural Flávio Gutierrez, para implantação de um museu de Santanas, com acervo inicial de cerca de 300 imagens. O contrato será assinado na solenidade de inauguração do Museu Casa do Inconfidente Padre Toledo, assim como termo em que o Instituto se comprometerá, em contrapartida, a utilizar sua expertise em captação de recursos para viabilizar a implantação do Centro de Estudos e Biblioteca sobre o Século XVIII Mineiro.

Referência única

Localizada no prédio da antiga Câmara Municipal de Tiradentes, a biblioteca pretende ser um grande centro de referência sobre o barroco mineiro, com abordagem que extrapole tanto o século 18 quanto o próprio barroco e Minas Gerais. “O centro vai viabilizar pesquisas sobre história, política, sociedade, arte e cultura, incluindo as relações com a cultura europeia”, explica João Antonio de Paula.

A biblioteca terá acervo inicial de cinco mil itens, e as primeiras aquisições já começaram a ser feitas em instituições de países como a Bélgica. A expectativa é de que a coleção triplique em dez anos. Além de documentos e livros em papel, pesquisadores terão acesso, a partir de Tiradentes, a acervos digitais de alguns dos mais importantes centros que tratam dos temas correlatos.

Um dos projetos, segundo o pró-reitor de Planejamento, é que a biblioteca ofereça aos estudiosos todas as obras que serviram de inspiração e consulta para os inconfidentes, e que foram identificadas na época por ações como os Autos da Devassa.

Tecnologia

Se a biblioteca do século 18 será um novo incentivo para estudos com foco na história, o Campus Cultural da UFMG aponta para o futuro ao implantar em Tiradentes o Centro de Experimentação e Pesquisa em Sistemas Multimodais, que desenvolve projetos com base na relação das tecnologias de informação e comunicação com a tríade arte-ciência-educação.

Baseado hoje na Escola de Belas-Artes e no Conservatório UFMG, o centro produzirá conteúdo educativo para a rede municipal de ensino, explorando o patrimônio cultural, histórico e ambiental de Tiradentes e região. Os pesquisadores vão elaborar também sistemas para dispositivos móveis que vão servir de guias virtuais para visita à Casa de Padre Toledo e à própria cidade.

A atuação em Tiradentes de um laboratório como o de sistemas multimodais aproveita, como lembra o pró-reitor adjunto de Planejamento, Mauricio Campomori, a expertise da UFMG em áreas como desenvolvimento de softwares e cinema de animação e a vocação da cidade para as artes ligadas à imagem, representada pelo sucesso do festival anual de cinema.

“Além disso, Tiradentes tem localização estratégica, entre Rio, São Paulo e Belo Horizonte, e dispõe de um aeroporto, que facilita o acesso. E tem se transformado em polo de experiências para o Ministério da Educação, com projeto que distribui um computador por aluno, o Ministério das Comunicações, com a implantação de internet sem fio de alta velocidade em toda a cidade, e do BNDES, que testa formatos de patrocínio por meio da lei de incentivo à cultura”, afirma Campomori.