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Nº 1828 - Ano 39
08.07.2013

opiniao

Os novos desafios da assistência estudantil

Rocksane de Carvalho Norton*

A assistência estudantil consiste em uma das políticas mais importantes da UFMG, remontando à sua própria origem. No final da década de 1920, quando o acesso ao ensino superior no Brasil era ainda muito restrito, abrangendo praticamente apenas estratos sociais de maior renda, a Universidade, que acabara de ser criada, constituiu os primeiros mecanismos destinados a prestar apoio a estudantes sem condições econômicas suficientes para realizar os estudos, mediante ajuda material e assistência médica, odontológica e jurídica.

A despeito das dificuldades vivenciadas desde então, essas iniciativas progrediram e culminaram na atual estrutura, baseada, principalmente, nas atividades patrocinadas pela Fundação Universitária Mendes Pimentel (Fump), que contemplam programas assistenciais de alimentação, moradia e saúde, além da concessão de diversas modalidades de bolsas, direcionadas, por exemplo, a prestar auxílio financeiro, contribuir na formação acadêmica e profissional do aluno e permitir a aquisição de livros e material escolar. Os recursos utilizados atualmente no financiamento das ações da Fump são oriundos, sobretudo, do Programa Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes), formalizado por intermédio do decreto 7.234, de julho de 2010.

As medidas adotadas nos últimos anos pelo governo federal com o propósito de estimular a expansão e a democratização da educação terciária suscitaram mudanças consideráveis no sistema universitário brasileiro, com a incorporação de estratos étnicos e sociais mais amplos. Os dados do último censo são inequívocos a esse respeito e mostram que, em uma década e meia, a taxa bruta de escolarização na faixa etária de 18 a 24 anos praticamente triplicou, subindo de 9,9% para 27,8% entre 1997 e 2011. O percentual de indivíduos da mesma faixa etária que frequentam ou concluíram a graduação mais do que dobrou em idêntico período, sendo que a ampliação foi mais acentuada nas regiões mais pobres do país (Norte e Nordeste), no segmento social de menor renda e no grupo étnico formado por pretos e pardos.

“As medidas adotadas nos últimos anos pelo governo federal com o propósito de estimular a expansão e a democratização da educação terciária suscitaram mudanças consideráveis no sistema universitário brasileiro, com a incorporação de estratos étnicos e sociais mais amplos.”

Na UFMG, as mudanças também foram substanciais e calcadas em objetivos destinados a ampliar o acesso de grupos étnicos e sociais ainda pouco representativos na nossa comunidade discente. Uma ação inclusiva mais direta e incisiva foi adotada pela UFMG em 2009, com o sistema de bonificação especial nos processos seletivos, favorecendo candidatos inscritos no vestibular oriundos de escola pública ou que se declarassem pretos ou pardos. Tais iniciativas vêm alterando o perfil estudantil da UFMG, com a absorção de frações mais diversificadas da sociedade. Entre 2008 e 2012, por exemplo, a parcela de candidatos aprovados no vestibular da UFMG originada de escolas públicas teve incremento de 44%, passando de pouco mais de um terço para quase 48% do total.

Esse processo de incorporação de estratos étnicos e sociais mais amplos pela universidade deverá ser intensificado nos próximos anos, em consequência, principalmente, da adoção do sistema de reserva de vagas criado pela Lei 12.711/2012, que substituiu o programa de bônus no ano passado, exigindo, ao mesmo tempo, a requalificação das nossas políticas de assistência estudantil, a fim de compatibilizá-las com as rápidas transformações em curso.

A proposta de criação da Pró-reitoria de Assuntos Comunitários e Estudantis se inscreve nesse contexto e tem a pretensão de constituir bases renovadas para a ­assistência estudantil na UFMG, de modo a dotá-la de mecanismos mais abrangentes, que extrapolam as formas tradicionais de apoio e passem a incluir também as várias dimensões que perpassam a trajetória de aprendizagem universitária e de formação ética e intelectual dos alunos, envolvendo não apenas as atividades de ensino e pesquisa, mas também a cultura e as práticas que estimulam o desenvolvimento de uma consciência crítica e cidadã.

Isso significa, por exemplo, incorporar ou reatualizar a discussão aprofundada de temáticas contemporâneas prementes na rotina e na agenda de estudos e reflexões da comunidade universitária, tais como as que abarcam o lugar e o papel desempenhado pelas minorias na sociedade, os diversos aspectos relacionados à opressão e aos mecanismos repressivos, as formas e a efetividade da mobilização e da representação políticas, dentre outras desafiadoras problemáticas modernas.

*Vice-reitora da UFMG