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Revista da Universidade Federal de Minas Gerais
Ano 7, nº 13 - fevereiro de 2008

Artigo

A divulgação da ciência e da tecnologia no Brasil

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Tiago Megale

Ildeu de Castro Moreira
Diretor do Departamento de Difusão e Popularização da Ciência e Tecnologia da Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social, do Ministério da Ciência e Tecnologia

O nível de informação e o conhecimento da população sobre temas de C&T são bastante deficientes no Brasil, apesar do grande interesse pelo assunto, como mostrou recente pesquisa de opinião pública. A razão principal para isso reside na ausência de uma educação científica abrangente e de qualidade no ensino fundamental e médio do país. Por outro lado, a divulgação científica por meio da mídia e de outros instrumentos, como os centros e museus de ciência, deixa ainda muito a desejar. Só nos últimos anos iniciou-se no Brasil um movimento para o estabelecimento de política pública destinada à popularização da C&T.

A difusão da ciência para o público é tão antiga quanto ela própria. A divulgação científica, a partir do estabelecimento da ciência moderna nos séculos 17 e 18, apresentou fases distintas, com finalidades e características que refletiam o contexto, as motivações e os interesses da época. As motivações de hoje para a popularização da C&T ocupam todo um espectro: elas vão da prosperidade nacional ao reconhecimento do saber científico como parte integrante da cultura humana, passando pelo seu significado para o exercício da cidadania, por razões de desempenho econômico e pelas questões de decisão pessoal.

A divulgação científica ganhou nova atribuição devido ao processo de extrema especialização nos campos científicos: é necessário divulgar a ciência entre os próprios cientistas e técnicos. Mais recentemente novas perspectivas começaram a ser delineadas a partir de experiências e reflexões na interface ciência-sociedade. Ao “analfabetismo científico” – uma expressão pouco adequada – do público contrapõe-se, em muitos casos, uma ignorância da instituição científica em relação aos aspectos sociais da relação com o público e aos condicionantes da ciência. O aprimoramento da cultura científica não implica uma linha de mão única na transmissão do conhecimento: do virtuoso científico ao leigo iniciado.

É importante que um cidadão no mundo contemporâneo desenvolva uma noção, no que concerne à ciência e tecnologia, de seus principais resultados, de seus métodos e usos, mas também de seus riscos e limitações, dos interesses e fatores (econômicos, políticos, militares, culturais etc.) que presidem seus processos e aplicações. Contudo, o significado social e cultural da ciência como atividade humana fica muitas vezes camuflado nas representações escolares e em atividades de divulgação que tendem a apresentar uma visão neutra e neutralizante da C&T.

A divulgação científica no Brasil tem pelo menos dois séculos de história. Nas duas últimas décadas tem sido observada uma expansão significativa dessas atividades: criação de centros e museus de ciência; surgimento de novas revistas e websites; maior cobertura de jornais sobre temas de ciência; publicação crescente de livros; organização de conferências populares e outros eventos que despertam interesse em audiências diversificadas por todo o país.

Mas o quadro se mostra ainda frágil, com amplas parcelas da população brasileira sem acesso à educação científica e à informação qualificada sobre C&T. Apesar do crescimento expressivo nos últimos anos, um número muito pequeno de brasileiros, cerca de 4% da população com mais de 16 anos, visita algum centro ou museu de ciências a cada ano. Em alguns países europeus, a visitação a museus chega a atingir 30% da população.

No Brasil, os museus de ciência estão fortemente concentrados em poucas áreas do país e o acesso a eles depende da classe social. Estes dados são provenientes de pesquisa nacional de opinião pública sobre C&T que mostrou que os brasileiros, segundo eles mesmos, têm bom nível de interesse por assuntos da área: 41% disseram ter muito interesse, 35% têm pouco interesse e 23% nenhum interesse. Para comparação, os números sobre interesse por esportes são: 47% (muito interesse), 31% (pouco interesse) e 22% (nenhum interesse). No entanto, os entrevistados declararam ser muito baixo o grau de aquisição de informação sobre C&T nos diversos meios de comunicação, o que está evidentemente correlacionado com a existência de poucos programas ou seções de jornais e revistas dedicados à comunicação pública da ciência.

Do ponto de vista da formação de profissionais na área de comunicação em ciência, as iniciativas são ainda incipientes, embora haja interesse crescente por cursos desse tipo. As universidades públicas brasileiras, neste aspecto, poderiam contribuir muito mais do que fazem. Faltam também estudos mais aprofundados sobre as estratégias, práticas e o impacto das atividades de divulgação, e sobre as características, atitudes e expectativas da audiência.

Quanto à educação científica formal, em geral, é muito baixo o desempenho dos estudantes brasileiros em temas que envolvem ciências e matemáticas. O ensino de ciências é, em geral, pobre de recursos, desestimulante e desatualizado. Curiosidade, experimentação e criatividade geralmente não são valorizadas. Iniciativas para atacar tais pontos, nos próximos anos, estão sendo consideradas nos recentes planos de ação do MEC e do MCT, mas, para funcionarem além do cumprimento das metas, será necessário um grande engajamento da comunidade científica e educacional.

Um passo dado na direção de uma política pública para a divulgação científica foi a criação, há quatro anos, de um departamento voltado para a popularização da C&T, dentro da Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social no Ministério da Ciência e Tecnologia. Ele tem, como objetivo principal, contribuir para a melhoria da divulgação científica e da educação científica no país.

Outro avanço é representado pela elaboração de proposta inicial para uma abrangente política pública de popularização da C&T. Ela foi apresentada e discutida na III Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, em 2005. A Associação Brasileira de Centros e Museus de Ciência produziu documento similar. Entre os objetivos centrais de uma política de popularização da C&T devem constar contribuições para melhorar e viabilizar a atualização/modernização do ensino das ciências em todos os níveis de ensino, com ênfase nas ações e atividades que valorizem e estimulem a criatividade, a experimentação e a interdisciplinaridade.

A consolidação de uma cultura voltada para a valorização da ciência é condição importante para a própria evolução do Brasil. Mas a ciência, por si mesma, não resolve os graves problemas de desigualdades sociais, desemprego, degradação ambiental, para não falar de problemas éticos. Ciência e tecnologia não significam necessariamente mais justiça, maior igualdade e melhores condições de vida. São dimensões absolutamente necessárias, mas não suficientes. Não custa lembrar Einstein: “Não superestimem a ciência e seus métodos quando se trata de problemas humanos!(...) O intelecto tem um olho aguçado para os métodos e ferramentas, mas é cego quanto aos fins e valores”.

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Revista Diversa nº 13
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