POR ITAMAR RIGUEIRA JR.

 

EBA chega aos 60 anos valorizando a diversidade e uma cultura assentada no compartilhamento

 

Em 1957, quando foi criado o curso de Artes, na Escola de Arquitetura, iniciava-se a história da Escola de Belas Artes da UFMG. Uma trajetória feita de mudanças físicas, resistência, ousadia, crescimento e pioneirismo. Sessenta anos depois, a EBA continua disposta a mudar, à procura de, cada vez mais, enxergar-se e atuar como uma comunidade.

Às vésperas do início de uma nova gestão na Escola, o espírito dominante é o de valorizar a diversidade e a pluralidade, que sempre marcaram a EBA, para consolidar a unidade. “Buscamos formas de ressignificar nossa identidade, que se fez plural ao longo dos anos, afirmando a diversidade e o compartilhamento de vivências e experiências artísticas, científicas e culturais”, afirma o professor Cristiano Bickel, diretor recém-eleito, que toma posse nesta semana. “Os novos tempos da Escola de Belas Artes são sinalizados pelas mobilizações políticas e forte integração da comunidade, atuando em defesa das artes, da cultura e da educação pública de qualidade e de efetividade social.”

Depois de uma festa que reuniu membros da comunidade de todas as épocas, a Escola vai comemorar o aniversário com a criação coletiva de sua nova identidade visual, com base em pesquisa com a comunidade. Também ao longo deste ano, arquivos pessoais e institucionais vão compor exposição de fotos que será distribuída nos diversos espaços da Unidade. A ideia, segundo Cristiano Bickel, é que “as pessoas, ao percorrerem a Escola, conheçam os seus diversos tempos e percursos, em imagens e histórias contadas de diferentes pontos de vista, do pessoal ao institucional”. A celebração vai se completar com o lançamento de documentário e livro sobre a história e as memórias da EBA, que aproveitam material de pesquisa e entrevistas iniciadas há 15 anos.

Entre salas e galpões

Ameaçado de extinção por conta de desavenças com alunos da Escola de Arquitetura, o curso de Artes chegou a ter sede em prédio da Rua São Paulo, no Centro de Belo Horizonte, antes de chegar à Pampulha. Nos primeiros tempos no campus, dividiu-se entre aulas teóricas no prédio da Reitoria e atividades práticas em galpões remanescentes da construção. Em 1972, a Escola de Belas Artes mudou-se para o edifício em que está instalada até hoje, um dos primeiros dedicados a uma unidade acadêmica no campus Pampulha.

Os poucos alunos e professores se distribuíam entre os departamentos de Desenho e Artes Plásticas, e começava a se desenvolver, na década de 1970, a área de fotografia e cinema. A essa altura, a Escola ganhara visibilidade por causa do Festival de Inverno, criado em 1967, “que se afirmava como espaço de criatividade, liberdade e até de oposição ao regime militar”, como lembra o professor Evandro Lemos, decano da EBA e um dos responsáveis, juntamente com a professora Lucia Gouvêa Pimentel, pela produção do livro de memórias da Escola. Esse projeto tem a participação de Mariana Tavares, bolsista de pós-doutorado da Capes.

Sob estímulo de uma demanda da Reitoria pela recuperação de grandes telas da Escola de Música, a EBA iniciou, no fim da década de 1970, a trajetória que culminaria, primeiro, na criação do Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis (Cecor), que se tornaria referência internacional, e, mais tarde, na graduação específica.

Os anos 1980 ficaram marcados por mais pioneirismo com a criação dos cursos de animação em Cinema e de Estilismo e Modelagem de Vestuário, embriões das futuras graduações em Cinema de Animação e Artes Digitais e em Design de Moda.

Nos anos 1990, surgiram também o mestrado e o doutorado em Artes e a graduação em Artes Cênicas, hoje denominada graduação em Teatro. Mais recentemente, a EBA passou a ofertar cursos com outras unidades – Design (Escola de Arquitetura) e Museologia (Escola de Ciência da Informação).

“As novas graduações de Cinema de Animação e Artes Digitais, Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis, Dança e Design de Moda atenderam a demandas represadas e foram viabilizadas pelo Reuni [plano de reestruturação das universidades federais]. Esses cursos têm sido estruturados em ampla discussão com a sociedade”, ressalta Evandro Lemos. “A Escola cresceu muito nos últimos anos, o corpo docente mais que dobrou. Hoje somos uma escola média num espaço pequeno. Mas com forte inserção acadêmica, artística e cultural.”

Fora dos padrões

“A Escola de Belas Artes foi sempre uma unidade sui generis, fora dos padrões”, define a professora aposentada Pompéia Peret, que chegou como aluna em uma época em que as aulas eram ministradas em instalações precárias na Pampulha. “Havia um grupo de professores que eram artistas importantes, como o Álvaro Apocalypse, e os alunos tinham nível cultural muito alto. O ambiente era de forte integração”. relembra.

Em 35 entrevistas sobre as memórias associadas à Escola que realizou há mais de 15 anos, Pompéia Peret conheceu ou confirmou histórias como a das atividades realizadas no terreno onde começava a ser construído o Palácio das Artes e a do temporal que inundou a pequena biblioteca da EBA e danificou, já na Pampulha, trabalhos de alunos.

A professora emérita Beatriz Coelho lembra que a expansão da EBA para novas áreas sofreu resistência, nos primeiros tempos, por parte dos defensores da exclusividade das artes plásticas. Da mesma forma, o início dos trabalhos de restauração das telas da Escola de Música, sob coordenação do Iphan, foi acompanhado de início apenas pelos professores – só mais tarde houve adesão dos estudantes. Mesmo depois de aposentada, Beatriz manteve atividades voluntárias na Escola por mais oito anos. “Aprendi muito na convivência com os colegas e com os alunos”, diz a professora, que dirigiu a EBA de 1976 a 1981.

Bem acolhido

Representante de uma geração mais nova de professores, Carlos Henrique Falci, do curso de Cinema de Animação e Artes Digitais, salienta que a Escola de Belas Artes é caracterizada hoje por uma grande variedade de visões por parte de professores e alunos. “Tenho formação transdisciplinar, misturada, e fui muito bem acolhido. Mas ainda podemos aproveitar mais as possibilidades criadas por essa diversidade, também na relação com a Universidade. Estamos nos aproximando das outras unidades, e está cada vez mais claro o potencial de interação das artes com as outras áreas”, afirma.

Entre as lembranças mais fortes do artista visual e “fazedor de coisas” Paulo Nazareth, ex-aluno que deixou as salas de aula em 2006, estão o trânsito livre pelo ateliê de escultura, a possibilidade de trabalhar com gravura em horários diversos e o contato fluente entre alunos mais jovens e veteranos. “Contei sempre com apoio de todos na Belas Artes, incluindo as faxineiras que guardavam material de reciclagem para minha produção. Mesmo depois de terminado o curso, mantive contato e trabalhei por lá, com ajuda de professores, funcionários e do Diretório Acadêmico”, conta Nazareth.


EBA em números

1.341 estudantes
111 professores
63 servidores técnicos e administrativos em educação
139 projetos de pesquisa
27 grupos de pesquisa
410 ações de extensão
39 projetos de ensino
40 defesas por ano na pós-graduação (média)
14 convênios internacionais
*Reportagem originalmente publicada em 17 de abril de 2017 na edição nº 1973 – ano 43 do Boletim UFMG.

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