Altivo Almeida Cunha
Mestre em Economia, superintendente do BH-Tec
Mariana Santos
Economista, gestora executiva do BH-Tec
O pensamento sobre o desenvolvimento local vem sendo conduzido em torno de algumas questões essenciais e complexas: qual a capacidade de um processo inovativo transformar regiões sob as óticas econômica e social? Quais as condições para essa transformação ser sustentável? Como uma localidade ou região pode incrementar o processo de inovações? E, principalmente, como pensar tais questões em um mundo em transformação? A última pergunta coloca a necessidade de nova formulação a partir da convergência de diferentes enfoques teóricos e analíticos como os da nova geografia econômica, da perspectiva evolucionista e das abordagens institucionalistas.
Renato GaiaAs pistas para compreender a relação entre emergência de uma sociedade do conhecimento e o desenvolvimento regional requerem, pela própria complexidade do tema, uma visão integradora de diversas escolas de pensamento e abordagens teóricas. Podem-se tomar como premissas algumas formulações fundamentais do processo de inovação como seu caráter de destruição criadora, proposta por Schumpeter, dentro de uma perspectiva evolucionária em um ambiente de seleção e rotinas. O ambiente institucional é determinante, mas não reprodutível, e a forma e a intensidade das interações sociais, culturais e econômicas influenciam e conformam o sistema. Além do mais, assume-se que o desenvolvimento é, por natureza, desequilibrado regionalmente. Esse corolário desemboca na percepção de que a luta competitiva e a inovação abrem janelas de oportunidade, que também são janelas locacionais, ou seja, profundamente relacionadas às características do ambiente local.
É consenso hoje que a capacidade de atração e de estímulo ao desenvolvimento e inovação de cada região ou localidade depende de capital humano qualificado, da existência de redes formais e informais que exigem fortes sinergias e da presença de poderes estratégicos de administração em educação, inovação e suporte empresarial. Em síntese, a cooperação local é determinante-chave na capacidade de competição e inovação.
O esforço de busca e luta competitiva centrada no processo inovativo depende de duas dimensões fundamentais: 1) a capacidade empresarial de identificar novos produtos e processos e 2) a capacidade local de aprender, no sentido de criar uma atmosfera de transformação e progresso para o aprendizado regional e coletivo.
No entanto, a proximidade geográfica não é suficiente para catalisar o processo inovativo e incorporá-lo regionalmente. As regiões possuem história, com pesos positivos e negativos, sendo que algumas não vão gerar conhecimento de fronteira – continuarão especializadas em produção de bens tradicionais. Para incorporar os princípios de criação de conhecimento e aprendizado contínuo, as regiões devem se preparar para prover infraestruturas específicas, que possam facilitar o fluxo de ideias e a capacidade de governança local.
É nesse contexto que se insere a oportunidade de estruturação de um parque tecnológico. Muito além de empreendimento urbanístico, imobiliário ou distrito industrial, um parque tecnológico é um sistema institucional planejado em área geográfica construída e delimitada, baseado na concentração de empreendimentos intensivos em conhecimento e tecnologia que se beneficiam da proximidade física com universidades, centros de pesquisa, empresas e instituições para gerar um ambiente de “fertilização cruzada” e sinergias para a disseminação e aprofundamento do conhecimento. Destina-se, pois, a contribuir para a construção de “regiões de aprendizagem” ou “baseadas no conhecimento”.
Para cumprir esse papel, os parques não podem funcionar apenas como centros geradores de novas tecnologias, mas precisam atuar, também, como núcleos difusores e coordenadores das atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D), resultando em processos contínuos de inovação tecnológica com caráter sistemático, cumulativo e progressivo.
Quais dessas condições estão presentes em Belo Horizonte, e que potencial tem esta região para consolidar um ambiente inovativo? Uma série de fatores deve ser levada em conta: a capacidade de geração de conhecimento e pesquisa, através da rede de instituições de pesquisa, ensino e geração de conhecimento; a infraestrutura urbana e a oferta de serviços especializados, a base industrial e o seu potencial inovativo; e a existência de redes formais e informais de cooperação.
Este artigo foca apenas um desses aspectos: a identificação do potencial inovativo da estrutura industrial intensiva na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Para delimitar esta estrutura, tomamos como base alguns dados do estudo de demanda potencial contratado pelo BH-Tec e realizado pelo consórcio DM&P e Instituto Inovação, em 2008.
Entre os segmentos apontados como mais promissores estão os de Tecnologia da Informação e Comunicação, com foco em software e tecnologia de internet e e-business, e o de Biotecnologia, centrado em Saúde Humana e Biologia Molecular.
Renato GaiaEm 2007, de acordo com a Fumsoft, a Região Metropolitana de Belo Horizonte abrigava 1.692 empresas de TI, sendo 1.474 da área de desenvolvimento de software. Minas Gerais empregava 34.063 pessoas em TI, sendo 17.350 em Belo Horizonte. O cluster de biotecnologia é formado por cerca de 60 empresas, responsáveis pela geração de quatro mil empregos diretos e faturamento da ordem de US$ 2 bilhões por ano. O principal setor de biotecnologia em Minas Gerais, liderado pela RMBH, é o de saúde humana, seguido de saúde animal, agronegócios e meio ambiente. Belo Horizonte conta com duas incubadoras que dão suporte ao desenvolvimento de empresas de biotecnologia.
No estudo de demanda potencial para o BH-Tec, uma primeira característica de destaque das empresas dos setores priorizados se refere à escolaridade do seu quadro de pessoal. Em média, cerca de 70% dos funcionários das empresas de TI possuem, no mínimo, curso superior, sendo que 15% são pós-graduados (com mestrado apenas ou também com doutorado). No setor de biotecnologia, o número de funcionários com, no mínimo, curso superior se eleva para 90%, sendo que 20% são pós-graduados.
As empresas de base tecnológica mantêm importantes relacionamentos com instituições de pesquisa e universidades. Cerca de 40% das empresas de biotecnologia entrevistadas declararam possuir algum tipo de relacionamento com universidades particulares, 70% com a UFMG e 10% com outras universidades públicas. Além disso, 10% delas já captaram recursos da Financiadora de Estudos e Projetos do Ministério da Ciência e Tecnologia (Finep/MCT). No caso das empresas de TI, o relacionamento com a UFMG é inferior (14%), mas é mais intenso com outras universidades públicas (21%), e se mantém no mesmo patamar com universidades particulares. Essas empresas também possuem vínculos com outras instituições, incluindo órgãos associativos e representantes da sociedade civil, e hospitais e escolas, no caso das empresas do setor de TI.
A expectativa é que o BH-Tec possa contribuir para intensificar e até mesmo formalizar esses relacionamentos, ampliando, em alguma medida, as atividades de extensão das universidades, garantindo formação de profissionais para o mercado, acesso ampliado das empresas à infraestrutura laboratorial e maior fluxo de feedbacks da indústria para o progresso científico e o acúmulo de conhecimento.
Revista Diversa nº 17
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