BH registrou menos internações por outras doenças em momentos distintos da pandemia

Estudo da Faculdade de Medicina revelou, no entanto, aumento da mortalidade hospitalar; óbitos domiciliares também cresceram

Gravidade dos casos de pacientes internados aumentou durante pandemia

Gravidade dos casos de pacientes internados aumentou durante a pandemiaAscom | Hospital Risoleta Tolentino Neves

Em dois momentos distintos da pandemia de covid-19 (no início, em março, e em julho de 2020), o Sistema de Internações Hospitalares (SIH) do SUS registrou, em Belo Horizonte, redução de 28% nas internações por doenças respiratórias, circulatórias ou cardiovasculares, infecciosas e neoplasias (cânceres). Esse resultado foi apurado por pesquisadores da Faculdade de Medicina da UFMG, em parceria com a Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e a Prefeitura de Belo Horizonte, que compararam a média de internações dos últimos cinco anos com a média de 2020, quando ocorreram 54.722 internações por causas naturais, e não de covid-19.

De acordo com uma das autoras do estudo, a professora Luisa Caldeira Brant, do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG, os dados mostram que, se por um lado as internações se reduziram durante a pandemia, por outro, a gravidade dos casos que resultaram em internação aumentou, provocando maior mortalidade hospitalar. “O impacto foi mais sentido exatamente entre pessoas com doenças cardiovasculares e insuficiência cardíaca, que ocorrem mais frequentemente naqueles indivíduos com diabetes, hipertensão e obesidade”, observa a médica.

Alguns pacientes sequer recorreram aos serviços de saúde, o que também está relacionado ao outro resultado alcançado pelo estudo: aumento no número de óbitos domiciliares registrados pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência em Belo Horizonte. “Observamos uma mudança no local de óbito, com pessoas falecendo mais em suas casas, embora o panorama da mortalidade por doenças cardiovasculares não tenha mudado em Belo Horizonte”, afirma Luisa Brant.

Efeito colateral

Na avaliação da professora, a redução de internações, no início da pandemia, por causas que não a covid-19 mostra os efeitos das medidas restritivas no comportamento das pessoas – a recomendação era para permanecer em casa. “Isso estava correto, na perspectiva de diminuir os riscos de contágio. Mas, como consequência indireta, houve redução da busca por assistência em situações necessárias, como o acompanhamento clínico de pessoas com diabetes, hipertensão e obesidade, ou seja, com doenças crônicas que são fatores de maior gravidade também para a covid-19”, observa a professora da UFMG.

Outro possível agravante da situação foi a reorganização dos serviços de saúde para evitar a saturação, com o adiamento e a remarcação de cirurgias eletivas. E em julho de 2020, com o aumento expressivo de casos de covid-19 na capital, a concorrência por leitos ficou maior, acentuando novamente a queda de internações por outras doenças.

No caso das neoplasias (cânceres), a redução de internações foi menor em comparação às outras doenças. Uma hipótese é a de que o acompanhamento desses pacientes é mais próximo, e as cirurgias, geralmente, não podem ser adiadas. Em relação a outras doenças respiratórias (não covid-19), a queda de internações está atrelada à redução de pessoas adoecidas. Para Luisa Brant, isso foi “um reflexo das medidas preventivas para a covid-19, que indiretamente preveniram outras doenças respiratórias”.

O impacto desses dados ao longo dos próximos anos é um provável aumento da demanda por internações e cirurgias, provocada por novos casos que poderiam ter sido prevenidos. Luisa Brant defende a retomada do cuidado aos pacientes que ficaram mais prejudicados com a pandemia, como hipertensos e diabéticos, para a prevenção de complicações.

A professora alerta para o fato de que “a conta do atendimento tardio pode sair cara, porque a agilidade e a qualidade do tratamento durante a internação são importantes para a qualidade de vida dos pacientes no futuro”. Para Luisa Brant, é fundamental que as redes de atendimento não desestruturem outras linhas de cuidados, orientando a população a buscar o hospital quando houver sintomas de alarme para as demais doenças.

O estudo foi publicado na revista PLOS Global Public Health – Open Science Journal, com o título The impact of covid-19 pandemic course in the number and severity of hospitalizations for other natural causes in a large urban center in Brazil.

Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina

Publicado em: 02 de fevereiro 2022