Revista da Universidade Federal de Minas Gerais
Ano 1 - nº. 1 - 2002

Editorial

Entrevista
Reitora discute cotidiano da UFMG

Médicas
Os laços são estreitos com a comunidade

Biológicas
Os bichos são os grandes aliados

Ciências Sociais Aplicadas
Multidisciplinaridade é a marca delas

Ciências da Terra
Ligados no ambiente do planeta terra

Ciências Exatas
O lúdico pôs para correr a imagem de bicho-papão

Engenharias
Eles estão pintando o sete

Humanas
Programas privilegiam a cidadania

Artes
Um bálsamo para a vida

Fump
Acolhimento garante permanência

Hospital das Clínicas
Onde ensino e pesquisa combinam com assistência

Pólo do Jequitinhonha
Desenvolvimento sem abrir mão da regionalidade

Manuelzão
Rio das Velhas ganha novos ares

Cultura
Produção cultural para todos os gostos

Editora
Em sintonia com o mercado

UFMG Diversa
Expediente

Outras edições

Artes

Parla!

Centro da UFMG recupera patrimônio histórico e artístico nacional e forma novos profissionais

No mundo brasileiro das artes, não há quem não conheça o Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis (Cecor), da Escola de Belas-Artes, responsável pela recuperação de diversas obras de arte brasileiras e o único do País que oferece curso de especialização na área. Os profissionais que ali trabalham ou que por lá passaram deram vida nova a uma lista enorme de bens do patrimônio histórico e artístico nacional e também de particulares. “Alcançamos a nossa maioridade”, brinca a diretora Anamaria Ruegger Neves, contabilizando os 21 anos do Centro. Na maturidade, o Cecor deve ser coroado com a criação do curso de graduação em conservação e restauração, uma proposta inédita no Brasil.

Osvaldo Afonso

O Cecor atua tanto no ensino quanto na pesquisa e na extensão. Os alunos, com formação universitária em diferentes áreas, passam por um processo de seleção que, este ano, se realizará durante os meses de outubro e novembro. O curso prepara profissionais para o trabalho de conservação e restauração de obras sobre o papel, esculturas policromadas, pintura de mural e de cavalete. Para prestação de serviço, o Cecor é procurado para as mais diferentes tarefas.

A restauração do forro da Igreja de São Francisco de Assis, de Manuel da Costa Ataíde, em Ouro Preto, é obra do Cecor. A Última Ceia, do Mestre Ataíde, exposta no Colégio do Caraça (em Santa Bárbara), mereceu igualmente os cuidados do Centro, que assina a responsabilidade pela restauração da pintura da caixa de madeira do famoso órgão da cidade de Mariana; da obra de Portinari na igrejinha da Pampulha, em Belo Horizonte; dos três mapas da capital mineira manuseados pela equipe construtora de Aarão Reis; de várias obras de Guignard e outros artistas brasileiros. Agora, o Cecor está envolvido com um projeto para a restauração do forro da Matriz de Viçosa do Ceará (CE). “Vamos para muitos lugares e, também, recebemos muitas obras”, assinala a diretora.

O Cecor oferece assistência a museus, bibliotecas, galerias de artes e arquivos, inclusive prestando consultoria em conservação preventiva. Executa dezenas de trabalhos por ano, fora e dentro de Minas Gerais. Donos de grandes coleções ou de galerias de arte também têm o Cecor como parceiro. Segundo o professor Marco Elisio de Paiva, do departamento de Artes Plásticas, da Belas-Artes, o Centro reúne todas as condições técnicas para atestar a autenticidade de uma obra. Os laudos relativos a quadros, por exemplo, resultam de análises do ponto de vista estilístico, de conservação, de identificação da assinatura do autor e de estudos químicos de laboratório. O Laboratório de Ciência da Conservação (Lacicor) possui equipamentos sofisticados. Nele, está sendo montada uma nova área de documentação científica de obra de arte, totalmente digitalizada, num projeto avaliado em R$ 250 mil.

O professor Luiz Souza, coordenador do programa de pós-graduação em Artes Visuais, da Belas-Artes, e professor no Cecor, está também envolvido com a consolidação da rede de pesquisas em Processos e Técnicas de Avaliação e Intervenção em Bens Culturais, mantida pela linha de financiamento em Ciências, Tecnologia e Conservação Integrada de Bens Culturais (Recicor), do CNPq. Cerca de R$ 1 milhão foram destinados à rede para projetos de pesquisas, que serão realizados também por instituições federais de ensino de São Paulo, Rio de Janeiro e Roraima e ainda pelo Centro Tecnológico de Minas Gerais (Cetec). “A rede é interdisciplinar”, ressalta Souza, destacando que o trabalho vai auxiliar no aprofundamento e descoberta de novas técnicas.

O curso de graduação em conservação e restauração de bens culturais móveis é um sonho dos professores do Cecor, prestes a realizar-se. Segundo Anamaria Neves, o curso de especialização é procurado por alunos de todo o Brasil, o que demonstra a demanda por ele e a sua qualidade técnica. O Centro conquistou, ao longo de sua história, uma performance invejável, apoiado em laboratórios e ateliês modernos e incomuns em outras instituições de ensino brasileiras.

Unidos por sete notas

Escola de Música desenvolve projetos musicais que agrupam professores, alunos e sociedade

Foi numa escolinha pública de música, no interior de São Paulo, que o menino Anor Luciano Júnior, então com nove anos, descobriu sua paixão pelas bandas. Hoje, aos 42, ele é professor da Escola de Música e coordenador do projeto que inseriu no curso de graduação a exigência da disciplina Bandas Sinfônicas. “Por experiência, sei que grande parte dos músicos profissionais tocou em bandas”, afirma, lamentando que, nos ensinos fundamental e médio, a música esteja sendo relegada a um plano inferior.

Osvaldo Afonso
Afinados, alunos são elementos de propagação da boa música por todos os cantos de Minas Gerais

O resultado, de acordo com o professor, é que os alunos apresentam deficiências quando chegam à universidade. A constatação, unida à certeza de que as bandas têm papel fundamental na difusão de repertórios eruditos ou populares, motivou Anor Júnior a montar o Projeto Bandas, uma das iniciativas da Escola de Música para levar o ensino de instrumentos e de toda uma concepção da arte musical para fora da UFMG. O projeto nasceu, em 1998, como atividade de extensão. “O apelo social e popular das bandas é muito grande”, argumenta. Quando as inscrições foram abertas, também a demanda por algo parecido foi comprovada. Ávidos pelo curso, com duração de dois anos, estavam pessoas sem nenhuma base musical e até músicos que já se exibiam em bandas de escolas, de igrejas ou de grupos militares.

A cada semestre, o Projeto Bandas recebia a matrícula de cem pessoas, que se dividiam em três bandas, de acordo com o nível de conhecimento. “Cresceu tanto que vamos reformular a idéia”, avisa o professor. A proposta mostrou à Escola de Música uma carência antiga, por não ter em seu currículo a formação em bandas. Agora, a disciplina Banda Sinfônica é obrigatória desde o terceiro período. “Mas quem entra no primeiro não sai mais”, sustenta Anor Júnior. “Não sei de outra universidade onde a banda faça parte do ensino na graduação”, ressalva.

A partir do projeto, foi formada a banda da graduação. Com alunos do curso regular e aqueles que vêm de fora, a banda já gravou um CD com o Hino Nacional, tocado de forma diferente em três faixas. Os alunos bolsistas são responsáveis não somente pelo atendimento aos alunos de fora como também pelos ensaios individuais dos próprios colegas da graduação. “É uma ótima oportunidade para se praticar em grandes grupos”, destaca o professor, lembrando que os alunos têm também a possibilidade de tocar em conjunto na Sinfônica existente na Unidade. A Sinfônica gravou um CD com o panorama da criação musical da própria Escola desde l925 e, recentemente, montou a ópera Orfeo, do italiano Cláudio Monteverdi (1567-1643).

A intenção do Projeto Bandas, explica Anor Júnior, não é apenas a de formar grupos, mas também a de contribuir para uma consciência musical. “Queremos platéias críticas”, ressalta ele, e, por isso, o projeto promove seminários, palestras e shows nos quais os alunos se apresentam. Uma preocupação constante é divulgar a necessidade da música nas escolas de ensinos fundamental e médio. “É quando começamos a criar essas platéias”, salienta. Reforçando essa necessidade, a Escola de Música mantém, há cinco anos, o Centro de Musicalização Infantil, onde crianças de três a 12 anos têm aulas dos mais variados instrumentos. As aulas são dadas por alunos da graduação, e os cursos chegaram a ter 130 inscritos. “Existe até aula de harpa, algo bem raro”, lembra o professor e diretor da Escola de Música, Cláudio Urgel Pires Cardoso.

Um por todos e todos por um

Ciência da Informação ensina alunos e comunidade a preservar acervos bibliográficos

Osvaldo Afonso

A preocupação com patrimônios culturais ocupa lugar especial também na Escola de Ciência da Informação, a antiga Escola de Biblioteconomia, onde está instalado o Laboratório de Preservação de Acervos (LPA). Fundado em 1986, para suprir uma necessidade na formação dos bibliotecários que lidam no dia-a-dia com problemas de deterioração de livros e documentos, o LPA capacita os alunos em técnicas de recuperação de materiais danificados, uma constante em todas as bibliotecas.

“A intenção não é formar restauradores, mas profissionais conscientes da importância da preservação e da conservação preventiva”, ressalta a coordenadora do LPA, Rosemary Tofani Motta. O Laboratório é, ainda, um espaço para realização de estágios curriculares, em que os procedimentos básicos para a recuperação de documentos danificados são estudados. Ali também são desenvolvidas pesquisas, que testam técnicas de conservação e materiais alternativos para esse tipo de trabalho. Num amplo projeto, coordenado pela professora Maria Conceição Carvalho, o LPA oferece cursos regulares (quatro a cada ano) de conservação de livros destinados aos alunos da própria Escola e um programa de visitas monitoradas.

As visitações são feitas por alunos de escolas públicas próximas à UFMG. O LPA recebe turmas de crianças que entram em contato direto com o mundo da preservação de bens tão especiais como os livros. Além de palestras para conscientização, as crianças freqüentam uma pequena oficina de técnicas básicas de recuperação de volumes danificados. Os livros recuperados pertencem às escolas das crianças, o que faz com que estas tenham uma relação ainda mais próxima com eles. “A gente sabe como as escolas estão sendo depredadas e o quanto é necessária essa conscientização”, assinala Rosemary, lembrando que as crianças, quando voltam às escolas, transformam-se em multiplicadoras.