Revista da Universidade
Federal de Minas Gerais
Ano 1 - nº. 3 - Agosto de 2003 - Edição Vestibular
Suporte para o avanço
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Não estranhe se, ao entrar nas oficinas da Engenharia Mecânica, você esbarrar em estudantes trabalhando em um delicado coração artificial, em um “músculo” que ajudará deficientes físicos a se locomover, em cadeiras de rodas que levantam o portador, em garfos, facas ou colheres, em aviões de pequeno porte, em um carro de modelo estranho e até na construção de uma chaminé. Lá, está muita gente interessada em calor e frio, como Vinícius Sena Moreira, de 26 anos, aluno do Mestrado, cuja pesquisa é sobre refrigeração.
Ex-aluno da Graduação, Vinícius foi surpreendido pelas possibilidades do curso de Mecânica quando entrou para a UFMG. Naquela época, o que ele tinha em mente era ser engenheiro da indústria automotiva, o que, observa, incentiva grande parte dos estudantes que optam pelo curso. “Acabei me dirigindo para a área de calor e fluidos, porque descobri, aqui dentro, que ela existia”, recorda. Este é um risco que corre o candidato a uma vaga na Mecânica: o de descobrir que essa Engenharia é uma especialização de muitos braços, que não se restringe à graxa ou ao chão de fábrica, como é comumente associada.
Entre as Engenharias, a Mecânica é a única que possui curso diurno e noturno. “Os dois cursos são idênticos”, ressalta a Coordenadora do Colegiado de Graduação, professora Gilva Rossi de Jesus, lembrando que o currículo foi modificado há dois anos, para garantir ao estudante formação mais ampliada.
Nos primeiros períodos, a Mecânica oferece uma formação básica, que atende aos fundamentos da teoria e da prática. Porém, no decorrer do curso, o aluno poderá escolher uma de seis trajetórias: Engenharia Aeronáutica, Engenharia Automotiva, Equipamentos Térmicos e Utilidades, Projeto e Fabricação, Mecatrônica e Refrigeração.
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Músculo artificial desenvolvido na Engenharia Mecânica |
As trajetórias estão abertas a novas opções que levem o estudante a interagir em outras áreas do conhecimento que não somente a da Engenharia. Para isso, ele deverá montar um currículo com disciplinas de outros cursos, que possam lhe dar uma formação consistente em, por exemplo, Engenharia Ambiental ou Bioengenharia. A interação dos saberes desen cadeia surpreendentes soluções tecnológicas para o bem-estar do ser humano.
É o caso, por exemplo, de professores e alunos do Laboratório de Bioengenharia (LabBio) que trabalham no desenvolvimento da câmara interna do coração auxiliar, uma alternativa de alta tecnologia para pacientes com graves problemas cardíacos. “O que a gente percebe, depois de um tempo no curso, é que ele permite trabalhar em áreas muito pouco tradicionais ou que a maioria das pessoas não sabe que têm a ver com a formação do engenheiro mecânico”, ressalta Vinícius.
Muitos estudantes da Graduação estão envolvidos com o projeto do minibaja, um tipo de carro inteiramente fabricado nas oficinas da Mecânica, todos os anos, para participar de competição nacional e internacional nessa categoria, criada, nos Estados Unidos, justamente para estimular estudantes interessados na indústria automotiva. A Mecânica produziu quatro carros – da concepção do projeto até a sua montagem – e participa das competições desde 1996.
Uma outra minifábrica também funciona na Mecânica, no Centro de Estudos Aeronáuticos (CEA), onde os alunos que decidem pela ênfase em Aeronáutica têm pouso certo. Roberta Ferraz, de 24 anos, passou horas e horas dentro do CEA até sua formatura no ano passado. Contratada pela Embraer, num processo de seleção que envolveu candidatos de todo o País e durou seis meses, Roberta trabalha em São José dos Campos (SP), no Setor de Operações, onde revisa e reedita manuais aeronáuticos. “O trabalho exige que eu entenda dos sistemas da aeronave para que possa explicá-los, tanto nas publicações quanto para os clientes”, diz ela, fascinada por aviões desde os cinco anos de idade.
Roberta avalia o curso como pesado. “O sonho de todo estudante é um curso bem divertido, que ensine muito sem precisar que o aluno se afunde em livros. A Mecânica, definitivamente, não é assim. Requer muito. A boa formação, que, hoje, me dou conta de ter tido, devo muito às cobranças”, ressalta ela.
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Engenharia Automotiva é uma das opções oferecidas no curso |
A preferência de Roberta pelo mercado de trabalho antes de uma Pós-Graduação não quer dizer que ela não pense nisso. “Com certeza, farei Mestrado e Doutorado. O mercado exige especialização”, atesta. Antes de se formar, ela já planejava trabalhar, pelo menos, durante um ano para, depois, voltar a estudar. Esse não era o desejo de Cristiana Santiago Brasil, de 27 anos, uma das mulheres que optaram pela Engenharia Mecânica. Formada em 1997 e, hoje, aluna do Doutorado, Cristiana sempre soube que seu futuro estava ligado à docência. “Me envolvi com projetos de pesquisa desde o sexto período e nunca pensei em ir para a indústria ou algo parecido. Quero mesmo é dar aulas”, diz Cristiana, cujo projeto de Doutorado é sobre fontes alternativas de energia. Ela ajuda na construção de um protótipo de chaminé solar para a secagem de grãos – uma técnica nunca utilizada no Brasil.
A certeza profissional de Cristiana, tanto na escolha do curso quanto na definição da área de trabalho, não é uma unanimidade entre os alunos de qualquer curso e foi isso que Rogério de Castro Lambert, de 23 anos, descobriu. Rogério desistiu da Geologia quando estava no quinto período e conseguiu entrar para a Engenharia Mecânica no ano passado, enfrentando um processo de reopção (uma alternativa oferecida para alunos da própria UFMG quando os cursos têm vagas em aberto). “Não conseguia estudar com vontade na Geologia, mas começar tudo de novo é uma decisão muito difícil. Troquei sem que ninguém da minha família soubesse”, lembra ele, que, hoje, diz ter “outro rendimento escolar”.