Revista da Universidade Federal de Minas Gerais
Ano 2 - nº. 5 - Junho de 2004 - Edição Vestibular

Editorial

Entrevista
Por dentro da UFMG

Inclusão
Para todos

Assistência ao estudante
Uma mão lava a outra

Cultura
Território da arte

Ciências Agrárias
Engenharia Agronômica
Medicina Veterinária

Ciências Biológicas
Ciências Biológicas

Ciências da Saúde
Ciência da Nutrição
Educação Física
Enfermagem
Farmácia
Fisioterapia
Fonoaudiologia
Medicina
Odontologia
Terapia Ocupacional

Ciências Exatas e da Terra
Ciência da Computação
Ciências Atuariais
Estatística
Física
Geologia
Matemática
Matemática Computacional
Química

Engenharias
Engenharia Civil
Eng. Controle e Automação
Engenharia de Minas
Engenharia de Produção
Engenharia Elétrica
Engenharia Mecânica
Engenharia Metalúrgica
Engenharia Química

Ciências Humanas
Ciências Sociais
Filosofia
História
Pedagogia
Psicologia

Ciências Sociais Aplicadas
Administração
Arquitetura e Urbanismo
Biblioteconomia
Ciências Contábeis
Ciências Econômicas
Comunicação Social
Direito
Geografia
Turismo

Lingüística, Letras e Artes
Artes Cênicas
Belas-Artes
Letras
Música

UFMG Diversa
Expediente

Outras edições

Entrevista

Por dentro da UFMG

Ana Lúcia Almeida Gazzola

Foca Lisboa
ANA LÚCIA concede entrevista aos vestibulandos Natália, Michelle e Pedro Henrique

A Reitora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Professora Ana Lúcia Almeida Gazolla, teve uma surpresa ao ser entrevistada. À sua frente, estavam não apenas um repórter, mas três. E todos com uma credencial que não a de jornalista, mas a de futuros vestibulandos, que se preparam para enfrentar o mais importante teste acadêmico da vida deles. Uma certa timidez foi logo quebrada pelo interesse em conhecer mais e melhor o que a UFMG tem a oferecer-lhes e a milhares de outros estudantes que passam por esse momento, ainda tão marcado pela apreensão e pela ansiedade. Com a Reitora, estavam Michelle Leonel Corsino, de 17 anos, aluna da rede pública municipal; Natália Campos Rocha, de 17 anos, que cursa o terceiro ano numa escola particular; e Pedro Henrique Carvalho Nicolau, de 18 anos, o único que já passou pelo teste do Vestibular e, agora, faz cursinho.

Michelle e Natália ainda não se decidiram quanto à profissão que pretendem ter. A primeira analisa a possibilidade de tentar Turismo, mas balança quando pensa em Letras, porque adora estudar Inglês. Natália quer Direito e, ao mesmo tempo, Odontologia, porém se entusiasmou quando soube que a UFMG planeja ter um curso de Serviço Social. Já Pedro Henrique tentará, na UFMG, pela segunda vez, Ciências Econômicas. No ano passado, ficou de fora por poucos pontos e tem-se concentrado nos estudos o dia inteiro.

Foca Lisboa

Michelle - Quais são os desafios enfrentados na administração da UFMG?

A gestão da UFMG é um desafio muito grande, porque a Instituição é muito complexa, as áreas de ensino, pesquisa e extensão são muito diversificadas e envolvem a administração não só dos cursos, mas, inclusive, de hospitais e até fazendas. E não apenas em Belo Horizonte, mas em outras cidades, como Montes Claros, onde temos um campus avançado de Ciências Agrárias. O momento atual tem apresentado dificuldades consideráveis. Temos gastado um percentual cada vez mais alto do orçamento que vem do Ministério da Educação para manutenção dos serviços de, por exemplo, água, energia, porteiros, vigilantes, telefonia e limpeza. Nisso, gastamos quase 60% dos recursos e os outros 40% são para a Universidade viver como tal, cobrindo desde bolsas de graduação até material de consumo – como giz ou cartuchos de impressora. Esses recursos têm sido insuficientes, tanto que temos dívidas pendentes de 2003 – mais de 5 milhões de reais – e, este ano, se não houver um acréscimo orçamentário, projetamos uma dívida na ordem de 2 milhões de reais. Isso desestabiliza a Universidade e desloca nossa atenção do que interessa realmente, que é a vida acadêmica. Por outro lado, temos conquistado muita coisa. Estamos iniciando as obras de uma nova Moradia Universitária; inauguramos os prédios da Faculdade de Educação e do Departamento de Química; concluímos o da Farmácia; estamos finalizando reformas no Hospital Borges da Costa e no Hospital Veterinário; colocamos vigilância eletrônica nas bibliotecas; investimos muito nas redes de computação. Esses recursos são captados em diferentes Ministérios e nas agências de fomento, e vêm, também, da venda de patrimônio na cidade. E planejamos construir os prédios da Faculdade de Ciências Econômicas e da Escola de Engenharia no campus Pampulha.

Pedro Henrique – A reforma universitária prevê as cotas sociais e discute as cotas raciais. O que a senhora acha disso?

O princípio que está por trás das cotas está correto. A democratização do acesso às universidades públicas é inadiável, urgente, pois vivemos um problema sério de exclusão social. A Universidade tem confirmado essa exclusão, na medida em que, em alguns cursos, a presença de alunos de classes sociais menos privilegiadas é pequena. Não sou favorável a cotas étnicas, pois todos os estudos indicam que as chances de alunos brancos e negros que vêm de escola pública é a mesma. Da mesma forma que alunos brancos e negros de escola privada também têm chances iguais. Se estabelecermos cota étnica, separada da questão socioeconômica, estaremos privilegiando os mais ricos dentro das etnias. Há outras maneiras de garantir a inclusão, sem reservas de vagas. É bom lembrar que a Constituição Federal garante a autonomia das universidades federais, mas o Projeto de Lei do governo, embora decorrente de uma posição política correta, atinge essa autonomia. Defendemos que cada instituição possa escolher os meios e os instrumentos necessários à inclusão.

Foca Lisboa

Natália – O que a UFMG tem feito para aumentar os cursos noturnos?

Há um ano, tínhamos apenas 14% de vagas oferecidas em cursos noturnos. Neste último Vestibular, passamos para 21%. O Conselho Universitário e o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão aprovaram que o princípio da democratização do acesso é prioritário na nossa política acadêmica e que os cursos noturnos são o principal instrumento dessa ação. Estamos fazendo um grande esforço para crescer, mas o problema é a falta de recursos. Lidamos com problemas enormes e estruturais. A energia gasta à noite é mais cara e nossa conta anual é de 7 milhões de reais. Se esses gastos subirem sem controle, teremos um grande problema. Estamos negociando com os governos estadual e federal propostas de redução dos custos, mas isso não é suficiente. Precisamos de professores, de bibliotecários, de funcionários na administração. Temos espaço físico e sabemos que podemos crescer muito nos cursos noturnos, mas há necessidade de ajustes. Estamos montando os projetos, aprovamos os cursos nas instâncias competentes e levamos uma espécie de pacote para o Ministério. Se o Ministro nos der os recursos, poderemos criar os cursos; caso contrário, iremos mostrar para a sociedade que existe a possibilidade e que o que falta são os recursos.

Michelle – Já existem os projetos de implantação de novos cursos?

Estamos, neste momento, avaliando o projeto de criação de um curso vespertino e noturno de Sistemas de Informação. Estudamos, também, a possibilidade do curso noturno de Engenharia Civil e criamos uma comissão para avaliar o projeto de um curso de Serviço Social noturno. Temos, ainda, grupos de estudos para que a habilitação em Cinema, do curso de Belas-Artes, se torne um curso e vamos criar, em Montes Claros, o curso de Zootecnia.

Foca Lisboa

Pedro Henrique – Ouvi dizer que muitos professores estão saindo da UFMG para trabalhar em faculdades privadas. Essa é uma preocupação da UFMG?

O orçamento da UFMG é de mais de 550 milhões de reais por ano e para manutenção sobram apenas 32 milhões de reais. Ainda assim, os salários não são competitivos. Porém o professor, em 99% dos casos, não está trocando a UFMG por instituições privadas por uma razão muito simples: aqui, ele tem ambiente de pesquisa e não existe nenhuma instituição em Minas Gerais que ofereça essa vantagem. Nossa biblioteca tem 650 mil títulos e assinamos 21 mil periódicos científicos de vários campos. Algumas universidades européias importantes não têm esse acervo. A UFMG faz, sozinha, 52% de todas as pesquisas desenvolvidas no estado. Perdemos, sim, alguns professores, mas acho que um problema mais significativo é o que chamo de privatização do tempo. Por causa da defasagem salarial, os professores começam a usar parte do tempo para complementar o salário, tempo que deveria ser usado em ensino e pesquisa na UFMG.

Pedro Henrique – Gostaria que a senhora falasse um pouco sobre a flexibilização dos cursos da UFMG.

A qualidade dos cursos de graduação está ligada a determinados fatores. Temos que ter bons alunos e professores – o que temos, porque nosso Vestibular é muito competitivo e porque 80% dos nossos professores têm mestrado ou doutorado, um dos índices mais altos do Brasil. A formação tem que gerar condições para que o estudante viva em um mundo onde o conhecimento muda depressa demais, pois não sabemos mais o perfil de atuação que uma profissão vai requerer daqui a quatro ou cinco anos, por causa das mudanças rápidas. Daí, ou a Universidade modifica a sua maneira de formar, ou ela vai formar para o passado, pois, antes, formávamos para o emprego e, hoje, precisamos formar para que os profissionais tenham empregabilidade. A empregabilidade é a capacidade de adaptação dos estudantes às profissões que estão em mutação e a única maneira de se conseguir isso é ensinando o aluno a aprender permanentemente, a lidar com um mundo de informações que nunca, antes, existiu na história, e precisamos reconhecer que a universidade não é mais o único centro produtor de conhecimento. E, aí, entra a flexibilização, porque não trabalhamos mais o curso como algo fechado, estanque, desvinculado do resto. Trabalhamos cada campo do conhecimento na sua relação com outros campos, pois tudo, hoje, é interdisciplinar, porque não há um método simples que dê conta dessa realidade. Os cursos não podem ser por disciplinas, mas por atividades. Mais do que cursos, precisamos criar percursos, para que os alunos possam transitar entre as centenas de disciplinas que a Universidade oferece. O aluno vai compor seu currículo com um conjunto de disciplinas e de atividades de formação que lhe permitirá ter uma cabeça mais aberta, uma visão mais complexa da realidade e instrumentos mais diversificados de atuação. A flexibilização é fundamental, mas só é possível em instituições que têm o que oferecer. Uma instituição que tem apenas 50 disciplinas não consegue fazer isso, mas uma, como a UFMG, que tem centenas de disciplinas e a estrutura que tem, pode flexibilizar. Outro aspecto muito importante para a formação desse aluno é a valorização do currículo por meio de bolsa acadêmica. O aluno tem que ser um aprendiz de feiticeiro. Ele aprende muito mais envolvido num projeto de pesquisa de um professor do que numa aula ortodoxa, apesar da importância dessa aula. O número de bolsas de Iniciação Científica e de outras bolsas na UFMG possibilita aos alunos um contato direto com as diferentes maneiras de produzir conhecimento. Temos centenas de bolsas acadêmicas e esse é um dos mais importantes investimentos que fazemos.

Natália – O que diferencia o profissional formado na UFMG?

Não tenha a menor dúvida de que a qualidade de uma instituição é um valor agregado ao diploma. O aluno que tem uma formação de qualidade, como a oferecida pela UFMG, que teve um relacionamento privilegiado com professores pesquisadores e cientistas, que desenvolveu trabalhos de pesquisas tem um currículo especial. A marca UFMG é esse valor agregado. Se não fosse assim, não teríamos uma competição tão grande pelos nossos cursos. O Vestibular da UFMG é concorrido não apenas pelo aspecto da gratuidade do ensino, mas por causa da qualidade deste. Claro que não somos a melhor Instituição do estado em todos os campos, mas somos uma boa Instituição em todos os campos e excelente em muitos deles. Outra marca da UFMG são os intercâmbios internacionais. Somos a Instituição mineira com o maior números de alunos estrangeiros e, também, a que envia o maior número de alunos a outros países. O intercâmbio prepara os alunos para um mundo cada vez mais internacionalizado, contribui para a formação de um aluno que vê o mundo de forma menos doméstica, que valoriza sua identidade cultural, mas que sabe, a partir dela, dialogar mais com outras.

Foca Lisboa

Pedro Henrique – O Vestibular sempre existirá?

O ideal é que não houvesse Vestibular, mas isso é absolutamente impossível, pois jamais haverá vagas para todos os que saem do Ensino Médio. Uma universidade de qualidade é para uma elite intelectual e profissional, mas sabemos que o problema, no Brasil, é que a elite é econômica. As universidades francesas, por exemplo, são gratuitas, mas não entra quem quer, entram só os melhores. Algum tipo de avaliação, acho que será necessário sempre. Os modelos mais novos de acesso não estão eliminando os exames. O Brasil é um país pobre e, por isso, temos de ter controle sobre as vagas. Quem entra tem que ficar o tempo-padrão, para dar lugar a outro. Precisamos formar muita gente. Na Argentina, 40% dos jovens de 18 a 24 anos estão cobertos pelo ensino universitário; nos Estados Unidos, esse índice é de 85%. No Brasil, tal cobertura é de apenas 9% e, em Minas Gerais, ela é de 7% – estamos pior do que a média nacional e, na América Latina, só a Bolívia e o Paraguai estão em situação semelhante à do Brasil. Existe uma plano nacional que prevê que, em 2010, deveríamos estar cobrindo 30% dos jovens nessa faixa etária. Se continuarmos nesse passo de tartaruga em que estamos, não chegaremos nem perto disso.

Natália – Como as vagas dos estudantes que abandonam a UFMG são preenchidas?

A UFMG é a Universidade brasileira que trata dessa questão há mais tempo e da melhor forma. Desde 1990, estabelecemos o currículo-padrão para graduação e, também, o tempo mínimo, médio e máximo de realização, além de um índice de aproveitamento semestral mínimo. Se o estudante ultrapassar esse tempo máximo e não obtiver o rendimento mínimo previsto, ele está fora, pois a vaga que ocupa é pública. Mecanismos de reutilização das vagas fizeram com que a UFMG atingisse o maior índice de diplomação do Brasil – chegamos a 98%, enquanto a Universidade de São Paulo (USP) tem 75% e está na segunda melhor colocação no país. A cada semestre examinamos a situação das vagas em cada curso, verificamos se alguém morreu, se abandonou, mudou de cidade ou mudou de curso. Elencamos as vagas reais e as colocamos à disposição da comunidade universitária e da sociedade. Essas vagas são aproveitadas para transferências, obtenção de novo título e reopção de cursos entre nossos alunos. As pessoas se inscrevem e a decisão é sempre do Colegiado dos cursos, com regras estabelecidas por resoluções, antecipadamente. Tudo é feito de uma forma muito transparente e as vagas são totalmente ocupadas.