Revista da Universidade Federal de Minas Gerais
Ano 3 - nº. 7 - Julho de 2005 - Edição Vestibular
Conexões espaciais
Conflitos étnicos no leste europeu, territoriais e religiosos no Oriente Médio, alagamento do território chinês para a construção da Hidrelétrica de Três Gargantas, explosão demográfica nos grandes centros urbanos, exploração de minério de ferro nas redondezas de Belo Horizonte. Esses assuntos têm em comum a Geografia, por mais estranho que isso pareça àqueles que se acostumaram a associar essa ciência somente aos estudos do relevo, do clima ou mesmo das capitais de estados e países.
Andréa Espanha![]() Geografia busca entender o homem, sua história, a atividade econômica que o sustenta |
O geógrafo, explica o coordenador do Colegiado do Curso de Geografia da UFMG, professor Antônio Magalhães Júnior, é o profissional que domina os conhecimentos sobre o espaço, natural ou construído, fazendo conexões entre as questões naturais e as transformações nele ocorridas em decorrência da presença do homem. "Queremos entender quem é esse homem, sua história, a atividade econômica que o sustenta, sua influência no espaço natural", explica Magalhães Júnior.
A Geografia é uma ciência da natureza, mas é também política, histórica e cultural. "Ela explica conflitos territoriais ao mesmo tempo que ajuda na realização de relatórios de impactos ambientais ou contribui para a ocupação ordenada de áreas em desenvolvimento", acrescenta o professor.
Visão abrangente Quando resolveu fazer o curso, há quase 10 anos, Sílvia Magalhães, 40, era funcionária administrativa da Copasa. Logo chegou à conclusão de que era necessário dedicar tempo integral ao curso e pediu licença do trabalho. Passou a viver para os estudos e dos freqüentes estágios que a levaram a diferentes órgãos públicos e entidades ligados ao meio ambiente. "Aprendi muito o tempo todo, na escola e nos estágios, e fui construindo uma rede de relacionamentos, até que vi que estava mesmo muito envolvida e que deveria investir nesse caminho", lembra.
Aline de Souza ![]() ALINE DE SOUZA integrou a equipe que retomou o antigo Projeto Rondon |
A aposta na área ambiental foi acertada. Ao voltar para a Copasa, ela estruturou um banco de dados georreferenciado sobre outorgas, que a estatal não possuía e, por isso, tinha dificuldades para trabalhar com informações sobre os próprios pontos de captação de água. Sílvia deixou a Copasa e foi trabalhar, então, na Fundação Biodiversitas e, atualmente, faz parte do Núcleo Transinstitucional para Revitalização da Bacia do Rio das Velhas, integrado ao Projeto Manuelzão — iniciativa capitaneada pela UFMG. "Esse é um trabalho muito interessante, porque são muitas as questões que temos que levar em conta. Estão envolvidos 51 municípios e não são poucas as diversidades entre eles", afirma.
Braços do Saber
Nas últimas férias, em janeiro, Aline Lopes de Souza, 28 anos, e um grupo de estudantes da UFMG e de outras universidades do país deram vida novamente ao antigo Projeto Rondon. Criado no final da década de 60 e recriado, depois de 16 anos de extinto, pelo governo federal, o Projeto Rondon levou estudantes de seis Universidades do país (três de Minas Gerais) à Amazônia.
Cada um dos estudantes que esteve na região realizou diagnósticos relacionados às áreas de interesse de estudo. A intenção é que eles voltem, nas próximas férias, para implementar as ações. Na localidade de Tefé, no coração do Amazonas, Aline identificou as experiências agrícolas da comunidade. Ela, que conclui o bacharelado em Geografia este ano (ela obteve a Licenciatura no ano passado), diz que a viagem foi um presente para o currículo. "Tivemos oportunidade de obter uma enorme carga de informação sobre a Amazônia, com a vantagem de estarmos lá, presenciando a realidade local e tentando encontrar formas de agir na região", diz ela.
Agora, Aline está envolvida com o planejamento de ações voltadas para o desenvolvimento de cinco municípios do Vale do Jequitinhonha, que serão parcialmente inundados com a construção da Usina Hidrelétrica de Murta. Orientados por um professor convidado do Instituto de Geociências (IGC) da UFMG, ela e estudantes das Ciências Sociais, Ciências Biológicas, Engenharia e Geologia traçam um plano de ações em agroecologia, recuperação de nascentes e construção de pequenas cisternas. A interdisciplinariedade, lembra o coordenador do Colegiado de Graduação, é uma marca da Geografia. Segundo ele, a "área tem muitos braços em outras ciências. Não é possível limitar muito o campo de influência da ciência".
Visão global Também por isso, os geógrafos disputam o mercado de trabalho com outros profissionais das ciências ambientais. "Isso é muito comum e é, também, enriquecedor. Dificilmente, ele trabalhará isoladamente, porque precisa de uma troca constante de informação", assinala Magalhães. Para o geógrafo Jackson Cleiton Campos, 40 anos, essa é uma realidade mais que concreta. Coordenador de Estudos Ambientais da multinacional Golder Associates Brasil, Jackson trabalha com equipes compostas por biólogos, engenheiros, arquitetos, geólogos e outros profissionais.
Foca Lisboa![]() Para RODRIGO DE OLIVEIRA, o contato com a Geografia é uma experiência reveladora |
"A visão do geógrafo é global. Estamos sempre em campo, fazendo a análise da paisagem, levando em consideração os elementos físicos, bióticos, antrópicos e socioeconômicos. Quem quiser se dedicar à Geografia deve gostar de freqüentar o campo, ter abertura para vivenciar outras culturas e ter muita vontade de ler", avalia Jackson.
O curso de Geografia, concorda o coordenador do Colegiado, enfatiza o desenvolvimento crítico e de reflexão do profissional, porque não basta apenas técnica para atuar na área. Segundo Magalhães, o curso oferece um embasamento teórico muito grande, aliado a uma carga prática que é das maiores, se não a maior, entre todos os cursos da UFMG. "Essa é uma atividade muito importante, porque os alunos percebem muito mais rapidamente o alcance da Geografia, de tudo que falamos na sala de aula", assinala.
"Quando quis fazer o curso, sabia que ia ser mais difícil por causa do trabalho, mas a Geografia é tão instigante que você se esforça ao máximo", afirma Rodrigo de Moura Oliveira, 35 anos, que deve se formar este ano. Para ele, a Geografia propõe uma leitura de mundo muito reveladora e isso é interessante para qualquer profissão.