Revista da Universidade Federal de Minas Gerais
Ano 3 - nº. 7 - Julho de 2005 - Edição Vestibular

Editorial

Entrevista
UFMG: uma instituição de ensino com responsabilidade social

Inclusão
Um portal chamado universidade

Assistência ao estudante
Antes de tudo um direito

Mundo Universitário
Os muitos olhares da graduação

Organização do Vestibular
Vestibular não é bicho de sete cabeças

Fontes de informação
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Agronomia
Medicina Veterinária
Zootecnia

Ciências Biológicas
Ciências Biológicas

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UFMG Diversa
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Outras edições

Mundo universitário

Os muitos olhares da graduação

A hora e a vez do percurso na universidade. Nova orientação educacional mexe com a prática de professores e estudantes da UFMG

Fotos: Foca Lisboa, Eber Faioli e Andrea Hespanha








Entusiasta dos números, previsões e probabilidades, não foi difícil para José Rosário Alvim de Melo, 21 anos, definir-se pela Estatística. O que ele não sabia era que outros cursos fariam parte de sua trajetória de estudante universitário. Desde o ano passado, José Rosário freqüenta o curso de Administração e, até se formar, terá passado pela Engenharia de Produção e pelas Ciências Contábeis. Como isso é possível? Ele faz parte da geração de alunos da "flexibilização", a nova orientação educacional que começou a mexer com a prática de professores e estudantes da UFMG a partir de 2001.

"Encontrar o que eu queria foi fácil, porque a Universidade oferece muitas opções", diz José Rosário, um dos poucos alunos da Estatística que trilha a "formação complementar aberta". Com a ajuda de um professor-tutor, ele montou sua rede curricular, abrindo uma vertente profissional na área da Estatística aplicada à Logística Empresarial. Essa experiência é possível para um número cada vez maior de alunos na UFMG. Dos 48 cursos de graduação da instituição, 17 já vivem a realidade da flexibilização, e outros sete incorporaram parcialmente uma exigência do modelo (a "opção livre").

Há quase quatro anos, como fruto de uma discussão iniciada no final da década de 1990 e que movimentou também outras universidades no país, o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) da UFMG aprovou a resolução que determinou a adequação dos cursos aos princípios e regras da flexibilização. A pró-reitora de Graduação, professora Cristina Augustin, explica que a flexibilização é uma resposta do ensino superior a necessidades que se exacerbaram com a sociedade da informação, com a conseqüente transformação do mercado de trabalho e também com a expansão do número de alunos. A flexibilização é, na prática, uma grande mudança na concepção de currículo: é a possibilidade de o aluno interferir muito mais na própria formação, levando em conta habilidades e preferências. "É a vez do percurso na universidade e não mais somente do curso", salienta a pró-reitora.

Horizontal e vertical Para que isso aconteça efetivamente, os currículos foram, ou estão sendo, adaptados a uma nova estrutura, só possível de ser oferecida por instituições que possuem uma rede de conhecimento ampla e sólida. "Não se pode pensar que a flexibilização permite algo solto, totalmente livre e disperso. A flexibilização é uma revolução em termos pedagógicos, mas tem que ser implementada a partir de uma concepção de ensino e aprendizagem articulada, para que esta se desenvolva de forma criativa e responsável, avalia Cristina Augustin. Desde a resolução do Cepe, os cursos na UFMG passaram a perseguir currículos com duas dimensões: a da flexibilização horizontal e a da flexibilização vertical.

No caso da primeira, a maioria dos cursos já se adaptou, pois o mecanismo de adequação é mais simples. A flexibilização horizontal reconhece as várias atividades que fazem parte da aprendizagem do aluno, mas que não eram utilizadas para a integração curricular. São seminários, congressos, festivais, palestras, cursos de curta duração, publicações, atividades de iniciação à pesquisa, extensão e docência, estágios entre outras. Essas possibilidades, presentes na vida de todos os estudantes que percebem que a formação não pode ficar restrita à sala de aula, constituem agora parte integrante do currículo, sendo contabilizadas no total de créditos e/ou carga horária necessários para que o aluno se forme.

Já a flexibilização vertical inspira processos bem mais complexos, e por isso nem todos os cursos conseguiram se adaptar, mesmo porque o sistema acadêmico e de gestão ainda está sendo reformulado. Na flexibilização vertical, os currículos contam com o "núcleo específico" (onde estão as disciplinas que constituem a essência do saber típico de uma determinada área de atuação e que todos os alunos são obrigados a cursar), a "formação complementar" (dividida em pré-estabelecida e aberta, com grande autonomia para o aluno) e a "opção livre" (o aluno conhece áreas de conhecimento de seu interesse, mas que não precisam ter qualquer ligação com o curso de origem).

A "formação complementar pré-estabelecida" é aquela cujas alternativas são traçadas pelos colegiados de curso. São opções para a aquisição de especificidades lastreadas em outras áreas de conhecimento. No caso de José Rosário, por exemplo, ele teria como fazer formação complementar nas áreas de Economia, Biológicas, Industrial, Marketing e Ciências Sociais. O currículo, lembra Cristina Augustin, se abre a outros conhecimentos, mas com eixos condutores, com coerência. Apesar das opções apresentadas na Estatística, José Rosário partiu para a "formação complementar aberta". "Eu tinha trabalhado com Recursos Humanos, vi a importância da Logística na área empresarial e percebi que essa associação contribuiria muito com a Estatística", diz ele, agora no 4o período.

Escolha consciente Para montar o currículo com base na "formação complementar aberta", José Rosário precisou de um professor-tutor, que lhe ajudou a relacionar as disciplinas entre si, dando sentido às disciplinas selecionadas nos cursos de Administração, Ciências Contábeis e Engenharia de Produção. Segundo o estudante, encontrar esse tutor foi difícil. "Eu pesquisei muito, sabia bem o que queria e onde eu poderia encontrar, mas para o aluno montar a alternativa existe uma dependência muito grande do professor", assinala. Essa dependência, afirma Cristina Augustin, é boa e necessária. "É preciso insistir que a flexibilização não pode ser um somatório de coisas sem correlações", argumenta. Além do mais, tudo o que aluno propuser terá que ser aceito pelo colegiado do curso.

Mas a pró-reitora admite que a Universidade não está totalmente preparada para absorver o novo modelo. "Nosso sistema não está inteiramente estruturado e isso dificulta a ação do professor", afirma, destacando que os instrumentos acadêmicos e de gestão para ampliar a flexibilização estão sendo firmados, como a matrícula on-line, a mudança das Normas Gerais da Graduação, o desenvolvimento de novo sistema acadêmico e as novas concepções de formação do aluno a partir de Projetos Pedagógicos dos cursos.

Na flexibilização vertical, o aluno incluirá no currículo também a "opção livre". Nesse ponto, a flexibilização permite que o estudante radicalize em seus interesses individuais. Ele terá que buscar 5% das disciplinas em outros cursos, mas que não têm necessariamente a ver com a sua formação complementar aberta ou pré-estabelecida. "Achamos que os alunos tendem a buscar novas dimensões do conhecimento. Um ser com visão mais ampliada de mundo, será um profissional mais capacitado", assinala a pró-reitora. Com a "opção livre", nada impede, por exemplo, que um aluno da Filosofia queira fazer uma disciplina na Educação Física, ou vice-versa.

A socialização do conhecimento

Amanda extrapolou as salas de aula. Ela foi bolsista em um projeto conduzido pelo Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (Ceale), órgão complementar da Faculdade de Letras. "Sempre fui muito receptiva a outros métodos e espaços educacionais", afirma, completando: "Eu não tinha noção do quanto o projeto iria favorecer e ajudar na minha profissionalização", salienta.

Quando anda pela Universidade, Amanda é reconhecida por muitos funcionários que, juntos com pessoas da comunidade próxima, foram alfabetizados por ela. "Esse é um aspecto muito gratificante. Pela extensão, a Universidade socializa o conhecimento e se aproxima da sociedade", argumenta. A estudante de Pedagogia ainda hoje participa de uma das 1.472 ações de extensão que a UFMG desenvolve, entre projetos, cursos, eventos ou serviços que atendem cerca de 5,6 milhões de pessoas. Ao lado do ensino e da pesquisa, a extensão completa o alicerce de uma instituição como a UFMG. Uma boa parte dos estudantes, ainda que aquém do número desejado, participa da extensão e da pesquisa como bolsista, remunerada com recursos da própria UFMG ou proveniente de instituições ligadas a órgãos federais, estaduais e da iniciativa privada. Os recursos atendem também a programas vinculados à Pró-reitoria de Graduação.



Na Extensão, mais de 400 alunos são bolsistas. Porém, segundo o pró-reitor de Extensão, professor Edison José Corrêa, para cada cinco pedidos de bolsas, apenas um pode ser atendido. A realidade financeira, entretanto, não afasta os alunos das iniciativas. Um levantamento aponta a participação de cerca de 1.500 alunos nas ações de extensão como voluntários. "Vinculamos os programas às políticas públicas e a todo instante nos preocupamos em sistematizar a produção do conhecimento novo, registrando e difundindo nossas práticas. A extensão participa da formação social e cidadã do aluno", relata.

Como bolsista da Extensão, Amanda Elizário participa do projeto Pólo de Integração da UFMG no Vale do Jequitinhonha. Ela capacita professores de sete municípios para a formação de jovens e adultos. "É um trabalho muito especial", avalia, lembrando que foi uma "verdadeira sorte" ter conhecido a extensão na Universidade".

De acordo com o pró-reitor de Pesquisa, José Aurélio Garcia Bergmann, cerca de 900 alunos integram como bolsistas os programas de Iniciação Científica, mas quase o dobro desse número participa como voluntário nas centenas de projetos que se espalham pela maioria absoluta dos cursos da Universidade.

A Iniciação Científica é uma conquista do processo de formação e profissionalização e é uma porta aberta para a descoberta de novos cientistas e acadêmicos. Foi dando as mãos à pesquisa, desde o primeiro momento em que começou a cursar Medicina Veterinária, que Rafahel Carvalho de Souza, 24 anos, surpreendeu-se com a própria vocação. "Eu só pensava em trabalhar no campo. Tinha vivência em fazendas e nunca pensei que me tornaria um pesquisador. Hoje, não vejo como ser feliz de outra forma", diz ele.

Atualmente aluno do Mestrado, Rafahel foi um daqueles alunos que não desperdiçam uma só chance para a realização de um currículo invejável. Quando estava no 1o período, juntou-se como voluntário a um projeto envolvendo suínos desenvolvido por um aluno de mestrado no departamento de Imunologia e Bioquímica do Instituto de Ciências Biológicas (ICB). No semestre seguinte, ainda como voluntário, passou a trabalhar num projeto próprio, também com suínos. No 4o período, quando conquistou uma bolsa no ICB, conheceu um mestrando da Veterinária que o convidou para participar de uma pesquisa na área de bovinos. Ele aceitou e manteve as duas frentes de pesquisa. Depois, montou um segundo projeto próprio, que lhe exigiu morar durante quatro meses numa das fazendas experimentais da Faculdade de Veterinária. Esse projeto — avaliação do uso de probióticos na dieta de vacas leiteiras — deu a Rafahel o tema para o projeto de Mestrado.

Na Semana de Iniciação Científica (quando todos os alunos que participam do programa de Iniciação Científica apresentam trabalhos), Rafahel foi várias vezes premiado e, no final da graduação, colecionou 23 artigos publicados, assinados por ele ou em conjunto com outros pesquisadores. "Eu vivia para o meu curso. Ia à UFMG de segunda a segunda. Valeu muito, aproveitei tudo o que podia", assegura.