Revista da Universidade Federal de Minas Gerais
Ano 4 - nº. 9 - Julho de 2006 - Edição Vestibular
A sociedade participa da produção do conhecimento? E uma pessoa que não tenha passado pelas carteiras do ensino formal, pode contribuir com essa tarefa? Não tenha dúvidas: qualquer um pode. A produção do conhecimento é resultado da complexa teia social.
Da descoberta de medicamentos à análise de um pensamento
filosófico, toda investigação tem alguma relação
com a realidade. Mas como sustentar e organizar a produção
do conhecimento? Ensino, pesquisa e extensão são os pilares
que orientam o “fazer” da Universidade. Enquanto os projetos
de extensão observam, interagem e fazem a ponte entre os saberes,
acadêmico e popular, a pesquisa produz conhecimento científico
e tecnológico, que devem ser devolvidos à sociedade na forma
de mais remédios, equipamentos, descobertas, fontes de energia e
muito, mas muito mais. “A universidade determina e modifica a sua
atuação de acordo com as mudanças da sociedade. É
impossível ficar alienado à dinâmica social”,
explica a Pró-Reitora de Extensão da UFMG, Ângela Dalben.
Na Universidade, tudo é feito de forma dinâmica e complementar
e em sintonia plena com o ensino. A transmissão do conhecimento e
a formação de alunos críticos perpetuam essa relação
e mantêm a roda em giro permanente. “Houve uma época
em que a universidade era considerada a dona absoluta do saber. Hoje temos
consciência de que o conhecimento é produzido junto com a parte
interessada: a sociedade. E o resultado dessa sintonia é um saber
amplo e democrático”, completa a Pró-Reitora.
A pesquisa é um importante nó dessa rede de conhecimentos
e é realizada nas mais diferentes áreas. Na UFMG, essa diversidade
é refletida pelos números. São 620 grupos de pesquisa,
vinculados às 19 Unidades Acadêmicas da Universidade. Orientados
pelos professores, os alunos participam ativamente dos estudos por meio
de bolsas de iniciação científica ou como voluntários.
Atualmente, existem cerca de 1,5 mil estudantes de graduação
envolvidos formalmente em projetos de iniciação científica.
Mas nem sempre os pesquisadores trabalham nos laboratórios cheios
de microscópios e fórmulas. É preciso lembrar que nas
Artes, nas Ciências Humanas e Sociais, a concepção clássica
da pesquisa dá lugar a experiências diferenciadas, tão
intensas e relevantes quanto as realizadas nas áreas de Exatas, Biológicas
e da Saúde.
O relações públicas, Frederico Vieira, 24 anos, conhece
muito bem essa realidade. Durante a graduação, Frederico participou
do Programa Pólo de Integração da UFMG no Vale do Jequitinhonha
(leia quadro), um dos principais programas de extensão da Universiade.
Ele fez estudos sobre a mobilização social e a participação
das comunidades na elaboração de políticas públicas.
“Fizemos uma pesquisa-ação”, avalia.
Para o Pró-Reitor de Pesquisa da UFMG, Carlos Alberto Pereira Tavares,
esse é o grande diferencial na formação dos alunos.
“Na pesquisa eles aprendem a trabalhar fora das atividades tradicionais
de ensino, desenvolvendo a curiosidade natural do pesquisador, que os impulsiona
fazer novas descobertas e a contribuir com o conhecimento”, explica
o professor.
Veneno que cura Quem poderia imaginar
que um animal venenoso como a cobra jararaca fosse o portador de um componente
importante para a redução da hipertensão? E que esse
componente estaria presente justamente no seu veneno letal? Essa é
uma das 564 pesquisas em andamento na UFMG, realizada por professores e
alunos do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e do departamento
de Química do Instituto de Ciências Exatas (ICEx).
O coordenador da pesquisa, o professor Robson Santos, explica que serão
aproximadamente 10 anos de investigação, até transformar
o componente do veneno em medicamento administrado via oral. O trabalho
rotineiro envolve professores, alunos de iniciação científica
e funcionários da Universidade. “Nos testes com ratos, são
os alunos que fazem o controle da pressão arterial dos animais, administram
os peptídeos e realizam procedimentos cirúrgicos”, explica
Robson Santos.
Rodrigo Araújo, 23 anos, trabalha nessa pesquisa há cinco
anos, desde o início da graduação. Formado em Farmácia,
o atual mestrando conta que a vivência de laboratório, além
de contribuir com a sua formação, fez com que ele desenvolvesse
uma postura mais responsável no exercício da profissão
.“A confiabilidade nos resultados depende de um extenso trabalho e
da responsabilidade de quem o faz”, determina o pesquisador.
A seriedade dos grupos de pesquisa somada à tradição
fazem da UFMG a segunda maior instituição do país em
número de patentes registradas. De janeiro a maio desse ano, por
exemplo, foram requeridas 12 patentes. Só em Minas Gerais, a instituição
é responsável por 50% da produção de conhecimento
tecnológico. O Pró-Reitor de Pesquisa Carlos Alberto Pereira
Tavares acredita que o resultado é fruto de anos de trabalho: “A
credibilidade conquistada faz com que, cada vez mais, agências de
fomento à pesquisa invistam na UFMG”.
O Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BH-Tec), empreendimento que
receberá investimentos de R$ 500 milhões para abrigar laboratórios
de pesquisa de empresas nacionais e estrangeiras dedicadas a produzir tecnologias
inovadoras e serviços de apoio, não podia ser um exemplo melhor.
A implementação desse audacioso espaço de pesquisa
nas imediações da Universidade é resultado de uma parceria
entre as iniciativas pública e privada e a UFMG. “Com o BH-Tec,
todos vão sair ganhando, inclusive os alunos. Eles poderão
participar ativamente dessas pesquisas e ainda terão o mercado de
trabalho mais favorável quando se formarem”, explica o Pró-Reitor.
Na outra ponta Levar todo esse conhecimento para a sociedade é uma das tarefas da extensão. Aliás, a presença da Universidade para além dos laboratórios e salas de aula é uma grande avenida de mão dupla: aprende a universidade, aprende a sociedade. Mas antes de desenvolver uma pesquisa, é preciso saber se a sociedade precisa dela. A sensibilidade para identificar essas necessidades só é possível graças à interação instituição-comunidade.
![]() |
Para montar o planejamento participativo na cidade de Carbonita, o relações
públicas Frederico Vieira, viajou várias vezes para o Vale
do Jequitinhonha. “A intenção era elaborar um planejamento
de 20 anos que não fosse só de gabinete. Para isso, o papel
da área de Comunicação Social foi fundamental na conscientização
e motivação dos moradores, que participaram ativamente de
todo o processo”, conta Frederico.
“Além de interativa e participativa, a extensão deve
ser interdisciplinar”, explica a Pró-Reitora Ângela Dalben.
No caso do Vale do Jequitinhonha, por exemplo, não adianta só
fazer um projeto de comunicação. Lá, a extensão
envolve a atuação de quase todos os cursos de graduação
da UFMG. A autonomia das comunidades também é uma das bandeiras
da extensão. Para a professora Ângela Dalben, o projeto tem
que fazer com que determinados grupos caminhem com suas próprias
pernas. “Senão, quando o projeto terminar, a comunidade não
consegue sobreviver”, explica a Pró-Reitora.
Atualmente, os projetos de extensão contam com cerca de 1,3 mil alunos,
voluntários e bolsistas, 970 professores e 180 técnicos-administrativos.
A estimativa é de que seis milhões de pessoas já tenham
usufruído dos benefícios da extensão. “É
difícil calcular esse número, já que os beneficiados
indiretamente também são muitos”, conclui Ângela
Dalben.
Vale de contrastes Quem dera se o Vale do Jequitinhonha
fosse tão fértil economicamente quanto é culturalmente.
Embora tenha um solo rico em minerais, vários atrativos turísticos
e um importante patrimônio histórico e cultural, o
Vale padece. Situada no nordeste de Minas Gerais, a região
é uma das mais pobres do estado. |